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Florescimento: veja histórias de quem melhorou hábitos na pandemia

Com atitude, resiliência e persistência, há pessoas que estão conseguindo se transformar durante a crise de saúde pública mundial

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Apatia, cansaço, indiferença, desânimo e sensação de estagnação. O misto de sentimentos que parece definir o recorrente estado emocional pandêmico é conhecido como languishing ou lassidão (em tradução livre).

Ele, entretanto, não é uma regra absoluta. Há pessoas que, apesar de toda tragédia que nos cerca, têm mostrado resiliência e disposição para se transformar e conseguem reinventar os próprios hábitos.

Qual seria o estado de espírito oposto à lassidão? O flourishing ou florescimento. “É a sensação de realização, propósito e até felicidade. Seria um bem-estar físico e emocional”, define Renata Nayara Figueiredo, médica psiquiatra e presidente da Associação Psiquiátrica de Brasília.

Da mesma forma que a lassidão é caracterizada por um definhamento lento, o florescer também costuma ser alcançado de maneira gradual. “Florescer implica pequenos passos na rotina, atitudes que aumentam o bem-estar da pessoa”, explica a psicóloga Juliana Gebrim, uma das primeiras a usar os dois termos no Brasil.

Juliana Gebrim reforça que a consistência das mudanças é que traz os resultados. “A rotina é um cinturão importante para que tenhamos acesso a novas emoções, mais positivas”, frisa. Veja histórias de quem está seguindo esse percurso:

Quando as primeiras notícias sobre o vírus da Covid-19 começaram a surgir, a advogada trabalhista Ana Izabela Uchôa sentiu a ansiedade aumentar. Como muitas pessoas à época, ela passou a comer mais e a consumir bebidas alcoólicas com maior frequência. Com o decorrer dos meses, Ana sentiu a necessidade de encontrar outra maneira de lidar com as frustrações causadas pela pandemia. “Eu já escrevia poesias antes, mas passei a publicá-las, primeiro de forma anônima, depois com meu nome”, relata.

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A surpresa veio com o sentimento de identificação gerado em outras pessoas. “Escrevi poemas como forma de desabafo e descobri que não estava sozinha. Isso me fortaleceu, amenizou a solidão que eu sentia”, diz. Ana Izabela acredita que a publicação dos poemas aumentou sua autoestima. “Antes da pandemia, eu tinha receio, achava que não escrevia bem, mas a recepção positiva me trouxe outra percepção.”

Este ano, a advogada passou a fazer aulas particulares de dança, que, segundo ela, também ajudaram a controlar o peso, a ansiedade e deram novo ânimo ao seu cotidiano.

Rotina prazerosa

Melhorar a rotina com a prática de exercícios físicos trouxe alento e bem-estar para a patologista bucal Nilce Melo. Professora da Universidade de Brasília (UnB), a docente sentiu, em um primeiro momento, o impacto negativo da vida mediada por telas. Viu seu dia a dia tomado por aulas remotas, reuniões virtuais e atendimento por telemedicina.

Resolveu, no entanto, reservar tempo na agenda para a prática de pilates em casa, seguindo as orientações, ao vivo, por meio de vídeo. “Tenho sentido uma melhora no sono e na disposição física”, destaca a professora, que desconstruiu o preconceito em relação ao exercício na modalidade virtual.

Além do pilates, Nilce incluiu o estudo da língua francesa e a pintura de aquarelas no seu cotidiano. “Gosto de acordar e saber que tenho compromisso com essas atividades prazerosas”, reflete.

A capacidade de inserir pequenos momentos de satisfação em dias tão iguais é uma das habilidades que podem levar ao florescimento. No caso do engenheiro de redes João Paulo Rezende Possa, a prática da meditação trouxe “momentos de paz e pausa”. “Eu já vinha em uma busca espiritual antes da pandemia. Para controlar a ansiedade, resolvi aumentar a prática meditativa, bem como os exercícios físicos em casa, e parei de consumir bebidas alcóolicas por alguns períodos.”

Segundo Possa, os benefícios da meditação incluem relaxamento e clareza mental. “Não é da noite para o dia, é um processo, mas sinto que desenvolvi uma nova habilidade para lidar com os meus pensamentos, consigo observar o que me incomoda”, relata.

Atitude e constância

De fato, grandes transformações podem ocorrer a partir de alterações na rotina. Foi o que aconteceu com o advogado Gustavo Carneiro, que eliminou 20 quilos nos últimos 11 meses. “Eu sempre tive hábitos sedentários, pesava 96 quilos e era obeso. Essa condição se agravou com o início da pandemia, até pela sensação de medo e claustrofobia causadas pelo confinamento”, lembra.

Em junho de 2020, Gustavo deu os primeiros passos para um cotidiano mais ativo. “Comecei a fazer caminhadas, comprei alguns halteres e iniciei treinos diários, além de melhorar a alimentação”, conta.

Desde então, com orientação profissional, Gustavo conseguiu emagrecer de forma saudável, melhorando a qualidade de vida, a autoestima e até mesmo a produtividade. Ele ressalta que os ganhos neste aspecto da vida o levaram a outros desafios. “Comecei a investir em aulas de mandarim por cursos on-line“, relata.

Veja na galeria algumas dicas citadas pelas especialistas entrevistadas pelo Metrópoles para lidar melhor com o momento atual:

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Para aqueles que se sentem longe do florescimento, a psiquiatra Renata Nayara Figueiredo recomenda paciência. “A mudança precisa ser diária e exige esforços, não é simplesmente deixar acontecer. Ao contrário, a transformação envolve gasto de energia e perseverança.”

Uma dica é pensar os sentimentos em forma de espectro, abandonando uma mentalidade binária de bem versus mal. A médica psiquiatra Raiza Nogueira reforça que é importante entender emoções negativas. “Momentos de raiva, frustração e tristeza são genuínos, só não devemos nos fixar neles”, salienta.

Os especialistas reforçam que a pandemia de Covid-19 é um evento inédito e de grandes repercussões para a sociedade, que busca se adaptar, inclusive psiquicamente, aos desafios impostos, como o isolamento social e a insegurança.

“Em última instância, se a pessoa não estiver conseguindo fazer uma gestão do dia a dia, perceber agravamento de apatia e de pensamentos negativos, é indicado buscar a psicoterapia ou mesmo ajuda médica”, recomenda Juliana Gebrim.

Raiza ressalta que é importante avaliar o equilíbrio entre sentimentos positivos e negativos. “Estamos ainda em um momento obscuro e, diante das incertezas externas, vale a pena olhar para si mesmo, se acolher, praticar o autocuidado, para, quem sabe, florescer”, recomenda.

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