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“O Último Cine Drive-in”: sobra cálculo e falta sutileza

No primeiro longa de Iberê Carvalho, a leveza esbarra em bruscas mudanças de tom e em preciosismo ingênuo

atualizado

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Como tem sido típico em certo cinema contemporâneo tido como autoral e frequentador de festivais, “O Último Cine Drive-in” revela, desde seu início, um imenso sentimento de nostalgia em relação ao próprio cinema.

Essa autorreferência, aqui, é seguida de perto pelo enorme potencial de identificação com o público: afinal, o Drive-in real, instalado perto do Autódromo Nelson Piquet, é de fato um refúgio do cinema-evento, que atrai carros e famílias inteiras para suas sessões.

Essa preocupação em fazer do cinema uma espécie de sala de estar, o cômodo da casa em que a família se reúne para rir ou chorar, permeia o cerne dramático do filme. Marlombrando (Breno Nina), como seu nome estrelado revela, nasceu no Drive-in.

Já um jovem, ele sai de Anápolis, onde vive e trabalha, para ver a mãe, Fátima (Rita Assemany), internada no hospital em situação grave. Nesse retorno, porém, desenha-se o clássico confronto entre pai e filho: Almeida, vivido por Othon Bastos, é o pai de Marlom e o homem que mantém o Drive-in funcionando. A relação entre os dois é seca e ríspida.

Mudanças de tom
Apesar do cenário documental, o filme segue em tom farsesco, com trilha sonora aventureira e roteiro à italiana: Almeida, Marlom, Paula, a projecionista (Fernanda Rocha), e José (Chico Sant’anna), decidem unir forças para organizar uma última sessão do Drive-in com a presença de Fátima, já que o funcionamento do espaço está na mira das autoridades locais.

Essa leveza, porém, esbarra em bruscas mudanças de tom – o filme começa como drama e, da metade em diante, muda a chave e se torna deveras cômico – e num preciosismo ingênuo. Arestas estão por toda parte neste longa de estreia de Iberê Carvalho.

Um dos primeiros planos emoldura um casal transando no carro, sem dar a mínima para o filme em exibição. Outra sequência acompanha Almeida usando um par de óculos 3D numa sala de projeção moderna. A imagem que nós, espectadores, vemos, é turva e nauseante.

Corisco vs Corleone
O romantismo pueril e a cinefilia de slogan também estampam as paredes de praticamente todos os cômodos da casa de Almeida: sempre há um pôster ou foto de filme aqui e ali. Em seu escritório, um cartaz de “O Poderoso Chefão” coloca dois mitos do cinema frente a frente: o Corisco de Othon Bastos e o Don Corleone de Marlon Brando.

“O Último Cine Drive-in” certamente tem seu público – basta contar o generoso número de salas que ocupou na estreia, em 20 de agosto. Nem por isso deixa de ser uma produção em que sobra cálculo e falta sutileza.

P. S.
A constante crítica ao cinema de multiplex também tem lá seus acertos. Antes de mais uma contenda entre Almeida e Marlom, vê-se na tela do Drive-in uma cena de “Na Mira da Morte” (1968): um filho tentando matar o pai num estande de tiro. O filme é de Peter Bogdanovich, autor de “A Última Sessão de Cinema” (1971). E o longa citado acima, um dos mais potentes dos primeiros anos da Nova Hollywood, termina justamente num Drive-in.

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