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Raio-x inteligente e máscara que mata vírus: pesquisas da UnB contra Covid-19

Comunidade acadêmica está focada em encontrar soluções que ajudem a sociedade a enfrentar pandemia do novo coronavírus

atualizado

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Moisés Dias/Arte Metrópoles
Ilustração sobre pesquisas científicas
1 de 1 Ilustração sobre pesquisas científicas - Foto: Moisés Dias/Arte Metrópoles

De “balbúrdia” a “gasto de dinheiro público sem retorno“, a produção científica brasileira vinha sofrendo durante o governo do presidente Jair Bolsonaro. As universidades perderam verbas, pesquisadores tiveram bolsas cortadas e estudos foram interrompidos. O cenário era de pouco otimismo nas bancadas de laboratório pelo país.

Porém, com a pandemia do novo coronavírus atingindo em cheio o Brasil, o conhecimento desenvolvido pelos cientistas nacionais voltou a ganhar destaque.

“Estávamos vendo um momento de muito desprestígio da ciência, das universidades. De repente, veio a pandemia, e das universidades estão saindo respostas maravilhosas. O governo parece ter voltado atrás e percebido que temos muito talento para explorar na resolução de problemas”, assinala o professor Floriano Pastore Júnior, do Instituto de Química, da Universidade de Brasília (UnB).

A UnB abriu edital para que os pesquisadores apresentassem projetos relativos ao combate à Covid-19 e, em apenas três dias, 120 estudos foram inscritos. Conheça algumas pesquisas que estão em andamento:

Máscara N95 aperfeiçoada
A máscara N95 é o equipamento de proteção individual mais recomendado contra o coronavírus, o modelo é indicado para uso hospitalar. Porém, o item apresenta problemas. Respondendo a uma provocação feita por colegas de Goiânia, a equipe da professora Suélia Fleury Rosa, do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Biomédica da Faculdade do Gama (FGA), se debruçou em cima das máscaras, que, segundo ela, não são completamente seguras. “Imediatamente montamos um grupo para ir atrás de soluções”, destaca.

O projeto Égide (palavra que significa escudo, proteção) une, hoje, cerca de 80 pesquisadores de várias universidade. Um dos braços do estudo é a criação da Vesta, uma máscara modelo N95 aprimorada com tela capaz de inativar o coronavírus.

O equipamento de proteção será composto por três camadas, sendo que uma delas foi criada a partir de um polímero encontrado na casca de crustáceos, que é tema de estudos na Universidade Federal de Campina Grande. “Estávamos discutindo como construir uma máscara com capacidade de minimizar o contágio e filtrar melhor, e eles apontaram o produto que já usam por lá”, conta a docente.

A meta é confeccionar 10 mil vestas e, posteriormente, efetivar a regulamentação junto à Anvisa e ao Inmetro.

“O respirador Vesta é um bom exemplo de como a pesquisa e o desenvolvimento na universidade são capazes de prover soluções relevantes para a sociedade. Neste caso específico, áreas como bioengenharia e engenharia biomédica estão integradas para aplicar os conhecimentos da pesquisa básica em nanomateriais, modelagem computacional e análise de imagens, entre outras, para auxiliar os profissionais que estejam atuando na linha de frente contra a Covid-19”, enfatiza o professor Marcus Chaffim, do curso de Engenharia Eletrônica da Faculdade do Gama (FGA/UnB), em entrevista ao site da UnB.

O protótipo da máscara agora vai passar por análises de microscopia eletrônica de varredura, ensaios mecânicos e biológicos para testar sua eficiência. Segundo Suélia, a maior dificuldade, até o momento, é equilibrar o desenvolvimento de uma ideia inovadora que seja exequível dentro do contexto brasileiro e com o aporte financeiro suficiente.

“Tudo o que envolve ciência, envolve dinheiro. Deciframos os caminhos, procuramos arduamente uma solução, mas, na hora que encontramos, precisamos de financiamento para tornar isso algo físico”, frisa.

Máscara e luva capazes de matar o coronavírus
Outra inovação saiu da cabeça do professor Floriano Pastore Júnior, do Instituto de Química. “Quando vi o início do coronavírus, e que ele poderia ser eliminado com uma solução de sabão ou álcool, pensei em uma luva atoalhada embebida que, na hora que tocasse alguma superfície, o Sars-CoV-2 ficasse preso”, explica o pesquisador. O intuito é que, além de captar o vírus, o equipamento mate o micro-organismo e impeça que ele seja espalhado em outros materiais.

A luva terá duas camadas: uma interna de tactel, não permeável, e a externa, atoalhada, que será molhada com uma solução de álcool ou álcool em gel, dependendo da finalidade. A ideia foi extrapolada para uma máscara com a mesma função.

