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O que não tem limite (por André Gustavo Stumpf)

O barulho provocado pelo Bolsonaro prejudica os negócios, perturba a taxa de câmbio, derruba a bolsa de valores e eleva o risco Brasil

atualizado

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Jair Bolsonaro e Luciano Hang
1 de 1 Jair Bolsonaro e Luciano Hang - Foto: Reprodução

O governo Bolsonaro terminou. O presidente renunciou às suas prerrogativas de comandar o processo de desenvolvimento nacional. Também desistiu de arbitrar tensões dentro do espaço político dos antagônicos e recuou da possibilidade de gerenciar problemas administrativos.

Preservou, porém, a caneta presidencial em plena forma. Ele tem o poder de nomear e demitir, prender e mandar soltar. Além de viajar, de maneira oficial, para prestigiar quem quiser. E tem preferido quartéis militares e formaturas de policiais.

A desintegração do governo aparece claramente nas sucessivas e significativas mensagens de empresários das áreas de finanças, indústria, agronegócio e suas variantes. Todas apelam para a paz e a serenidade na atmosfera política atual.

Essa postura sugere que o barulho provocado pelo presidente da República prejudica os negócios, perturba a taxa de câmbio, derruba a bolsa de valores e eleva o risco Brasil. É um desastre para a imagem do país, dentro e fora das fronteiras, o que provoca queda de negócios e fuga de capitais.

O presidente prefere andar de motocicleta, montar cavalos e fazer discursos impactantes nos quais ataca pessoas, instituições e revela delírio persecutório. Sempre há algum inimigo atrás de alguma porta invisível.

Seria mais fácil governar e tentar cativar o eleitor por intermédio de obras e realizações. Bolsonaro prefere constranger, atacar, humilhar em nome da defesa do país contra adversários que só existem na sua poderosa imaginação.

Na verdade, ele adotou o estilo e o roteiro de Hugo Chávez, o coronel venezuelano que, depois de vencer uma eleição limpa, patrocinou o golpe parlamentar que o transformou em ditador com plenos poderes. O regime quebrou o país, tornou a Venezuela, outrora rica e próspera, em país isolado na comunidade internacional.

Os militares receberam vantagens financeiras e se resignaram a constituir a guarda pretoriana do presidente. O país se transformou em santuário de traficantes de drogas, e os milicianos ganharam os garimpos mais lucrativos. O povo passa fome.

Dentro desta moldura venezuelana, começam a pipocar no Brasil notícias e informações sobre desvios, propinas e outros malfeitos. A CPI da covid avançou até o possível, mas seus limites são evidentes. Até agora, as investigações ficaram na periferia dos fatos. Não avança mais porque há um pacto de silêncio para não desmontar a atual estrutura de poder.

Testemunhas somem, outras se recusam a falar o que leva os senadores a discutir problemas menores e acessórios. É difícil chegar ao âmago do processo de compra de vacinas no Brasil. Quem conhece o assunto afirma que vale a pena investigar a fundo, por exemplo, o processo de compra da vacina AstraZeneca.

De repente, aparecem vítimas das rachadinhas, sistema criado para desviar salários de funcionários na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. É possível que a mesma prática tenha ocorrido na Câmara dos Deputados. As desconfianças relativas ao grupo Bolsonaro&filhos são fundamentadas. Os meninos estão ganhando bem comprando boas casas em Brasília e abrindo empresas de eventos e atividades paralelas. São sinais exteriores de riqueza.

A resposta a tudo isso é elevar a temperatura política, aumentar a crítica às instituições democráticas brasileiras e tentar colocar as polícias a funcionar como milicias do presidente. É a antessala do golpe.

 O próximo 7 de setembro oferece a oportunidade ideal para que a soma de todos os medos exploda na realidade tropical. Brasileiros estão sendo bombardeados nos últimos dias por mensagens de celular que anunciam tragédias diversas: estradas bloqueadas, falta de comida e remédios, tanques nas ruas, policiais em estado de rebelião.

São recados dos mensageiros das trevas, a ultradireita enlouquecida que pretende restabelecer a ditadura. Ao lado disso há muita estupidez, combinada com desconhecimento da história do Brasil.

Quanto mais caminha na direção do conflito absoluto, mais o governo se entrega nas mãos do grupo político chamado Centrão, que agora tem a chave do cofre, modifica leis a seu favor no Congresso e enterra a operação lava jato.

É o suicídio político anunciado, antecipado e até previsível. Depois da derrota eleitoral, Bolsonaro poderá alegar fraude e se recusar a deixar o Palácio do Planalto. Trump fez o mesmo. Acabou derrotado, vencido pelo seu oponente, a quem chamava de Soneca. Nem sempre a história se repete.

Mas está muito parecida. Bolsonaro e seus aliados, na verdade, trabalham para entregar o poder ao Partido dos Trabalhadores. Einstein disse que ‘só duas coisas não têm limites: a estupidez humana e o universo. Quanto ao universo, tenho dúvidas”.

 

André Gustavo Stumpf escreve no Capital Político. Formado em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), onde lecionou Jornalismo por uma década. Foi repórter e chefe da sucursal de Brasília da Veja, nos anos setenta. Participou do grupo que criou a Isto É, da qual foi chefe da sucursal de Brasília. Trabalhou nos dois jornais de Brasília, foi diretor da TV Brasília e diretor de Jornalismo do Diário de Pernambuco, no Recife. Durante a Constituinte de 88, foi coordenador de política do Jornal do Brasil. Em 1984, em Washington, Estados Unidos, obteve o título de Master em Políticas Públicas (Master of International Public Policy) com especialização política na América Latina, da School of Advanced International Studies (SAIS). Atualmente escreve no Correio Braziliense. ⠀⠀

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