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Pandemia agrava doenças psicossomáticas. Saiba quais são as mais comuns

As doenças psicossomáticas são originadas na mente em períodos de angústia extrema e podem evoluir para problemas sérios de saúde

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dor de cabeça
1 de 1 dor de cabeça - Foto: StockSnap/Pixabay

Doenças que mesmo após extensas investigações médicas não apresentam razões aparentes não são incomuns, mas a ansiedade causada pela pandemia de Covid-19 aumentou a incidência das chamadas doenças psicossomáticas. A percepção é feita por especialistas, que alertam para a importância de cuidar não só do corpo mas também das emoções.

Estar sob constante pressão, seja por medo de adoecer, de perder o emprego ou qualquer outra mudança indesejada, faz com que o corpo responda negativamente. Cerca de 89% dos 400 psiquiatras que participaram de uma pesquisa feita em maio pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) destacaram o agravamento de quadros de saúde mental em seus pacientes devido à pandemia do novo coronavírus.

Os atendimentos dessa especialidade aumentaram em 47,9% desde que a pandemia começou, segundo o levantamento. Cerca de 67,8% dos psiquiatras afirmaram que receberam pacientes novos, sem histórico de sintomas anteriores, e 69,3% relataram ter atendido pessoas que já haviam recebido alta médica, mas que tiveram recidiva de sintomas. Ao mesmo tempo, 44,6% dos profissionais de saúde perceberam queda no número de consultas, causada, principalmente, pela interrupção do tratamento de pacientes.

Formada pela junção das palavras gregas psique (que significa alma) e soma (corpo), as doenças psicossomáticas indicam enfermidades relacionadas às emoções, de acordo com a Sociedade Brasileira de Inteligência Emocional (SBIE). Os sentimentos funcionam como uma espécie de interface que liga o cérebro e o corpo físico. Por isso, sempre que há uma emoção, o corpo responde de alguma forma.

O desequilíbrio entre emoções, sentimentos e pensamentos é o estopim para o surgimento das doenças psicossomáticas. A lista de problemas no corpo causados por traumas não superados ou estresse é extensa: herpes, alergias, gastrite e até doenças mais graves, como cardiopatias, podem estar relacionadas aos pensamentos.

Elaine Di Sarno, psicóloga especializada em avaliação psicológica e neuropsicológica e em terapia cognitivo-comportamental, ambas pelo Ipq-HCFMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), explica que, na verdade, as doenças psicossomáticas são um transtorno, chamado somatoforme. “São desordens emocionais ou psiquiátricas que afetam o funcionamento dos órgãos do corpo”, define.

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O estresse é o grande vilão da história, segundo a psicóloga. De acordo com a SBIE, os ingredientes críticos de uma emoção seriam o componente subjetivo (como alguém experimenta a emoção), o componente fisiológico (como o corpo reage) e o componente expressivo (como a pessoa se comporta em resposta à emoção). Por isso, aprender a lidar com momentos de tensão é a chave para manter bem longe problemas de saúde dessa natureza.

Minimizar os incômodos psicossomáticos pode custar caro. Isso porque o transtorno somatoforme pode evoluir para doenças graves, como depressão, transtornos de ansiedade, síndrome do pânico e muitas outras enfermidades, segundo Elaine Di Sarno. “O cérebro é nosso melhor amigo e pior inimigo, o mais difícil de controlar”, analisa a especialista.

Como tratar doenças psicossomáticas

A terapia, algumas vezes associada à medicação, é a melhor forma de evitar ou diminuir as reações psicossomáticas. “Algumas pessoas têm estruturas de personalidade mais fortes, outras são mais vulneráveis ao estresse”, explica a psicóloga Elaine Di Sarno. “Cada um reage de uma forma, mas a terapia ensina a controlar as emoções e a pensar de forma mais funcional.”

Quando os incômodos se tornam frequentes, a ponto de influenciar na saúde física e mental, é hora de procurar atendimento médico. “Se uma pessoa está se coçando o dia inteiro, provocando feridas no corpo, ou se sente dores no estômago frequentes sem um problema físico que justifique, é essencial procurar ajuda”, reforça Elaine.

De acordo com Flávia Teixeira, psicóloga, mestre em saúde coletiva pela UFRJ, professora de pós-graduação em psicologia hospitalar na UFRJ e pós-graduada em psicossomática contemporânea, o estresse intenso e constante da pandemia pode até fazer com que alguém sinta os sintomas do coronavírus mesmo sem ter a infecção. “Na realidade, não existe uma dicotomia que separe os seres humanos em mental/psicológico/físico”, resume Flávia. “Nosso funcionamento é resultado da interação com o meio e tudo aquilo que nos afeta.”

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) lançou, em abril, o Manual Saúde Mental e Atenção Psicossocial na Pandemia Covid-19. O documento ressalta estratégias de cuidado psíquico para o período, como reconhecer e acolher receios e medos, investir em ações que diminuam o estresse (como ler ou meditar) e garantir pausas sistemáticas durante o trabalho.

A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) também lançou, em maio, a cartilha Saúde mental e Covid-19, com o objetivo de orientar a população sobre os riscos que o distanciamento social e a pandemia podem trazer à saúde mental, além de auxiliar na elaboração de estratégias para lidar com os desafios trazidos pelo momento atual.

Confira cinco doenças psicossomáticas comuns na pandemia:

Resfriados frequentes
Quando os episódios acontecem com frequência, é sinal de que há algo errado. Se os exames médicos não encontram uma explicação lógica para essa imunidade sempre baixa e você está passando por dificuldades, a somatização pode ser a resposta. “Para agravar o quadro, alguns sintomas se assemelham aos da Covid-19, abalando ainda mais o emocional”, reforça a psicóloga Flávia Teixeira.

Herpes
O vírus é transmitido pelo contato com uma pessoa infectada. Entretanto, ele se manifesta em ocasiões de baixa imunidade. Ter episódios constantes de herpes, em especial, a labial, indica que o indivíduo apresenta alguma desordem no organismo. As feridas podem surgir em momentos de muito estresse.

Enxaquecas
A enxaqueca não é uma dor de cabeça convencional, podendo durar algumas horas ou até dias. Alguns casos são incapacitantes, ou seja, a pessoa não consegue realizar atividades rotineiras. Estudos científicos apontam que o principal gatilho para o episódio de enxaqueca é o estresse. Por isso, ela também é considerada uma doença psicossomática. Os sintomas são dor intensa e localizada em um ponto da cabeça, náuseas e falta de concentração. Quando não tratadas, as enxaquecas frequentes podem se tornar uma doença crônica, acompanhando a pessoa por toda a vida.

Alergia nervosa
A alergia de fundo nervoso, em que o indivíduo apresenta erupções na pele desencadeadas por um forte processo de estresse, manifesta-se em sintomas como coceira, vermelhidão no local e irritabilidade. Uma crise, se não for tratada, pode acarretar em um choque anafilático.

Diarreia
Em algumas pessoas, episódios de diarreia são decorrentes de forte estresse. Quando a diarreia se mostra constante e não há uma explicação física, como a síndrome do intestino irritável, é bem possível que se configure como um caso de doença psicossomática. Os sintomas são dores abdominais e fezes extremamente líquidas.

Fonte: Flávia Teixeira, psicóloga, mestre em saúde coletiva pela UFRJ, professora de pós-graduação em psicologia hospitalar na UFRJ e pós-graduada em psicossomática contemporânea

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