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É enganoso que Bolsonaro extinguiu multa para demissão sem justa causa

O fim da multa para este tipo de demissão chegou a ser debatido pelo governo, mas a legislação trabalhista nunca foi alterada

atualizado

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Reprodução/Projeto Comprova
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1 de 1 Imagem colorida de postagem enganosa sobre - Foto: Reprodução/Projeto Comprova

Esta checagem foi realizada por jornalistas que integram o Projeto Comprova, criado para combater a desinformação, do qual o Metrópoles faz parte. Leia mais sobre essa parceria aqui.

Conteúdo investigado: homem afirma, em vídeo postado no dia 8 de outubro de 2022, que o presidente Jair Bolsonaro (PL) deu fim ao pagamento de multa para trabalhadores demitidos sem justa causa. Aos risos e em tom sarcástico, o autor questiona se ainda vale a pena ter a carteira de trabalho assinada e insinua que o voto em Bolsonaro pode contribuir para que o Brasil volte ao tempo da ditadura e da escravidão.

Ao contrário do que afirma publicação no Kwai, a regra que determina que empregadores paguem multa de 40% do FGTS para trabalhadores demitidos sem justa causa continua vigente, como redigida em 1997. Um vídeo divulgado na rede social engana ao afirmar que Jair Bolsonaro colocou fim ao direito no dia em que a publicação foi feita, 8 de outubro de 2022.

Para o Comprova, enganoso é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

A possibilidade de extinguir o pagamento do recurso e de diminuir o percentual já chegou a ser estudada pelo governo federal em maio e no final de 2021, como mostram reportagens da Folha e do UOL, respectivamente. No entanto, a gestão Bolsonaro não chegou a dar andamento a nenhuma proposta.

O dever do empregador em pagar multa de 40% do FGTS, em caso de demissão sem justa causa, está prevista no artigo 18 da Lei Federal Nº 8.036, que trata sobre o fundo.

Alcance da publicação

Até o dia 13 de outubro de 2022, o vídeo registrava mais de 223 mil visualizações, com 11,6 mil curtidas e outros 12,7 mil compartilhamentos.

O que diz o autor da publicação

O Comprova entrou em contato com o autor da publicação por meio do recurso de troca de mensagens no Kwai. O perfil, identificado como “Noronha Jornalista Sem Faculdade”, não respondeu até a publicação desta checagem.

Como verificamos

A checagem do conteúdo começou com uma busca no Google com o uso de palavras-chave como “Bolsonaro”, “multa”, “demissão”, “justa causa” e “reforma trabalhista”, que retornou com conteúdos relacionados a debates que já ocorreram em âmbito federal sobre a multa e críticas que Bolsonaro já fez ao benefício. Entre os veículos que já abordaram o tema estão UOLAgência BrasilG1 e TV Record.

Para saber o posicionamento do governo federal sobre o assunto, o Comprova entrou em contato com os ministérios da Economia e do Trabalho e Previdência. O primeiro não respondeu. A reportagem ainda consultou a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) sobre eventual suspensão do benefício.

Por fim, também analisamos o plano de governo de Bolsonaro para eventual segundo mandato, como apresentado à Justiça Eleitoral para a formalização de sua candidatura nas eleições deste ano.

Estudo para o fim da multa

Em dezembro de 2021, um estudo encomendado pelo governo Bolsonaro foi apresentado para o Ministério do Trabalho e Previdência e, entre as propostas, estava o fim do pagamento da multa de 40% do FGTS para os trabalhadores demitidos sem justa causa e a criação de um fundo unificado composto por recursos de seguro-desemprego e FGTS. O documento completo tem 262 páginas e está disponível no site do ministério. A proposta relacionada ao fim da multa de FGTS para trabalhadores consta na página 31.

Essa e outras mudanças foram sugeridas pelo Grupo de Altos Estudos do Trabalho (Gaet), formado por economistas, juristas e acadêmicos em 2019. A iniciativa para que o grupo fosse criado foi do ministro da Economia, Paulo Guedes. A equipe discutia propostas para embasar novas alterações na legislação trabalhista.

O Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) criticou a proposta, em nota técnica publicada em 10 de janeiro de 2022. O Dieese apontou, entre outros problemas, o fato de não ter havido debate sobre o assunto para que o documento refletisse a visão dos trabalhadores.

O plano não chegou a ser implantado e o pagamento da multa continua em vigor. Em nota ao Comprova, o Ministério do Trabalho e Previdência informou que o relatório do Gaet diz que “os documentos não contam, necessariamente, com a concordância, integral ou parcial, deste Ministério do Trabalho e Previdência ou mesmo do governo federal. Ou seja, os relatórios dos Grupos de Estudos Temáticos são de exclusiva e inteira responsabilidade dos autores.”

