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Bom negócio: por que os sindicatos querem volta do imposto obrigatório

Obsessão do PT e de centrais, volta da contribuição sindical ganha força. Entidades recebiam R$ 3,6 bilhões ao ano e agora podem ganhar mais

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Dario Oliveira/Anadolu Agency/Getty Images
Imagem de manifestação de centrais sindicais, com militantes segurando bandeiras amarelas, vermelhas, verdes e azuis - Metrópoles
1 de 1 Imagem de manifestação de centrais sindicais, com militantes segurando bandeiras amarelas, vermelhas, verdes e azuis - Metrópoles - Foto: Dario Oliveira/Anadolu Agency/Getty Images

Antes mesmo da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 1º de janeiro de 2023, a volta da contribuição sindical obrigatória – o velho imposto sindical – já estava no radar tanto do governo eleito quanto das organizações que representam os trabalhadores.

Em dezembro do ano passado, um mês antes de assumir a Presidência da República pela terceira vez, Lula recebeu lideranças das principais centrais sindicais do país para discutir uma possível revisão de pontos cruciais da reforma trabalhista, aprovada em 2017, durante o governo de Michel Temer (MDB). A reforma aboliu o imposto sindical obrigatório, que vigorava desde a década de 1940. A taxa era descontada da remuneração do trabalhador uma vez por ano e correspondia ao valor de um dia de trabalho, sem incluir horas extras.

Nove meses depois do encontro com Lula, a possível retomada do imposto sindical parece ter ganhado impulso e avançado algumas casas. Na terça-feira (5/9), estava marcada uma reunião entre centrais sindicais e confederações do setor produtivo para fechar a minuta de um projeto a ser apresentado ao Ministério do Trabalho e Emprego que trata, entre outros pontos, de formas de financiamento do movimento sindical.

A minuta do texto, inicialmente obtida pelo jornal O Globo, prevê uma contribuição sindical equivalente a até 1% da remuneração anual dos trabalhadores, descontada diretamente na folha de pagamento. O valor seria definido em assembleias de cada entidade e, segundo estimativas, corresponderia a três dias e meio de trabalho.

O encontro entre os sindicalistas nesta semana acabou cancelado depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter formado maioria, na sexta-feira (1º/9), pela constitucionalidade da chamada “contribuição assistencial” para os sindicatos, que será paga tanto pelos trabalhadores sindicalizados quanto pelos não sindicalizados. Não se trata exatamente do imposto sindical, mas se parece muito com ele.

De acordo com a decisão do STF, a taxa não será obrigatória, mas caberá ao trabalhador exercer o “direito de oposição” e manifestar que não tem interesse em fazer o pagamento. No entanto, a Corte não definiu como o empregado poderá exercer esse direito de não contribuir – se por carta, e-mail ou apenas comparecendo à assembleia de sua categoria. Em outras palavras, se não houver essa manifestação expressa do trabalhador, a contribuição acabará sendo, na prática, compulsória.

Com o voto do ministro Alexandre de Moraes, o placar ficou em 6 a 0 no plenário virtual do Supremo. Os ministros ainda podem votar ou mudar seus votos até o dia 11 de setembro. Os sindicatos decidiram aguardar o desfecho do julgamento para retomar a minuta do texto que deve ser encaminhado ao governo sobre o tema – o embrião de um possível projeto de lei a ser enviado ao Congresso.

Um grande negócio… para os sindicatos

Não é difícil entender por que sindicatos têm se empenhado tanto para ressuscitar algum tipo de contribuição compulsória. Antes de ter sua obrigatoriedade abolida pela reforma trabalhista, o imposto sindical recheava os cofres dessas entidades em cerca de R$ 3,6 bilhões por ano. Estimativas apontam que esse montante pode chegar a R$ 14 bilhões, caso o projeto estudado pelas centrais prospere. Quase quatro vezes mais.

Um levantamento do Departamento Intersindical de Estatística (Dieese) mostra que a reforma trabalhista secou essa importante fonte de recursos dos sindicatos ao acabar com o imposto obrigatório. A arrecadação dessas associações com as contribuições despencou 98% entre 2017 e 2023, para R$ 68 milhões.

Pela proposta gestada pelas centrais, cerca de 70% da arrecadação obtida com um novo imposto sindical iria direto para os cofres das entidades, enquanto o restante seria distribuído entre confederações trabalhistas. As centrais ganhariam, portanto, algo em torno de R$ 9,8 bilhões com a retomada da contribuição.

