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O Conto do Vigário (por Ricardo Guedes)

Bolsonaro se divide em dois: um golpista e outro que compõe com os políticos

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Cercado por ministros e aliados, Jair Bolsonaro caminha de perfil para fazer o pronunciamento aos brasileiros após derrota nas eleições, no Palácio do Planalto - Metrópoles - Metrópoles
1 de 1 Cercado por ministros e aliados, Jair Bolsonaro caminha de perfil para fazer o pronunciamento aos brasileiros após derrota nas eleições, no Palácio do Planalto - Metrópoles - Metrópoles - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Conta a estória que na maestral Ouro Preto do século XVIII, o vigário da Nossa Senhora do Pilar e o vigário da Nossa Senhora da Conceição disputavam uma imagem da Virgem Santa para as suas igrejas. O vigário do Pilar propôs então que amarrassem a Santa no lombo de um burro, e para onde o burro fosse a paróquia ficaria com a imagem. E em assim acordado, o burro dirigiu-se, de pronto, para a basílica do Pilar. É que o burro era do vigário do Pilar, o que ficou conhecido como o Conto do Vigário! Outra estória é a do Santo do Pau-oco, levado por tropas de mulas para a venda no Rio de Janeiro como expressão do barroco mineiro, mas ocos por dentro e recheados de ouro. Ou seja, santo por fora, não tão santo por dentro.

Bolsonaro se divide em dois. O que nos tirou o fôlego colocando nossos corações para fora da boca com sustos diários da iminência da quebra institucional, e o que compõe politicamente na busca de seus interesses imediatos ou pela maior segurança do que acha que possa vir a lhe acontecer. Os caminhoneiros param as estradas; a população urge à frente dos quartéis; cidadãos se mataram na anteposição ideológica. “Se pegar, quem sabe, leva; se não pegar, simplesmente se compõe”. Não era bomba, era traque, e como traque se dissipou. Como atribuído a De Gaulle após sua visita ao Brasil, como figura retórica, “ce n’est pas un pays sérieux”.

Diz Wright Mills que manda o poder econômico, garante o poder militar, executa o poder político. Diz Phillipe Schmitter, brasilianista, que o Brasil é um dos casos mais bem sucedidos de controle da população por uma elite, que não muda ao longo do tempo, onde mudam apenas as siglas. E diz Maquiavel que manter o principado é mais difícil do que ganhar o principado; não que ganhar seja fácil. Daí, a predominância do econômico sobre as sociedades, e as possíveis composições ao nível político. Ainda bem que existe a política! Os partidos que se uniam em torno de Bolsonaro, unem-se hoje, em um piscar de olhos, em torno de Lula. O acordo tácito entre as partes foi selado por cardeal católico, não por pastor, nem ortodoxo. Ou ainda, como se diz na gíria, “se colar, colou, se não colar, deixa prá lá”. Ninguém morre pelos seus liderados.

No total do eleitorado, Bolsonaro teve 33% dos eleitores no 1º turno, 37% no 2º turno, o representante dos 1/3. 20% formam seu núcleo duro eleitoral. 1% é radical, autodenominados de “patriotas”. É uma minoria pequena, mas barulhenta. As fake-news são ainda mais intensas. As Forças Armadas, a Polícia Federal, e as Polícias Militares, órgãos de Estado, seguem na normalidade democrática. Datas de possíveis conturbações: 15 de novembro no Dia da República; 19 de dezembro na Diplomação dos Eleitos pelo TSE; 1º de janeiro na Posse do Presidente Eleito. Mas sem riscos à estabilidade do país. O fascismo era pífio, e se esvaiu. Bolsonaro será líder de somente uma minoria dos que nele votaram.

Ricardo Guedes é Ph.D. pela Universidade de Chicago e CEO da Sensus

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