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Após síncope e contradições, Pazuello volta a ser ouvido pela CPI

Ex-ministro contrariou fatos sobre vacinas, oxigênio, cloroquina, TrateCov, testes perdidos e ordens do presidente Jair Bolsonaro

atualizado

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Hugo Barreto/Metrópoles
CPI DA Pandemia. Depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello
1 de 1 CPI DA Pandemia. Depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

Após cerca de sete horas de depoimento, uma síndrome vasogaval e muitas contradições na quarta-feira (19/5), o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello volta, nesta quinta-feira (20/5), a ser ouvido na CPI da Covid.

Durante o depoimento, Pazuello poderia, por força de um habeas corpus concedido pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), ter ficado em silêncio e evitado perguntas que o incriminassem. O general, entretanto, optou por falar – e se contradisse – sobre vacinas, cloroquina, abastecimento de oxigênio em Manaus, TrateCov e testes perdidos, entre outros temas. Em toda a sessão da CPI, o general tentou proteger o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O relator da CPI da Covid, Renan Calheiros (MDB-AL), fez perguntas por mais de três horas. Havia 22 senadores inscritos para inquirir o ex-ministro, quando a comissão decidiu fazer um intervalo. Nesse momento, a Casa legislativa informou que Pazuello tivera um mal-estar e estava sendo atendido pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), que é médico. Diante dessa notícia e, sobretudo, da quantidade de senadores inscritos, o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), optou por continuar a oitiva nesta quinta-feira.

Ao sair da sala da CPI, entretanto, o general desmentiu a informação de que teria passado mal. Pouco depois, o Senado desmentiu o desmentido.

Até o incidente, o ex-ministro se saía bem na sua estratégia de responder a todas as perguntas com rapidez e tentava evitar cair nas provocações de quem o inquiria. A interrupção dará a possibilidade de que os senadores da oposição citem as diversas contradições já apresentadas pelo ex-ministro. Eis algumas delas abaixo:

Ordens de Bolsonaro

Pazuello disse que teve total autonomia para atuar à frente do Ministério da Saúde, ao contrário do que os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich disseram sobre falta de independência e contradizendo o vídeo que gravou ao lado do presidente Jair Bolsonaro, em outubro de 2020, declarando, textualmente, que “é simples assim: um manda e o outro obedece”.

Nessa quarta-feira, ele disse: “É só um jargão militar, é apenas uma posição de internet”.

Pazuello também negou que o presidente Jair Bolsonaro tenha dado ordem para ele não fechar contrato ou acordo com o Butantan para a aquisição de doses da Coronavac, vacina desenvolvida em parceria entre o instituto paulista com o laboratório chinês Sinovac.

Bolsonaro, todavia, publicou nas redes sociais e declarou publicamente que não compraria a vacina e que já teria dado a ordem para cancelar a aquisição, um dia depois de Pazuello se reunir com governadores e anunciar a assinatura de um memorando de compra das 46 milhões de doses de Coronavac. “Não será comprada”, decretou o presidente.

“Em momento algum, o presidente me orientou, me encaminhou ou me deu ordem para fazer nada diferente do que eu já estava fazendo”, alegou Pazuello.

Vacinas

Ao ser indagado pelo relator da CPI sobre o motivo de não ter respondido à carta da Pfizer, Pazuello disse que respondeu “inúmeras vezes” à farmacêutica e que a demora na assinatura do contrato ocorreu por causa das negociações. O ex-secretário de Comunicação Social Fabio Wajngarten afirmou, dias antes, na CPI, que o texto da empresa ficara sem resposta por mais de dois meses.

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Questionado sobre o porquê de não ter assumido o protagonismo e acelerado as negociações – convocando, por exemplo, uma reunião com a empresa –, o ex-ministro disse que não poderia encontrar os representantes da farmacêutica, por causa do cargo que ocupava. “Pela simples razão de que eu sou o dirigente máximo, eu sou o decisor, eu não posso negociar com a empresa. Quem negocia com a empresa é o nível administrativo, não o ministro. O ministro jamais deve receber uma empresa, o senhor deveria saber disso”, afirmou.

A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), entretanto, destacou que a agenda do ex-ministro mostrava que ele teve reuniões com a diretoria da Pfizer e da Janssen, contradizendo a afirmação de que ele, como ministro, não poderia receber uma empresa.

TrateCov

O ex-ministro confirmou que a secretária de Gestão do Trabalho e Educação do ministério, Mayra Pinheiro, conhecida como “Capitão Cloroquina” por defender o chamado tratamento precoce, foi a responsável pelo programa TrateCov, que indicava remédios sem comprovação de eficácia. Pazuello, entretanto, insistiu que o aplicativo nunca chegou a ir ao ar.

