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Lula voltou? (por Mary Zaidan)

Foram cinco meses e várias derrotas sem que o presidente assumisse a coordenação de seu governo

atualizado

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Hugo Barreto/ Metrópoles
Lula ministros Dino
1 de 1 Lula ministros Dino - Foto: Hugo Barreto/ Metrópoles

Um descontraído churrasco no Palácio do Alvorada encerrou a semana em que a Câmara dos Deputados mostrou ao governo o quão afiadas podem ser suas garras. Ali, entre cortes de picanha – fetiche do presidente -, aliados comemoraram: o Lula voltou!, aplaudindo a decisão de ele assumir as rédeas das negociações com o Congresso. Cinco meses depois!

E o que fez Lula nesse período? Brigou com o presidente do Banco Central, defendeu a reestatização e a reindustrialização nos moldes do século passado; viajou para todo canto, arvorando-se em liderar a paz mundial, enquanto os conflitos pipocavam no seu quintal.

Nem mesmo a única vitória que obteve – a aprovação das regras fiscais – pode ser atribuída a ele. Na Câmara, os elogios vão integralmente para o ministro da Fazenda Fernando Haddad e para o próprio Parlamento, que estaria interessado pela matéria independentemente de ela ser de autoria do Executivo.

Na quarta-feira, depois de a Comissão que analisou a Medida Provisória de reestruturação do governo desidratar por completo os ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas – com apoio de petistas -, gente do governo ainda tentava emplacar a narrativa de que Lula teria sido surpreendido. Ele também desconheceria não ter como se impor na CPMI do golpe e, muito menos, que estaria em tamanha desvantagem na CPI do MST, palco para o bolsonarismo-raiz. Tampouco estava no seu radar a autorização legislativa para destruir a Mata Atlântica.

Ora, Lula tem fama de ser um animal político, hábil e safo. Daqueles de dar nó em pingo d’água. Difícil crer que estivesse alheio às fragilidades de seu governo. Terá perdido o faro, o jeito, a mão? Pouco provável.

O fato é que Lula não mexeu uma palha para manter a integridade dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas. Prefere o ouro negro que pode dar a ideia de fartura, como ocorreu com o pré-sal, à economia verde. E assim como vários parlamentares, ficou enfurecido com a posição do Ibama de negar autorização para a Petrobras pesquisar poços na foz do Amazonas. Pior, de a ministra Marina Silva não ter antecipado a ele a negativa da licença. Uma traição, teria dito.

A reação deixa claro que o parecer técnico do Ibama seria jogado às favas por Lula caso ele tivesse conhecimento prévio da decisão. A ministra talvez intuísse isso. E mesmo depois de Marina ostentar um”L” magnânimo e de uma reunião às pressas no Planalto, fica a sensação de que se não precisasse do brilho dela na vitrine do Brasil verde, Lula a teria rifado.

Ainda que consiga rearranjar o bate-cabeça de seu governo, o que não será tarefa fácil, já se passaram 5 meses. No máximo, Lula pode aparar algumas arestas, mas dificilmente vai se desvencilhar das armadilhas do presidente da Câmara Arthur Lira, que, após o sucesso da semana, desengavetou sua proposta de semipresidencialismo. Só mais um dos vários instrumentos de constrangimento que ele tem em mãos.

Dúbio, o slogan “O Brasil voltou” usado pelo governo permite que críticos associem o Lula 3 não com os êxitos de gestões anteriores, mas com âncoras do passado que condenam o país ao atraso. Com a questão ambiental andando para trás e um Congresso disposto a passar várias boiadas, o Brasil precisa mais do que a aposta vazia de “O Lula voltou”. Se for só isso, estamos lascados.

Mary Zaidan é jornalista

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