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Foi repressão política o que manchou de sangue o centro do Recife

Dois chefes de família ficaram parcialmente cegos. Os manifestantes contra Bolsonaro foram atraídos para uma armadilha

atualizado

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ARTHUR SOUZA/PHOTOPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
Daniel Campelo, 51 anos, perdeu a visão após ser atingido por uma bala de borracha durante manifestação anti-Bolsonaro em Recife (PE)
1 de 1 Daniel Campelo, 51 anos, perdeu a visão após ser atingido por uma bala de borracha durante manifestação anti-Bolsonaro em Recife (PE) - Foto: ARTHUR SOUZA/PHOTOPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Paulo Câmara (PSB), governador de Pernambuco, não é o único que finge mandar na Polícia Militar. E nem a polícia do seu Estado é a única que finge obedecer ao governador. Mas foi no Recife, e somente lá, que a violência policial manchou o ar pacífico das manifestações do último sábado contra o governo Bolsonaro.

Manchou com sangue. Dois chefes de família, que apenas atravessavam a ponte Duarte Coelho, foram atingidos por balas de borracha e perderam a visão de um dos olhos. Uma vereadora do PT, que se limitava a dar explicações a um grupo de policiais, recebeu no rosto uma borrifada de gás de pimenta, caindo no chão.

Há vídeos à farta que mostram policiais atirando e jogando bombas de gás lacrimogêneo em um grupo reduzido de manifestantes, a correrem em desespero de um lado para o outro da ponte. Caíram na armadilha montada pela própria polícia, que fechou as duas cabeceiras da ponte e fez tiro ao alvo.

Aquela área do centro da cidade reúne a pouca distância o Palácio do Campo das Princesas, sede do governo de Pernambuco; o centenário Teatro Santa Isabel; e os prédios da Assembleia Legislativa do Estado e do Tribunal de Justiça. Do palácio, em 1964, o então governador Miguel Arraes foi arrancado e preso.

Há muito tempo que o coração do Recife não assistia a cenas  tão vergonhosas de repressão política, porque na ausência de qualquer ato de baderna, foi repressão política o que ocorreu. Quem deu ordem para isso? Câmara diz que não foi ele. A vice-governadora, do PC do B, diz que não foi ela. O malfeito é sempre órfão.

O comandante da operação policial foi afastado de suas funções por enquanto, bem como alguns dos policiais que dispararam a ermo e atacaram os manifestantes com cassetetes e protegidos por escudos. Abriu-se o rigoroso inquérito que se anuncia nessas horas e que costuma dar em nada ou em pouca coisa.

Os pernambucanos orgulham-se de sua história marcada por revoluções libertárias, mesmo que elas não tenham alcançado plenamente seus objetivos. Orgulham-se também de episódios memoráveis que protagonizaram como o da expulsão, em 1654, dos holandeses. Seu orgulho foi ferido, e não pode ficar assim.

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