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Investigada, prefeitura do pai de Lira mantém gasto de R$ 1 mi em sigilo

Com números inflados, Barra de São Miguel, cidade em que pai de Arthur Lira é prefeito, está na mira do MP de Alagoas

atualizado

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Natália Portinari
Ambulância em Barra de São Miguel (AL)
1 de 1 Ambulância em Barra de São Miguel (AL) - Foto: Natália Portinari

Barra de São Miguel (AL) – Com súbito aumento de oito vezes na produção do SUS em quatro anos, a cidade de Barra de São Miguel, administrada pelo ex-senador Benedito de Lira, pai do presidente da Câmara, Arthur Lira, teve gasto extra de R$ 1 milhão com um fornecedor de medicamentos, mas não informa que itens comprou e mantém em sigilo o contrato da suposta compra.

A prefeitura é alvo de uma investigação preliminar do Ministério Público de Alagoas (MPAL) para apurar a regularidade de seus dados de saúde. O MP requisitou auditorias ao sistema de auditorias do SUS e à Controladoria-Geral da União (CGU) antes de decidir sobre a instauração de um inquérito.

A produção do SUS do pequeno balneário, com 7,9 mil habitantes, começou a aumentar durante a pandemia e nunca mais parou, mesmo depois do pico da emergência de saúde. Em 2019, foram 1.045 medicamentos distribuídos na atenção especializada. Em 2022, 46,8 mil, uma explosão de 46 vezes na demanda farmacêutica.

Em meio aos números, um contrato em especial chama a atenção. Em 2021 e 2022, o município pagou R$ 1 milhão a um fornecedor de Pernambuco, Jorge Eduardo Ribeiro Soares, da empresa Via Hospitalar.

O gasto é desproporcional ao consumo de medicamentos do município, mesmo considerando que os registros de consumo de remédio dispararam depois de Benedito de Lira tomar posse.

A cidade faz parte do Conisul, consórcio de prefeituras de Alagoas para compras de medicamentos e insumos de saúde. Segundo funcionários dos postos de saúde da cidade relataram à coluna, os remédios dados aos pacientes no dia a dia vêm dessas compras. Essa informação é reforçada pelo fato de que, em 2023, a cidade depende apenas do Conisul para ter medicamentos e, até agora, gastou apenas R$ 187 mil.

Em 2021, a cidade pagou R$ 900 mil ao todo em gasto farmacêutico e registrou, no SUS, 21,7 mil administrações de remédios. Foram R$ 548 mil pagos à Via Hospital e R$ 257 mil ao consórcio Conisul.

Praia Barra de São Miguel
Praia da Barra de São Miguel (AL)

O valor seria suficiente para que se fossem gastos R$ 41 em média para cada tratamento medicamentoso feito na cidade, o que é muito, se comparado aos preços cobrados pelos fornecedores. Uma cartela com 10 comprimidos para herpes, por exemplo, custa R$ 0,90 no preço oferecido por Jorge Soares, da Via Hospitalar. Um frasco de antibiótico, R$ 4,49. Dos 238 tipos de remédio ofertados pela empresa, apenas 18 custam mais do que R$ 5 a unidade. Os preços praticados pelo Conisul são mais baratos ainda.

A cidade de Barra de São Miguel não é a única que contratou os serviços da Via Hospitalar. A coluna encontrou atas de preço, empenhos ou contratos da empresa com 24 municípios em Alagoas e Pernambuco. Apesar da ausência de dados de várias prefeituras, é possível verificar que a firma recebeu pelo menos R$ 3,1 milhões em verbas municipais desde 2020.

Nenhum representante da Via Hospitalar foi encontrado para comentar. Os contatos registrados na Receita Federal no cadastro da empresa não atendem. O dono, Jorge Eduardo Ribeiro Soares, também não foi localizado.

À coluna a Prefeitura de Barra de São Miguel disse que a Via Hospitalar foi escolhida por pregão eletrônico e que foi necessário fazer um contrato para suprir as necessidades da cidade porque, durante a pandemia, o Conisul não conseguiu garantir o abastecimento. Em outros municípios visitados pela reportagem, há relatos semelhantes de escassez no consórcio.

A coluna questionou, porém, quais itens exatamente foram adquiridos da Via Hospitalar e por quais valores unitários. Também perguntou quantos medicamentos foram comprados para justificar um valor tão alto. Essas informações não foram fornecidas, e o contrato segue mantido em sigilo.

Salto nas consultas de atenção especializada

A julgar pelos números, os moradores da cidade também passaram a necessitar muito mais de consultas na atenção especializada, que foram de 5,9 mil para 26,3 mil, na comparação entre 2019 e 2022. Ao todo, a produção do SUS na cidade, segundo os dados informados pela prefeitura, aumentou em oito vezes.

A cidade registrou 45 mil atendimentos, de urgência, no pronto-socorro, domiciliares e de outras categorias em 2022, o que equivale a mais de cinco idas ao médico por habitante. Em audiências na Câmara Municipal, o aumento nos números foi questionado por vereadores, mas representantes da prefeitura disseram apenas que a metodologia de contagem havia mudado.

Esse aumento, especialmente na atenção especializada, faz com que a cidade possa pedir mais verba em anos subsequentes. A pedido de Lira, o fundo municipal recebeu R$ 3,3 milhões em 2021 e 2022 em emendas de relator. É desse fundo que são comprados medicamentos. Segundo dados do sistema de acompanhamento de emendas, somente Lira enviou emendas à cidade.

Ao contrário do que já ocorreu em cidades do Maranhão a pedido do Ministério Público Federal (MPF), Barra de São Miguel ainda não foi alvo do sistema de auditoria do SUS, que é responsável por fiscalizar os dados dentro do Ministério da Saúde e identificar desvios nos repasses.

“O Município da Barra de São Miguel está empenhado em implementar medidas de ampliação do atendimento público à saúde, buscando parcerias com entidades públicas ou privadas credenciadas para complementar os serviços ofertados, sempre respaldada nas normas e diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde”, disse a prefeitura, em nota enviada à coluna.

“Reiteramos o compromisso em proporcionar um serviço de saúde mais eficiente e abrangente aos munícipes de Barra de São Miguel, buscando superar os desafios e garantir o acesso a uma assistência médica de qualidade para toda a população”, concluiu.

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