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Pagamento por serviços ambientais, uma alternativa para a Amazônia

O modelo serviria como instrumento importante no desenvolvimento de uma política ambiental estruturada capaz de dar valor à floresta em pé

Autor Angelo de Sousa Santarlacci

atualizado

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DIDA SAMPAIO/AE
FLORESTA AMAZÔNICA
1 de 1 FLORESTA AMAZÔNICA - Foto: DIDA SAMPAIO/AE

Em meio a uma das maiores crises ambientais brasileiras, faz-se oportuno questionar: qual o valor da Amazônia? Quanto vale aquilo que não possui valor de mercado? Talvez a resposta a esses questionamentos possa ser a chave para a criação de uma política ambiental sólida capaz de respeitar os espaços dos produtores rurais, das comunidades tradicionais e dos povos indígenas.

Atribuir preços aos recursos naturais não é algo fácil. No entanto, por mais complexo que possa parecer, isso é extremamente relevante para a composição de políticas ambientais, que, por vezes, restringem-se a instrumentos de comando e controle. A inserção de instrumentos econômicos na composição da política ambiental brasileira é de extrema urgência.

A maioria dos ativos ambientais não tem substitutos. Não há substituto para a água, para o ar puro, para a biodiversidade ou para os rios voadores. A “ausência” de preços para os recursos e serviços ambientais traz um sério problema: o uso excessivo dos recursos. Uma vez que esses “custos” nem sempre são computados nas atividades empresariais, gera-se as externalidades.

Em longo prazo, quando eles estiverem degradados em nível quase irreversível, tende-se a criar um mercado espontâneo por esses recursos naturais, já que um dos maiores setores econômicos brasileiros – o do agronegócio – necessita de tais insumos naturais.

A floresta da Tijuca [no Rio de Janeiro] é um exemplo dessa necessidade. No século 19, as árvores da mata da Tijuca eram cortadas e usadas para a produção de carvão, liberando espaço para as produções de café, a formação de pastos e as plantações de legumes e frutas. Poucos anos após a transformação da paisagem, a capital imperial sofreria com a falta de água, o que impactou diretamente a economia local. Anos depois, D. Pedro I teria ordenado o replantio da floresta, que pode ser caracterizado como um dos maiores esforços de reflorestamento do mundo até então.

Quase 200 anos depois, a história se repete no Brasil, desta vez na Floresta Amazônica. Novamente, o uso alternativo do solo torna-se uma opção mais rentável do que a floresta em pé. Assim, muitos dos recursos naturais de conhecimento comum e, até mesmo, os recursos ambientais valiosíssimos os quais nem sequer sabemos que existem vão sendo substituídos.

De acordo com o Código Florestal (Lei 12.651/2012), cada propriedade rural deve manter uma área de Reserva Legal (RL) entre 80% (bioma Floresta Amazônica) e 20% (demais biomas fora da Amazônia) da propriedade para fins de conservação ambiental. Ou seja, tratando-se de áreas situadas no Bioma Amazônico, a legislação permite o uso alternativo do solo em 20% da área do imóvel.

O respeito à legislação, por si só, já garantiria ao país a manutenção de uma cobertura vegetal significativa da floresta. Mas como ficam as áreas de Floresta Amazônica que são passíveis de supressão vegetal de forma legal?

É aí que entra um importante instrumento da política nacional do meio ambiente, a implantação de instrumentos econômicos como forma de remuneração àqueles que preservam o meio ambiente. A este modelo de remuneração, dá-se o nome de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA).

Trata-se de um instrumento importante e já bastante utilizado no mundo. Tão importante quanto cobrar multas de quem polui é beneficiar quem presta serviços ambientais. Um caso emblemático é o exemplo do PSA implementado em Nova York, onde produtores rurais recebem recursos da companhia de água para conservar suas propriedades, contribuindo para a melhoria na qualidade da água e reduzindo o custo de tratamento. Assim, os proprietários rurais beneficiados pelo programa deixavam de praticar suas atividades agrícolas convencionais para conservar a vegetação local.

Bacia do Pipiripau

Outro bom exemplo ocorre na bacia do Pipiripau, no Distrito Federal, no programa Produtor de Águas criado pela Agência Nacional de Águas. O programa estimula os produtores rurais a adotarem técnicas de manejo e conservação da cobertura vegetal com o intuito de conservar a água. Assim, os inscritos no programa recebem apoio técnico e financeiro para implementação de práticas conservacionistas.

Poderia uma política semelhante ser desenvolvida na Amazônia? Sim. Neste caso, muitos proprietários rurais, comunidades tradicionais, assentamentos rurais e povos indígenas poderiam receber para conservar suas áreas produtivas. Até mesmo o ICMBio, responsável pela gestão das unidades de conservação, que conta com recursos pífios para a cuidar de suas unidades, eventualmente poderia ser beneficiado.

Recentemente, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) por meio do PL 312/2015. Para funcionar, o PSA deve adotar o princípio do custo oportunidade, ou seja, deve remunerar os provedores de recursos naturais com um valor igual ou superior em comparação com uma oportunidade renunciada. Em outras palavras, não basta o produtor rural ganhar uma “bolsa verde” para não desmatar. Sua remuneração deve ser atrativa o suficiente para que este aceite conservar ao invés de desenvolver atividades potencialmente poluidoras.

Importante ressaltar que o pagamento não deve ser realizado para aqueles que cumprem minimamente a legislação, conservando sua Reserva Legal ou APP, mas sim para aqueles que fazem mais do que o estipulado em lei, mantendo vegetação nativa em área agricultável.

Seria o PSA uma salvação para o meio ambiente brasileiro? Não, mas seria um instrumento importante no desenvolvimento de uma política ambiental estruturada capaz de dar valor à floresta em pé e aos recursos naturais renováveis.

* Engenheiro florestal formado pela Universidade de Brasília (UnB) em 2010 e Mestre em Ciências Florestais – Valoração econômica do meio ambiente (pela UnB) em 2013. Pós-graduando em direito ambiental e urbanístico pela Fundação do Ministério Público, atualmente é diretor da Fundação de Tecnologia Florestal e Geoprocessamento e da Alberi Forest Consultoria.

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