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Planalto descarta pesquisas e foca análise de redes sociais

Gestão Bolsonaro rejeitou pregão de contratação de pesquisas de opinião pública herdado de Temer, sob justificativa de arrocho orçamentário

atualizado

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Igo Estrela/Metrópoles
Jair Bolsonaro
1 de 1 Jair Bolsonaro - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

Fontes de informações estratégicas nas gestões dos antecessores, as pesquisas de opinião pública contratadas internamente foram desprezadas até agora no governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL). Sob justificativa de arrocho orçamentário, a Presidência da República revogou um edital de R$ 7,2 milhões herdado do ex-presidente Michel Temer (MDB).

Na decisão do corte das pesquisas, tomada no início do ano, o governo considerou que o gasto era dispensável à gestão, mesmo com resultado positivo do pregão: o valor total dos contratos com as duas empresas vencedoras ficaria cerca de 60% mais baixo do que o previsto. A prioridade, até o momento, foi o monitoramento de redes sociais.  

Nesse contexto, o Departamento de Pesquisa de Opinião Pública, parte da Secretaria Especial de Comunicação (Secom), segue com cargos de chefia vagos e sem perspectiva de preenchimento.

No governo Temer, foram destinados R$ 5,7 milhões ao Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) e R$ 1,8 milhão à empresa Virtu Análise Estratégica. As contratações deram origem a dezenas de pesquisas de opinião pública sobre temas como as reformas da Previdência e trabalhista, a reforma do ensino médio, sistema prisional e manifestações de rua.

A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) também fez uso do recurso para obter informações sobre temas decisivos para o seu governo, entre eles a crise política e a votação do impeachment. 

O próprio presidente da República já criticou publicamente institutos de pesquisa, como o Ibope anteriormente contratado por Dilma e mantido por Temer. Existem esforços, na cúpula do governo, entretanto, para convencê-lo de que as informações propagadas nas redes sociais não atingem todos os brasileiros, apesar de o número de usuários de internet ser crescente no país.

De acordo com a Pnad Contínua TIC 2017, a mais recente pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre esse cenário, 69,8% das pessoas de 10 anos ou mais acessaram a internet nos três meses anteriores à entrevista. O percentual corresponde a 126,3 milhões de cidadãos.

O atual ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, revelou no mês de julho, em café da manhã com jornalistas, que o presidente costuma voltar atrás sobre o fechamento da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) quando se depara com esse argumento.

General na linha de frente com a imprensa, o porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros, demonstrou, em um de seus briefings, o apoio à medição de opinião por meio de pesquisas tradicionais. O militar chefiou a comunicação do Exército por quase quatro anos, antes de assumir a função.

“Compreendemos serem muito importantes as medições, que são feitas ou por meio de mídia social ou as medições em caráter global, ou seja, aquelas em grupo focal, [de maneira] quantitativa ou qualitativa”, afirmou, no dia 14 de agosto.

Márcio de Freitas, chefe da Secretaria de Comunicação de Temer, explicou que os resultados das pesquisas permitem a orientação do debate interno do governo para a formulação de políticas públicas.

“É um instrumento que não serve somente para você buscar a aprovação, mas principalmente para orientar o gestor público no serviço que ele presta à sociedade, para traçar linhas de ação”, afirmou. 

Segundo a Secom, áreas técnicas avaliam a contratação de pesquisas caso haja disponibilidade no orçamento.  

Bala de prata da Economia
Mais uma vez por razões financeiras, o único tema monitorado por meio de serviços contratados pela Secom foi a reforma da Previdência. Especificamente, o governo quis medir o impacto da campanha publicitária da proposta, em tramitação no Congresso Nacional, na internet.

Uma resposta obtida por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) diz que o conteúdo não pode ser divulgado, por enquanto, por se tratar de documento preparatório.

Outros detalhes sobre o trabalho, como as plataformas em que foi executado, também não foram informados por meio da assessoria de imprensa da Presidência.

Uma das perguntas sem resposta é se esse serviço foi ou poderia ser feito nos perfis do presidente Jair Bolsonaro, em que são compartilhadas opiniões e decisões relacionadas a propostas de governo. 

A Secom informou apenas que duas empresas estão habilitadas para a execução do serviço de monitoramento de redes sociais, sob demanda e coordenação do setor. 

Os contratos vigentes na área de comunicação digital, que englobam vários serviços, são com a Agência Click Mídia Interativa S/A e com a TV1 Produções. O valor máximo fixado para cada um é de R$ 26 milhões.

Governo para poucos
Professor e pesquisador do Monitor do Debate Público no Meio Digital da Universidade de São Paulo (USP), Pablo Ortellado avalia que as opiniões nas redes sociais representam uma parcela ativa e radical da população.

O especialista pondera que o Twitter, usado com frequência por Bolsonaro, é a rede social que fornece mais dados para monitoramento, mas apenas 15% dos brasileiros, aproximadamente, estão presentes nesse ambiente digital.

“De todas as plataformas, é  a que está mais comprometida pela ação de robôs, pela manipulação. É um pouco preocupante. Se você está olhando ali, você está vendo o que você quer ver”, afirmou Ortellado.  

Para o professor, ao focar o monitoramento digital, o presidente Jair Bolsonaro deixa de ouvir pessoas fora de sua base eleitoral. “Está governando para os seus”, disse.

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