Agenda cheia, contato frequente por telefone com o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) e palpites sobre o cenário político nas redes sociais. Assim tem sido parte da rotina do general da reserva Augusto Heleno Ribeiro Pereira, um dos nomes à frente dos planos de segurança pública e defesa nacional do candidato do PSL ao Palácio do Planalto. Em conversa por telefone com o Metrópoles, o militar expôs suas ideias sobre redução da maioridade penal, posse e porte de armas e o direito de policiais matarem criminosos sem responderem judicialmente. Heleno também diz temer que o Brasil se torne um “anarcopaís”.
Embora conheça cada linha das diretrizes divulgadas pelo PSL e disponibilizadas no site do partido e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o general evita chamar o documento como plano de governo. O colaborador de Bolsonaro reclama que as ideias expostas pelos presidenciáveis não têm muita profundidade e, nos debates e programas televisivos, é impossível expô-las. “Em 30 segundos? É brincadeira! É o tipo de coisa em que fica todo mundo se enganando. São frases pré-fabricadas e bonitas, mas, na ‘hora do vamos ver’, não vão funcionar”, critica.
Essa história de que ficam cobrando programa de governo é uma farsa. São meros protocolos de intenção. Enquanto não tiver ministro designado, não faz sentido. Os programas vão ser feitos mesmo ali, nos dois meses entre o resultado da eleição e a posse, em janeiro
Augusto Heleno, general da reserva
Heleno e outras pessoas próximas a Bolsonaro, incluindo militares, criaram um grupo em Brasília que se reúne e conversa por aplicativos de celular para tratar de plano de governo e outros assuntos capazes de auxiliar o deputado federal na corrida presidencial. “Temos pensado muito nesses pontos imprescindíveis, como saúde, educação, relações exteriores e segurança pública”, conta.
Bagagem
Nascido em Curitiba, Augusto Heleno construiu uma carreira sólida no Exército Brasileiro. Atuou como comandante militar da Amazônia e foi chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia. Ele também liderou as tropas brasileiras em missões de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti. Trabalhou por quatro anos na Presidência da República, nos governos Collor e Itamar Franco, comandou a Escola Preparatória de Cadetes em Campinas, além de ter sido adido na França e na Bélgica por dois anos. Em 2011, passou para a reserva do Exército Brasileiro.
É impossível um presidente conhecer profundamente todos os assuntos abarcados pela sociedade. Estamos vivendo um período muito difícil, depois de 20 anos de desilusões, incompetência e falta de gestão. Corrigir isso demora. Não será fácil. Hoje, ser presidente da República é missão de sacrifício.
general Augusto Heleno
É com essa bagagem que o general reformado pretende contribuir num eventual governo de Bolsonaro, caso seja designado ministro da Defesa ou qualquer outro cargo no âmbito da segurança.
Cinco perguntas para o general Augusto Heleno

O respeito à candidatura de Bolsonaro dentro do alto escalão das Forças Armadas aumentou com o anúncio de general Mourão como vice? É natural que aconteça isso. Ele [Mourão] chegou onde chegou com 45 anos de serviço. É extremamente respeitado pelos lugares por onde passou, um homem culto e muito preparado. Então, é natural que haja respeito, apoio, e aumente a adesãoBeto Barata/Estadão

Contra criminalidade, governo federal atuou na segurança do RioWilton Júnior/Estadão

Você é favorável à redução da maioridade penal? Do jeito que está, favorece demais o uso dos jovens na criminalidade. O fato de eles serem inimputáveis e protegidos por medidas constitucionais faz com que ganhem relevância para as facções. Óbvio, se não há meio de vida legal, acabam atraídos para o crime. Jovens são facilmente atraídos, por serem inconformados e quererem mudar o mundo. Sou favorável a mudar e ver no que vai dar. Do jeito que está, não dá para ficar. Se você pegar as fotos desses jovens armados com fuzis nessas comunidades, chega à conclusão de que precisa existir uma maneira de desencorajar issoIstock

Qual é a ideia do plano de governo sobre reforçar a retaguarda jurídica para policiais matarem criminosos e não responderem na Justiça? Precisamos mudar as regras de engajamento, dar segurança jurídica para as forças policiais poderem atuar. O pessoal fala "é para matar todo mundo?" Não é para isso, é para ter poder de dissuasão. O [bandido] que estiver armado com fuzil na mão, ostensivamente, se oferecer riscos colaterais, precisa saber que está sujeito a ser eliminado. Os dois lados [policiais e criminosos] estão com um fuzil, e só um lado tem que ter direito de estar armadoJOSE LUCENA/FUTURA PRESS/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

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Heleno defende uma ampliação na fiscalização em comunidades e bairros menos favorecidos, além de estradas e fronteiras, as quais classifica como “muito mal monitoradas”. Afirma também que é preciso aumentar o controle de facções criminosas em presídios federais. Tudo isso, segundo o general, ampliando o debate também para o combate ao tráfico de drogas: “Custa dinheiro e competência”. Para Heleno, o país tem “gente competente, mas mal-empregada.” “Estamos no século 19, enfrentando criminalidade do século 21”, afirma.
Assim como Bolsonaro, o general defende uma liberdade maior de atuação das Forças Armadas e corporações policiais, inclusive com autorização para os agentes atirarem e não serem julgados. Na visão do militar da reserva, a retaguarda jurídica desfavorece esses profissionais. “Ela é muito frágil. Dentro do Ministério Público e do Judiciário, tem pessoas que defendem a teoria que o camarada é bandido porque é fruto da sociedade, que ele não tem culpa nenhuma e tem todo direito de ser bandido. Estamos chegando a esse ponto, caminhando para ter um ‘anarcopaís'”, critica.

Um dos gurus de Bolsonaro na questão da segurança pública, Heleno considera que manter a atual legislação é insistir no erro e não há motivos para uma pessoa deixar o crime. “Por que vai abandonar a bandidagem? Onde ele tem prestígio, anda com as garotinhas bonitas da comunidade, vai para o baile funk. Ele já se acostumou, é a vida que ele quer, que está ao alcance deles. É preciso medidas que os desencorajem de continuar nessa batida”, defende.
Não podemos continuar com essas regras de engajamento. O bandido tem todas as vantagens. Ele conhece o terreno, sabe que o policial não tem autonomia para agir como gostaria porque vai sentar no banco dos réus [se matar]. Vai morrer gente? Vai. Mas é melhor bandido ou inocente? É uma escolha da sociedade. Quer continuar assim? Vamos virar um anarcopaís e seu filho não vai poder ir à escola porque não sabe se vai voltar
General Augusto Heleno
Para exemplificar os problemas nessa área do Brasil, ele cita o Rio de Janeiro, cidade que considera um “caso típico de propagação do mau exemplo”. Heleno acredita que as prisões e denúncias contra membros do alto escalão do governo são ponto crucial para desmotivar as forças policiais. “Não existe comando que dê certo se o chefe não der exemplo. Chefe vagabundo, bêbado e ladrão contamina toda a cadeia de comando. Há descrédito para esse camarada [policial], porque essa organização depende de hierarquia e disciplina”, aponta.