A pasta também ressaltou que, segundo o documento, “a atuação do governo federal será calçada e construída por meio de diálogo com a sociedade, sua representação no parlamento e nas necessidades econômicas e sociais do país.”

Em maio deste ano, a Folha de S.Paulo mostrou que a gestão de Bolsonaro estudava flexibilizar as regras do FGTS com a justificativa de diminuir o custo dos empresários na contratação de novos funcionários. De acordo com o jornal, o Ministério da Economia preparou minutas de medidas provisórias que, entre outras mudanças, tinham a sugestão de reduzir a multa paga em caso de demissão sem justa causa de 40% para 20%.

Na época, a pasta disse à Folha que a proposta sobre alteração no FGTS tinha sido debatida havia mais de um ano e não recebeu aval para prosseguimento. O Comprova entrou em contato com o Ministério da Economia, mas não houve retorno.

Câmara tem projeto para redução da multa

Além dos estudos apresentados pela equipe do governo, há outras discussões relacionadas ao pagamento do benefício. Na Câmara dos Deputados tramita, desde 30 de junho de 2021, o projeto de lei 2383/21, de autoria do deputado Nereu Crispim (PSD-RS), que visa à redução da multa a ser depositada pelo empregador na conta vinculada do empregado no FGTS em caso de demissão sem justa causa e por culpa recíproca ou força maior.

O texto traz uma alteração na Lei do FGTS para baixar a multa da rescisão contratual de 40% para 25%. E, em caso de culpa recíproca (quando ambas as partes, empregado e empregador, dão causa à demissão) ou força maior (acontecimento inevitável à vontade do empregador), reduz dos atuais 20% para 10%. Atualmente, o projeto está na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP) da Câmara dos Deputados. Após cinco sessões para apresentação de emendas ao projeto, entre 16 de dezembro a 12 de maio de 2022, não foram apresentadas emendas.

O texto aguarda parecer do relator, deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), para prosseguir nas demais comissões parlamentares. Somente depois disso, se passar pela avaliação das comissões pertinentes, o projeto poderá ser avaliado pelo plenário da Câmara e, mesmo se aprovado, precisará passar pelo Senado para ir à sanção do presidente da República.

Plano de governo de Bolsonaro não trata do tema

plano de governo de Jair Bolsonaro não lista mudanças específicas nas regras de pagamento de multas rescisórias. O documento, também, não traz alterações nos artigos da atual legislação trabalhista.

“A nova legislação trabalhista aprovada [ainda no governo do então presidente Michel Temer (MDB), em 2017] será mantida com segurança jurídica, ajudando a combater abusos empresariais e de sindicatos que também não podem ter a capacidade de agir como monopólios”, aponta o documento. Além disso, o plano indica que, numa eventual reeleição, o governo federal continuará “defendendo que os trabalhadores devem ser livres para realizar trocas entre si, livres de coerção”.

A proposta do governo Bolsonaro é que o mercado de trabalho seja livre, seguro e flexível, “para que o emprego no país alcance níveis internacionalmente competitivos, gerando renda e prosperidade aos brasileiros”.

Pagamento é devido para demissão sem justa causa

Questionada sobre eventual suspensão da multa, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho reforçou que o benefício está vigente e explicou que o pagamento é devido ao empregado quando ele é dispensado pelo empregador sem justa causa — categoria de desligamento em que o trabalhador é demitido sem motivo legal e, por essa razão, a empresa deve recompensá-lo com os benefícios previstos em lei.

Nessas condições, acrescentou a entidade em nota, o trabalhador tem direito a receber uma indenização no percentual de 40% sobre o valor de seus depósitos do FGTS, também chamada de multa de 40% do FGTS, conforme previsto no artigo 10, inciso I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988.

Por que investigamos

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre a pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. A publicação aqui verificada traz conteúdo enganoso sobre o governo de Jair Bolsonaro, que disputa a reeleição. É fundamental para a democracia que o eleitor tome a decisão sobre o voto com base em informações verdadeiras sobre os candidatos.

Outras checagens sobre o tema

O tema eleições é predominante nos conteúdos de desinformação. Nesta semana, o Comprova já demonstrou que são montagens as reproduções de páginas do Twitter e do G1 atribuindo a Lula declarações sobre desarmamento e que também é montagem o post que afirma que Bolsonaro vai acabar com o feriado de 12 de outubro.

Neste período também têm sido recorrentes as postagens que tentam tirar a credibilidade do processo eleitoral. Somente no segundo turno, o Comprova mostrou que é falso que totalização de votos a cada 12% indique fraude no 1º turno, que post inventou dados sobre cidades para insinuar fraude a favor de Lula e que é enganoso o vídeo que insinua fraude em votação em Maceió ao reproduzir um infográfico com erro.

Sobre benefícios como o pagamento de multa, o Comprova mostrou ser enganoso que valores do PIS/Pasep vão custear benefícios a caminhoneiros e motoristas.

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