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Moïse: sinal destes tempos (por Cristovam Buarque)

O brutal assassinato do jovem congolês Moïse Kabamgabe na Barra da Tijuca é sinal de nossos tempos

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1 de 1 Moise_congoles - Foto: Reprodução

Primeiro, ao lembrar que, apesar de nossa crise, o Brasil ainda atrai milhares de pessoas que vivem em países com mais pobreza e menos esperança no futuro. Todos os dias recebemos imigrantes sobretudo da Venezuela e diversos países da África. O congolês Moïse Kabamgabe veio para o Brasil fugindo de guerras e pobreza em seu país, com situação ainda pior do que a brasileira.

Segundo, este assassinato é sinal do tamanho da pobreza brasileira, ao constatarmos que ele cobrava dívida de salário duzentos reais não pagos por dois dias de trabalho.

Terceiro, sinal da violência e da impunidade que levam pessoas jovens a participar do assassinato de um trabalhador, da mesma forma como se fazia nos tempos da escravidão. Em pleno século XXI, Moïse morreu no pelourinho que caracterizou quatro séculos de nossa história, que ainda não se livrou da escravidão, apesar de mais de cem anos depois da Abolição. A violência é um estudo geral da sociedade brasileira, desde seu inïcio. Moïses é uma das milhões de vïtimas que todos os dias sucumbem por algum tipo de arma, muitas delas invisíveis, por serem abstratas, sou por serem tão naturais que não são percebíveis.

Não é por acaso que um quarto sinal é a indicação do racismo por trás do assassinato. Dificilmente ele aconteceria se fosse um trabalhador branco. Além disto, é sinal de que o mundo inteiro atravessa um tempo de xenofobia: os brasileiros pobres são maltratados no exterior e o Brasil maltrata os pobres que vieram do exterior.

Um sexto sinal é a característica do trabalho servil, que se mantém quase 150 anos depois da Lei Áurea: milhares de trabalhadores não mais escravos servindo às classes médias e altas, não mais donos dos escravos, mas beneficiados por baixíssima remuneração e trabalho precário.

O assassinato de Moïses é também sinal da insensibilidade das classes médias e altas que se chocam com a notícia e sobretudo com as asquerosas imagens do linchamento, mas toleram a desigualdade, a exclusão, a pobreza que assassina devagar a cada minuto. Não se choca com as milhões de crianças jogadas, todos os dias, ao mar da desescola, apenas porque são pobres.

Moïse é sinal destes tempos, no mundo e no Brasil.

Mas, entre tantos sinais de perversão de nossa sociedade, Moïses trás sum sinal de esperança diante da indignação que sua morte provocou na imprensa, na sociedade e na polícia, que rapidamente identificou e prendeu os suspeitos. Esperemos que a morte de Moïse desperte o Brasil para perceber a maldade que nos caracteriza e nos provoque a buscar a paz social de que tanto carecemos.

Cristovam Buarque foi senador, governador e ministro

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