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Fura-filas em pelo menos 17 cidades de Goiás são alvo do MP

Em Ceres, parentes de donos de hospitais foram vacinados como funcionários da saúde e, em Orizona, até personal trainers entraram na lista

atualizado

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Vinícius Schmidt/Metrópoles
Enfermeira preparam vacina para aplicar em idosos, em goiânia
1 de 1 Enfermeira preparam vacina para aplicar em idosos, em goiânia - Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles

Goiânia – Desde o início da imunização contra a Covid-19 em Goiás, casos e denúncias de fura-filas da vacina começaram a surgir. Ao todo, segundo balanço preliminar do Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO), existem procedimentos de investigação instaurados para apurar irregularidades na aplicação das vacinas em pelo menos 17 cidades goianas.

O número pode ser ainda maior, pois os cadastros dos inquéritos estão em andamento no sistema do MPGO. Nessas 17 cidades, são investigadas 19 situações diferentes em que pessoas fora dos grupos de risco ou de prioridade, conforme as regras da vacinação, foram imunizadas, passando na frente de quem, de fato, deveria ter recebido a dose da vacina.

Um dos casos investigados foi revelado pelo Metrópoles, com a vacinação do secretário de saúde Deijar do Carmo, de 59 anos, de Nova Veneza, a 33 quilômetros de Goiânia.

Mesmo estando em um função administrativa e fora do que é considerado como prioritário para quem atua na linha de frente da saúde, ele recebeu a primeira dose da vacina antes de uma fila de centenas de idosos no município.

Nesta semana, surgiram mais duas situações em Goiás. Uma é na cidade de Ceres, a 183 quilômetros de Goiânia, onde pelo menos 20 familiares de donos de hospitais foram incluídos na lista de vacinação como se fossem profissionais de saúde.

A outra ocorreu em Orizona, a 139 quilômetros da capital, onde o promotor Lucas César Costa Ferreira, depois de solicitar duas vezes, conseguiu ter acesso à lista dos vacinados e descobriu, além do secretário de Saúde do município, que médicos veterinários e até personal trainers foram imunizados.

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Outros casos

Em Ceres, cidade que é polo regional de atendimento e serviços de saúde, o promotor Marcos Rios vai oferecer denúncia contra os parentes dos donos de hospitais e sugerir uma multa no valor semelhante (R$ 50 mil) ao que foi cobrado em Pires do Rio (GO), onde o secretário de Saúde e esposa foram vacinados indevidamente.

“A proposta é que o dinheiro seja depositado no Fundo Municipal de Saúde. Do contrário, eles vão responder a processo, com grande chance de serem condenados. Esse pessoal dono de hospital se achou no direito de vacinar familiares, mães, pais, noiva, cunhado, primo. Eles foram forjando justificativas e lançaram como se fossem funcionários, mas eles nem trabalham no hospital. Foi má fé, fizeram de propósito”, afirma o promotor.

A lista de 877 vacinados foi divulgada no site da prefeitura. Por meio dela, não só o promotor, mas a população da cidade conseguiu identificar os casos e verificar em quais funções da saúde cada um dos envolvidos foi listado. O burburinho foi imediato.

“Eles colocaram funções como auxiliar de limpeza, de escritório, de serviços gerais. Tudo, para não chamar a atenção. Só que são pessoas de alta renda, fazendeiros, pessoas que andam de [veículos] Mercedes na rua, servidores públicos aposentados e até uma ex-primeira dama da cidade”, expõe Marcos Rios.

A prefeitura de Ceres divulgou uma nota dizendo que vai averiguar os casos de suposta irregularidade. O promotor pretende pedir o afastamento da secretária de Saúde do município até que o caso seja apurado. Os médicos que são donos dos hospitais estão sendo notificados para serem ouvidos na próxima semana.

Denúncias

Os promotores de Justiça, em Goiás, estão adotando a ação conjunta de solicitar a publicação das listas de vacinados nos perfis ou sites das prefeituras. À medida que a população local tem acesso a elas, logo surgem as denúncias e os casos de irregularidades. Em cidades pequenas, com menos de 20 mil habitantes, onde todos se conhecem, isso fica ainda mais fácil.

Foi assim em Orizona. O promotor Lucas César Costa Ferreira, que atua na cidade, conta que a reação foi imediata. “Quando soltaram a lista no site, o telefone da promotoria não parou de tocar”, diz. Moradores do município começaram a identificar uma série de pessoas que foram vacinadas que não atuam na linha de frente de combate à covid-19.

A prefeitura chegou a apresentar como argumento que a divulgação da lista seria uma invasão à intimidade dos vacinados, mas, depois de pedidos sucessivos do promotor, a relação de nomes acabou sendo publicada na internet. Diante da descoberta das possíveis irregularidades, o promotor recomendou que a prioridade, a partir de agora, seja dada aos idosos.

Além disso, no texto da recomendação, o promotor expressa que, enquanto todos os idosos e profissionais da linha de frente da saúde não estiverem imunizados, com as duas doses da vacina, as pessoas que furaram a fila na primeira etapa de vacinação não poderão receber a segunda dose.

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