O projeto está sendo desenvolvido com três estudantes, Krysten Costa, Patrícia Affiune e Maria Eduarda Fonseca. Na próxima semana, o grupo vai confeccionar 100 máscaras, que serão embebidas em diferentes soluções e afixadas na parte externa de uma caminhonete, que circulará em áreas movimentadas da cidade para captar bactérias e vírus. O passo seguinte será checar, em laboratório, como cada líquido se comporta.

“Não vamos produzir em escala, não temos essa pretensão. O objetivo é publicar os resultados de forma simples e disponibilizar o design para que elas sejam replicadas por quem queira fabricá-las. É uma pesquisa feita com dinheiro público, portanto deve ser compartilhada”, explica Floriano Pastore. “É uma possibilidade de contribuição social boa, simples e de fácil replicação”, acrescenta.

A parte mais complicada da execução do projeto é o isolamento social. O professor ressalta que gosta de estar à frente da iniciativa, discutindo novas ideias. E pontua que está fazendo tudo da sala de casa. As estudantes, mais jovens e fora do grupo de risco, vão produzir as máscaras no laboratório, com orientação remota, e Floriano deve participar presencialmente da instalação dos itens na caminhonete para o teste.

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Desinfecção de máscaras com radiação para reutilização
O projeto de desinfecção de máscaras da UnB foi alardeado até pelo ministro Marcos Pontes, da pasta de Ciência, Tecnologia e Comunicações do governo.

A iniciativa surgiu em abril, depois de uma conversa entre o professor Pedro Henrique de Oliveira Neto, do Instituto de Física da UnB, e o infectologista Julival Ribeiro, do Hospital de Base do DF. Preocupados com a falta de máscaras N95 para proteger profissionais de saúde do coronavírus, decidiram se dedicar aos protocolos de descontaminação de equipamentos de proteção individual, para que os itens possam ser usados com segurança mais de uma vez.

Foi construído um dispositivo com luz ultravioleta germicida e criado um protocolo padrão para descontaminação das máscaras, com a ajuda de várias equipes de outras instituições.

No momento, dois protótipos estão passando por testes biológicos para avaliar se a descontaminação é, de fato, efetiva, eficiente e segura.

Paralelamente, estão sendo construídos seis dispositivos que serão distribuídos aos hospitais parceiros e, quando os testes forem concluídos, os equipamentos poderão ser produzidos em larga escala para atender outros centros médicos.

Leitura de raio-x com inteligência artificial
O projeto dos professores Flávio Vidal, do departamento de Ciência da Computação, e Rafael de Sousa Jr., do departamento de Engenharia Elétrica, nasceu após a dupla analisar a produção científica feita em outros países do mundo e a situação do interior do Brasil.

O cunhado de Flávio é médico intensivista no interior de Minas Gerais e, depois de ouvir dele sobre as dificuldades para o diagnóstico da Covid-19, o professor decidiu agir. Ele procurou o colega Rafael para, juntos, criar uma plataforma on-line, com inteligência artificial, capaz de analisar raio-x e ajudar na identificação de infecções por coronavírus.

A ideia é que o médico mande o exame dos pulmões para a ferramenta, que responderá com a probabilidade de ser uma pneumonia por Covid-19, uma pneumopatia, ou um pulmão sem problemas. Foram incluídos dados de raios-x feitos ao redor do mundo e enviados por uma colega da Universidade de Waterloo, no Canadá, para ensinar o robô a diferenciar as condições.

O objetivo é agilizar o diagnóstico no interior do país, oferecendo tempo para que o paciente seja transportado a um local com mais infraestrutura de atendimento.

Em três dias, a plataforma foi colocada no ar. A intenção era que médicos e radiologistas testassem a ferramenta para consertar problemas. Porém, Flávio descobriu que empresas estavam usando o programa de má-fé, emitindo laudos e cobrando por eles. “Nosso trabalho é humanitário, feito de forma gratuita, não tem dinheiro de ninguém envolvido”, enfatiza Flávio Vidal.

A plataforma foi, então, retirada do ar. Mas o projeto cresceu, ganhou apoio de hospitais e médicos, e a ferramenta agora será mais potente e precisa. “Quando lançamos era pra ser uma ferramenta de auxílio, agora vai diagnosticar mesmo”, pontua.

O projeto está sendo avaliado por um comitê de ética em pesquisa, bem como um estudo clínico para garantir a eficácia da ferramenta. Quando a plataforma estiver disponível novamente, não será mais aberta: o médico que quiser usá-la deverá fazer um cadastro para usufruir do resultado.

“O que nos motiva é tentar salvar vidas. Tudo é feito com zero recurso, apenas com a boa vontade dos alunos. É tudo voluntário. Aceitamos recursos, se alguém quiser apoiar para expandir a plataforma. Mas estamos apenas tentando ajudar, o objetivo não é transformar em uma ferramenta lucrativa. Se uma pessoa me ligar dizendo que salvamos a vida de alguém, as noites sem dormir estão pagas”, conclui o professor Flávio Vidal.

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