Essa quantia representa, por exemplo, 13% do faturamento do BTG Pactual (R$ 75,57 bilhões), um dos cinco maiores bancos do país, e quase 30% das vendas da Eletrobras (R$ 33 bilhões), uma das 10 empresas brasileiras mais bem posicionadas no ranking Global 2000, da Forbes, que reúne dados financeiros das 2 mil companhias mais valiosas do mundo em 2023.

Em contrapartida, o trabalhador brasileiro médio, que teve um rendimento real de R$ 2.935 em julho de 2023 (segundo dados do IBGE), teria de pagar uma contribuição sindical de cerca de R$ 352 por ano.

“Há 40 anos, esse imposto já era anacrônico. Hoje, é ainda mais. Estamos entrando em uma fase do capitalismo na qual a produção se dá independentemente do emprego de trabalho, com avanço da inteligência artificial, big data e uma série de novos recursos incorporados na produção. Essa discussão sobre fomentar sindicatos não beneficia o trabalhador. Beneficia militâncias políticas”, afirma o economista Benito Salomão, especialista em finanças públicas e doutor em economia pelo PPGE-UFU.

“Minha grande preocupação é a insegurança jurídica que esse tipo de medida causa. Isso é ruim para o ambiente de negócios no país. Você aprova uma reforma importante, como a trabalhista, e depois vem o Judiciário e começa a desfazer alguns pontos”, prossegue Salomão.

Stephan Eduard Schneebeli, sócio das áreas de Direito Trabalhista e Previdenciário do SGMP Advogados e especialista em Direito Coletivo do Trabalho, a maior dificuldade é garantir que as assembleias convocadas pelos sindicatos transcorram de forma democrática e transparente. “É preciso acompanhar se os órgãos fiscalizadores do Estado vão fiscalizar, efetivamente, como essas assembleias são feitas, como se dão as discussões, para que haja transparência e o fortalecimento da relação sindical”, afirma.

“Quando se fala em instrumento coletivo, você não está falando em vontade individual, mas na vontade do grupo. Se a maioria vota em uma direção na assembleia, a pergunta que fica é o que acontecerá com os outros. Se terão, efetivamente, o direito de oposição nessas situações. Essa é uma discussão que está em aberto”, explica Stephan. “Muitas vezes essas contribuições não são nem sequer colocadas em discussão. Elas aparecem depois no texto final e isso é descontado do trabalhador. É necessário haver uma transparência maior nessa relação.”

Governo nega volta do imposto

Apesar da pressão dos sindicatos e das discussões em torno de mudanças na legislação, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, tem negado publicamente a intenção do governo de patrocinar o eventual retorno do imposto sindical.

A pasta afirma que defende uma “política de valorização da negociação coletiva”, mas sem a volta da contribuição obrigatória. “Nesse sentido, o grupo tripartite (Grupo de Trabalho de Interministerial da Negociação Coletiva) vem discutindo uma forma de financiamento vinculada ao processo negocial, fortalecendo sindicatos representativos com ampla cobertura sindical e com segurança jurídica na contratação coletiva”, afirma o ministério.

O que dizem as centrais

Em nota divulgada no dia 21 de agosto, cinco das principais centrais sindicais do país negaram que estejam pleiteando “uma contribuição maior que o imposto sindical”. Segundo as entidades, “isso não está em questão”.

“O item que está em tramitação em reuniões tripartites, com trabalhadores, empresários e governo, é a contribuição negocial. Ela não tem nenhuma relação nem permite um comparativo com o extinto imposto sindical, já que é definida em assembleia de forma amplamente divulgada e democrática”, diz a nota assinada pelos presidentes da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), da Força Sindical, da União Geral dos Trabalhadores (UGT), da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e da Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST).

No mesmo 21 de agosto, em artigo publicado no site da Central Única dos Trabalhadores (CUT), maior central sindical do país, com mais de 3,8 mil sindicatos filiados e 7,8 milhões de trabalhadores associados, o presidente da entidade, Sérgio Nobre, defendeu uma “outra fonte de financiamento em substituição ao imposto sindical”, que seja “decorrente e vinculada às negociações coletivas e deliberada em assembleia pelos trabalhadores sócios e não sócios do sindicato”.

“Toda vez que o trabalhador que não contribui com o funcionamento do sistema sindical for beneficiado por um acordo coletivo, é mais do que justo que ele contribua com o sindicato que negociou, porque os acordos valem para sócios e não sócios e, dessa forma, contribua para aprimorar e fortalecer o sistema sindical.”

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