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Coronavírus, H5N1, mpox, Marburg: por que tantos vírus estão aparecendo?

Nos últimos anos, patógenos vem aparecendo apesar dos avanços da ciência. Desmatamento, globalização e relação com animais têm impacto

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ilustração de um coronavírus, colorida, azul em fundo branco
1 de 1 ilustração de um coronavírus, colorida, azul em fundo branco - Foto: GettyImages

Depois de décadas de calmaria e vacinas eficazes, o mundo vem acompanhando o aparecimento de novos vírus. Além do coronavírus, a varíola dos macacos (mpox), o vírus H5N1, da gripe aviária, e o Marburg, vírus semelhante ao Ebola, foram alguns dos vírus que mereceram espaço no noticiário e causaram preocupação na população mundial nos últimos meses.

Mas o que mudou nas últimas décadas para que novos patógenos ou variantes de antigos consigam se fortalecer e se espalhar com facilidade? Entenda, em cinco pontos:

1. Circulação internacional de pessoas

“A conexão entre pessoas do mundo inteiro aumentou, então a velocidade de espalhamento dos vírus é muito maior hoje em dia”, explica o professor da Universidade de Brasília (UnB) Bergmann Ribeiro, especialista em vírus.

Atualmente, uma pessoa pode se infectar com um vírus em um país e, em horas, estar do outro lado do mundo, transmitindo o patógeno para uma nova população sem defesas — foi o que aconteceu com o coronavírus, que em semanas já estava presente em quase todo o planeta.

2. Densidade populacional muito alta

Em um artigo publicado na plataforma de divulgação científica The Conversation, a professora de virologia Lindsay Broadbent, da Universidade de Surrey, no Reino Unido, conta que a urbanização observada nos últimos anos criou uma densidade populacional muito grande.

Com cidades cada vez mais lotadas, a população vive muito mais próxima — basta imaginar o metrô na hora do rush, por exemplo –, criando a oportunidade perfeita para que os vírus se espalhem.

“O desenvolvimento rápido de cidades muitas vezes ultrapassa a velocidade de criação de uma infraestrutura adequada, incluindo saneamento básico e atendimento médico, aumentando ainda mais as chances de surtos virais”, escreve a professora.

3. Desmatamento

Ribeiro conta que o surgimento de novos vírus tem relação forte com os animais: mais de dois terços de todas as doenças infecciosas são consideradas zoonoses. “Só para citar algumas, o HIV veio de macacos, o zika e chikungunya são transmitidos por mosquitos, e os vírus respiratórios geralmente vem de aves, como os influenza, por exemplo. O Sars-Cov-2 veio de morcegos. Os animais são reservatórios”, explica Bergmann Ribeiro.

Para dar espaço às cidades cada vez maiores e às demandas por alimentação e matéria-prima, o desmatamento vem aumentando. Além de contribuir com o aquecimento global, a derrubada de florestas limita o habitat dos animais, forçando a convivência de espécies que nunca se encontraram — aí, vírus podem “pular” para novos animais, sofrendo mutações suficientes para, no futuro, infectar humanos.

4. Interação com animais silvestres

O desmatamento também obriga os animais a procurar comida em outros lugares, se aproximando cada vez mais das cidades e das pessoas, facilitando a contaminação por vírus novos.

Outro problema é o tráfico de animais silvestres: muitos têm patógenos ainda não conhecidos pela ciência que podem gerar surtos em humanos. Os vírus também podem ser endêmicos em alguns países e chegar a novas nações por meio do transporte de animais, se espalhando sem resistência entre uma população que não tem anticorpos específicos para lutar contra as infecções.

5. Mudanças climáticas

O aquecimento global e as mudanças climáticas também estão associadas ao surgimento de novos vírus, principalmente por propiciar a sobrevivência de mosquitos. “Por exemplo, alguns arbovírus estão sendo detectados em novas áreas porque o clima permite que os mosquitos cheguem a novos países”, escreve Lindsay.

Ribeiro, que faz parte de um grupo de pesquisadores do Brasil inteiro, conta que faz monitoramento de febre amarela em macacos e mosquitos — quando aparece um animal morto, é feita uma coleta do sangue para verificar se ele tinha febre amarela. A amostra é enviada para Brasília, onde o professor faz o sequenciamento genético do vírus para saber se ele tem origem na Amazônia, ou se vem de outra região.

“Esse vírus é endêmico do Amazonas, mas de tempos em tempos ele vai descendo pelo Centro-Oeste, vai para Minas Gerais, Rio de Janeiro, desce até o Rio Grande do Sul. Recentemente detectamos no Sul do país”, explica.

Como evitar novas pandemias?

“Já sabemos desses fatores há muito tempo. A emergência do Sars-Cov-2 não surpreendeu nenhum virologista ou epidemiologista. Era uma questão de quando, não se, uma pandemia ia acontecer. O inesperado foi a escala da Covid-19 e a dificuldade de efetivamente limitar a transmissão do vírus”, afirma a professora britânica.

Ribeiro, da UnB, lembra que existem potencialmente mais de 800 mil vírus no mundo, e o único jeito de evitar que eles causem pandemias ou surtos é monitorá-los.

“Não quer dizer que todos eles vão causar doenças graves no ser humano. Mas é importante monitorar e estudar o que eles fazem, como conseguem entrar nas células humanas. A partir do momento que se conhece o genoma do vírus, fica mais fácil estabelecer uma plataforma para produção de vacinas”, afirma.

Para Lindsay, o monitoramento dos vírus pode assustar em um primeiro momento, mas é essencial para conter futuras pandemias. “O aumento na vigilância vai resultar em mais surtos sendo reportados. Mas, se um surto acontece em uma região sem vigilância adequada, a infecção provavelmente vai se espalhar com mais facilidade”, escreve.

Ela lembra que a vigilância é só um dos pontos importantes: os governos e agências internacionais precisam ter protocolos pandêmicos bem delineados para guiar as ações em caso de uma nova emergência de saúde pública.

“É pouco provável que a Covid-19 seja a última pandemia que muitas pessoas vivas hoje vão presenciar. Espero que estejamos melhor preparados da próxima vez”, alerta.

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