“A secretária Mayra Pinheiro me trouxe como sugestão, que poderia usar uma plataforma já desenvolvida para isso, para facilitar o diagnóstico clínico feito pelo médico”, revelou o general. “Essa plataforma foi mostrada no dia 11, em Manaus, em desenvolvimento, não concluída ainda, era um protótipo.”

Contudo, o próprio Pazuello, enquanto ministro da Saúde, participou do lançamento do aplicativo e a pasta divulgou o TrateCov na TV Brasil e nas redes sociais.

Testes perdidos

O ex-ministro afirmou categoricamente que nenhum teste para identificar o novo coronavírus foi perdido. “Não temos nenhum teste perdido. Não foi perdido nenhum teste. Zero”, disse.

O Ministério da Saúde deixou vencer, porém, o prazo de validade de aproximadamente 1,7 milhão de testes RT-PCR para Covid-19. A informação foi apurada pelo Metrópoles e confirmada pela pasta.

Todos foram comprados pelo governo federal em abril de 2020, via Fundo Estratégico da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). No total, o lote continha cerca de 10 milhões de testes, que foram produzidos pelo laboratório Seegene, da Coreia do Sul.

Cada teste custou aos cofres públicos R$ 42, segundo informação enviada pelo Ministério Público Federal à CPI da Covid-19. Isso significa que, além de os brasileiros não terem tido acessos aos exames, o desperdício pode chegar a R$ 71,4 milhões.

Colapso em Manaus

Pazuello se contradisse em relação à crise de oxigênio hospitalar em Manaus, no início deste ano. Ele disse ter tomado ciência que os estoques do insumo estavam se esgotando na noite do dia 10 de janeiro, quando visitava Manaus.

“Só para corrigir: nós já temos o acesso a um inquérito do Ministério Público que trata de Manaus, e a informação que lá existe é que o Ministério da Saúde foi informado da iminência de falta de oxigênio no dia 8 de janeiro, por um representante da empresa [White Martins] chamado Petrônio. Esse ofício, inclusive, está lá”, pontuou o senador Humberto Costa (PT-PE).

Ao tentar se explicar sobre a falta de oxigênio hospitalar na capital do Amazonas, o ex-ministro afirmou que o estoque ficou negativo durante “apenas” três dias em janeiro, o que gerou revolta nos senadores amazonenses da comissão.

Incomodado, Braga disse que os dados revelados pelo ex-ministro estavam incorretos. “É preciso dizer ao povo brasileiro, sob pena de nós estarmos aqui sendo coniventes com uma informação errada, mentirosa: não faltou oxigênio no Amazonas apenas três dias, pelo amor de Deus. Faltou oxigênio na cidade de Manaus mais de 20 dias. É só ver o número de mortos”, afirmou, quase aos berros, o senador amazonense.

Cloroquina

O ex-ministro fez uma defesa da cloroquina e cometeu um erro básico, ao classificar o medicamento como “antiviral”. “O Brasil usa cloroquina há 70 anos. A cloroquina é um antiviral e um anti-inflamatório conhecido pelo Brasil. Ela tem ações antivirais e anti-inflamatórias. Pelo menos é o que me é trazido, eu não sou médico”, disse Pazuello.

O senador Otto Alencar corrigiu o ex-ministro da Saúde. “Se me permite: hidroxicloroquina é antiprotozoário, não é antiviral”.

Mais adiante, Pazuello negou que tenha sugerido o uso do medicamento sem eficácia comprovada contra a Covid-19. “Eu não recomendei o uso da hidroxicloroquina nenhuma vez”, afirmou.

Contudo, uma nota informativa do Ministério da Saúde emitida em 20 de maio de 2020, menos de uma semana após ele ter assumido interinamente, apresentava orientações para a aplicação do “tratamento precoce”. Pazuello sustentou, em sua defesa, que não se tratava de uma recomendação, mas de um alerta aos profissionais de saúde sobre a “dosagem de segurança” do medicamento.

Mudança de data

Diante da transferência do fim do depoimento de Pazuello para esta quinta-feira, a oitiva de Mayra Pinheiro na CPI da Covid foi transferida para a próxima terça-feira (25/5).

A CPI da Covid-19 tem o objetivo de investigar as ações e omissões do governo federal no enfrentamento à pandemia e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio, além de apurar possíveis irregularidades em repasses federais a estados e municípios.

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