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Enfermeiros do HRC relatam exaustão e pedem providências ao Coren-DF

Denúncia foi protocolada na entidade, que diz já ter realizado três fiscalizações na unidade hospitalar apenas durante pandemia da Covid-19

atualizado

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Rafaela Felicciano/Metrópoles
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1 de 1 HRCvale - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Uma das referências no tratamento de casos mais graves da Covid-19 no Distrito Federal, o Hospital Regional de Ceilândia (HRC) é alvo de uma denúncia protocolada no Conselho Regional de Enfermagem (Coren-DF). O documento é de segunda-feira (18/8) e revela uma rotina de exaustão vivida diariamente por enfermeiros e técnicos em enfermagem que atuam na unidade de saúde. A entidade reguladora da profissão confirmou a veracidade da queixa oficializada.

O relato de sobrecarga de trabalho foi feito por pelo menos seis enfermeiros do hospital e indica que o caso se agravou após a retomada dos atendimentos das clínicas cirúrgica e ortopédica. Até então, toda a unidade estava destinada exclusivamente aos casos de Sars-Cov-2.

“Com o aumento substancial no número de casos das regiões administrativas de Ceilândia, Pôr-do-sol e Sol Nascente, em junho/2020 o HRC se tornou referência para tratamento da Covid-19 e os atendimentos de cirurgia e ortopedia foram suspensos. A equipe de enfermagem se reorganizou e todo o pronto-socorro passou a atender exclusivamente casos de Covid-19″, inicia o documento.

“Acontece que no mês de julho, os atendimentos foram retomados para estas especialidades, forçando uma nova reorganização do serviço, mas agora com um aumento substancial da demanda para os enfermeiros. Agora, além de toda a demanda dos atendimentos para pacientes com caso suspeito ou confirmado de Covid-19, temos que dar conta dos pacientes vítimas de traumas, lesões osteomusculares e de patologias cirúrgicas”, completa.

Além de relatarem uma realidade de superlotação e colapso no sistema público, os servidores concursados detalham o dia a dia na unidade, como em citação de “pacientes em observação nos corredores”, pacientes que aguardam, sem sucesso, por vagas de unidade de terapia intensiva (UTI).

“Este quadro mostra a situação rotineira, mas acontece com frequência de a escala não estar completa e o enfermeiro ter que acumular mais setores. Se falta um enfermeiro na classificação de risco, outro é retirado da assistência para manter a classificação de risco aberta”, revela.

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Escala desfalcada

A denúncia também aponta que a sala vermelha, criada para receber pacientes de traumas (ortopédicos) não tem médico clínico escalado. “O médico escalado nas enfermarias ou no isolamento respiratório dá ‘suporte’ ao setor, transitando entre setor contaminado e não contaminado. Já houve períodos que o enfermeiro da sala vermelha teve que dar suporte ao isolamento respiratório devido ao déficit de enfermeiros neste local”, continua.

Durante o desabafo oficial, os enfermeiros explicam que, apesar da recente ampliação da carga horária dos servidores, há um índice de absenteísmo enorme que deixa a escala sempre desfalcada. “A concessão de TPD também não é suficiente, pois, além de ser limitada a 44 horas, os profissionais estão esgotados e sem disposição para muitas horas de TPD”. Eles pedem a reavaliação da retomada dos atendimentos nas especialidades de clínica cirúrgica e ortopédica, já que há falta de profissionais na unidade.

“Tentamos a cada plantão resolver as pendências e dar o melhor atendimento possível aos usuários, mas é impossível. A demanda é desproporcional aos recursos humanos existentes, tanto para enfermagem, quanto para os médicos, que durante a noite ficam em número reduzido e acumulam todo o PS e as alas de internação. Diante da exposição dos fatos, aponto que estamos em um dimensionamento diferente do preconizado pelo Conselho de Federal de Enfermagem e com isto estamos sobrecarregados e não conseguimos prestar uma assistência com a segurança e qualidade que desejamos. Estamos colocando em risco a nossa saúde, física e mental, e o atendimento que prestamos”, finaliza.

“Crueldade”

Procurado pela reportagem, o vice-presidente do Conselho Regional de Enfermagem (Coren-DF), Tiago Pessoa, disse ter realizado três fiscalizações no Hospital Regional de Ceilândia apenas durante a pandemia. Ele também confirmou a sobrecarga de trabalho dos profissionais de saúde.

“Já notificamos a Secretaria de Saúde, mas eles ignoram. Todos os conselhos regionais do Brasil estão perdendo ações judiciais para o cumprimento das resoluções 543/17 e 02/20, os juízes entendem como infralegais e não há lei que determine o dimensionamento, apenas aquela que obriga a ter o enfermeiro e o técnico”, disse.

Segundo o enfermeiro, há boa vontade da superintendente da região em ouvir a entidade, mas não tem como conseguir mais profissionais para a unidade. Atualmente, cada enfermeiro cuida de 20 pacientes e um técnico para cada 08. Em 12 horas de plantão, o enfermeiro se dedica 15 minutos pela manhã e outros 15 minutos da tarde para cada paciente. Imagine um parente seu em estado grave no hospital e acaba sabendo que ele terá apenas 15 minutos de cuidados durante uma tarde toda. Isto é cruel para a enfermagem e pior o cidadão”, indignou-se.

Procurada pelo Metrópoles, a Secretaria de Saúde disse que o pronto-socorro da ortopedia e cirurgia geral do HRC foi transferido para os hospitais regionais de Santa Maria e Taguatinga, como parte das ações para ampliar a capacidade de atendimento na unidade. Por meio da Superintendência da Região de Saúde Oeste, a pasta afirma que as medidas foram tomadas devido a alta demanda de pacientes com Covid-19.

Leia a nota na íntegra:

“A Superintendência da Região de Saúde Oeste – que engloba Ceilândia e Brazlândia – informa que devido a alta demanda de pacientes com Covid-19 no Hospital Regional da Ceilândia (HRC), em junho o pronto-socorro do HRC passou a atender exclusivamente casos do novo coronavírus. Ainda como parte das ações para ampliar a capacidade de atendimento, o pronto-socorro da ortopedia e cirurgia geral foi transferido para os hospitais regionais de Santa Maria e Taguatinga. Uma ala do HRC foi reservada para atendimento apenas a possíveis emergências nas duas especialidades. O restante das áreas (ginecologia e pediatria) continuaram no HRC”.

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