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Monkeypox: entidades LGBTI+ cobram ações para combater discriminação

Organizações temem estigmatização e pedem políticas públicas para prevenir doença e evitar casos de homofobia

atualizado

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Vinícius Schmidt/Metrópoles
imagem de tubos de ensaio sinalizando resultado positivo para varíola dos macacos
1 de 1 imagem de tubos de ensaio sinalizando resultado positivo para varíola dos macacos - Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles

Entidades de defesa de direitos da população LGBTI+ temem que o surto de varíola dos macacos resulte em uma onda de preconceito contra homens gays e bissexuais. Dados da Organização Mundial de Saúde apontam que, até o fim de julho, 98% dos casos notificados são de homens que fazem sexo com homens.

Diante do cenário, o órgão recomendou a redução de parceiros sexuais e a reconsideração de relações com novos parceiros para reduzir a transmissão.

No Brasil, o que se sabe até o momento é que 95% dos casos registrados são de homens com idade média de 33 anos, mas não há informações detalhadas acerca do perfil demográfico. No entanto, o país já começa a observar mudanças em torno dessa população.

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Em alguns locais, festas voltadas para o público LGBTI+ anunciaram restrições. Na última semana, o ator Matheus Góis relatou ter sido vítima de homofobia após buscar atendimento em uma unidade de saúde por suspeita de Monkeypox.

A presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), Symmy Larrat vê o contexto atual com preocupação de que haja um movimento de culpabilização sobre as práticas sexuais da população LGBTI+. Além disso, ela considera que o combate ao preconceito, como um todo, é o primeiro passo para prevenir as doenças.

“Como foi no caso da AIDS, [a doença] foi imputada à população como se ela fosse a culpada por aquilo existir. Então, a doença existe independentemente das pessoas. Agora, pessoas que têm essas práticas sexuais, afetivas, negadas pela sociedade, obviamente vão exercer isso de uma forma menos cuidadosa. Isso é reflexo de um preconceito que existe na sociedade”, explica.

“Se a gente pudesse demonstrar o nosso afeto como qualquer outra pessoa, a gente ia promover práticas mais saudáveis de relação entre nós”, assegura.

A ativista conta que, nesse primeiro momento, a organização está em contato com institutos de pesquisa e estudiosos da área de saúde para acompanhar a evolução da doença no país e, a partir disso, pensar em ações de prevenção. “O que a gente defende é que esse debate não pode vir com um processo estigmatizante de uma população.”

Políticas públicas

Em relação às articulações com autoridades de saúde, Symmy Larrat aponta que é necessária a criação de políticas públicas, mas que não espera ações do Ministério da Saúde, pois a pasta tem se fechado para assuntos relacionados à saúde da população LGBTI+ nos últimos anos.

Keila Simpson, da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), reforça o pedido. “O próprio Ministério da Saúde, no Brasil, poderia se responsabilizar por passar informações muito mais substanciais acerca dessa doença, do que ela é, quem está de fato está dentro dessa cadeia de vulnerabilidade”, reclama.

“A gente tem ficado muito apreensivo, achando que é muito prematuro todas essas informações. E é mais prejudicial ainda colocar essas pessoas dentro dessa categorização de grupo de risco. Parece que está voltando na década de 1980”, analisa.

O Ministério da Saúde instituiu, no fim de julho, o Centro de Operação de Emergências (COE) para elaborar um Plano de Contingência contra o surto de monkeypox no Brasil. O objetivo do grupo é promover uma resposta coordenada, subsidiando, a partir do levantamento de dados, a tomada de decisões, a definição de estratégias e as ações de enfrentamento. O país já registrou mais de 1.700 casos da doença.

Transmissão

Clarissa Damaso, virologista da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e assessora do Comitê da OMS para pesquisa do vírus da varíola, concorda que o estigma é uma preocupação da comunidade da científica. Por outro lado, ela ressalta que é necessária a exposição dos dados justamente como forma de combater a doença.

“Se a gente não falar, não discutir e não chamar a comunidade LGBTI+ para discutir esse assunto, em termos de demonstrar como se previne, demonstrar os cuidados… Se a gente não fizer isso também é uma forma de discriminar”, aponta Damaso.

Sobre a concentração do surto entre homens que fazem sexo com outros homens, a pesquisadora esclarece que ainda faltam dados concretos acerca da causa dessa prevalência. Uma possibilidade é o fato de a transmissão ocorrer por meio de lesões na região genital durante a relação sexual.

“É claro que, para outra pessoa ter contato com essas lesões, dada a essa localização, só com o contato sexual. Então, você perpetua um modo de transmissão”, conta.

Entretanto, é importante ressaltar que a transmissão não ocorre exclusivamente por meio de contato íntimo. Pessoas que convivem e tiveram contato com um indivíduo infectado também podem apresentar o diagnóstico. Damaso salienta ainda que a doença não é considerada uma infecção sexualmente transmissível porque até o momento não foi encontrado vírus replicante no sêmen ou no fluído vaginal.

“Até o momento, o que foi encontrado no sêmen foi DNA viral. Isso não necessariamente quer dizer que tenha vírus ativo. É preciso encontrar vírus ativo, replicante, para se comprovar que tem vírus com capacidade de infecção de pessoas através do sêmen”, esclarece.

De acordo com a OMS, a doença é transmitida principalmente pelo contato com fluidos corporais, lesões na pele ou em superfícies internas de mucosas, como boca ou garganta, gotículas respiratórias e objetos contaminados.

Especialistas do Departamento de Saúde Pública de Chicago (CDPH, na sigla em inglês) foram além e dividiram as atividades por risco de transmissão para alertar e acalmar a população.

Maior risco

  • Contato direto com lesões de pele, casquinhas e fluidos corporais;
  • Contato sexual íntimo – neste caso a camisinha não é suficiente para prevenir a transmissão do vírus da varíola dos macacos.

Risco aumentado

  • Beijar;
  • Ficar agarradinho;
  • Dançar em uma festa em ambiente fechado com pessoas sem camisa ou não completamente vestidas.

Risco intermediário

  • Compartilhar bebidas, talheres e utensílios;
  • Compartilhar a cama, toalhas e itens e higiene;
  • Dançar em uma festa em ambiente fechado com pessoas completamente vestidas.

Risco baixo (improvável)

  • Dançar em uma festa em ambiente externo com pessoas completamente vestidas;
  • Ambiente de trabalho;
  • Experimentar roupas em uma loja;
  • Encostar em maçanetas;
  • Viajar de avião ou ônibus;
  • Tomar banho ou nadar em piscinas, banheiras, rios, mar e cachoeira;
  • Usar banheiro público;
  • Usar transporte público;
  • Ir ao supermercado, bares ou academia.

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