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Crise de energia aumenta risco eleitoral de Bolsonaro (Por João Bosco)

Na vida real, o desemprego no primeiro trimestre subiu para 14,7%, atingindo um recorde de 14,8 milhões de brasileiros

atualizado

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F.Diorio/Estadão Conteúdo
Furnas
1 de 1 Furnas - Foto: F.Diorio/Estadão Conteúdo

Além da falta de vacinas, a crise anunciada do sistema hídrico, com risco de apagão no segundo semestre, acrescenta mais uma entre muitas dificuldades ao governo federal e projeta mais desgaste político ao presidente Bolsonaro.

Na escassez de energia e vacinas, faltou antecipação ao governo. Mas não faltaram previsões que colocaram o setor em alerta desde o final de 2020, com as usinas térmicas em funcionamento desde outubro do ano passado.

Mas as contas de luz só receberam bandeira vermelha, em grau mais baixo, neste mês de maio com a crise hídrica já em curso. Essa protelação da bandeira vermelha se assemelha à prática de evitar o aumento do combustível, o que só resulta em acúmulo de prejuízos que, mais dia, menos dia, vão para a conta do consumidor.

Em junho passa a vigorar a bandeira vermelha 2, que impõe custo ainda mais elevado. E, para agravar, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) propõe aumento de 21% no valor da bandeira vermelha no seu patamar 2, o mais elevado.

O aumento adicional representa uma espécie de pré-racionamento, ou seja, se não for suficiente para reduzir o consumo, medidas mais drásticas, como blecautes programados, por exemplo, podem ser tomadas. É custo e seca para o cidadão, portanto para o eleitor.

O apagão de 2001 ainda está na memória coletiva como um drama nacional. Contribuiu, sem dúvida, para a saída do PSDB do poder, como um reflexo da economia, em tempos sem pandemia. À época, como agora, o governo já fora alertado para o problema em 1999, ou seja, dois anos antes.

Não por acaso, no último dia de maio, segunda-feira passada, a agenda do ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, registrou a singular presença do economista Pedro Parente, ex-ministro da Casa Civil no governo de Fernando Henrique Cardoso.

O contexto que trouxe Parente a Brasília o fez menos uma visita e mais uma sombra do passado: foi ele quem administrou o racionamento de energia há duas décadas à frente de um gabinete de crise que agora se transfere para o prédio em que dá expediente Bento Albuquerque.

Os reflexos políticos da recém-iniciada operação emergencial contra um novo apagão já são visíveis. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, foi a voz da bancada mineira contra as restrições de vazões de água de algumas hidrelétricas, entre as quais a de Furnas, impostas pelo Ministério das Minas e Energia.

A reação mineira foi em bloco, uniu adversários regionais, trouxe a Brasília o governador Romeu Zuma e pode influir para tornar letra morta a privatização da Eletrobrás, aprovada na Câmara, mas que depende agora de Pacheco para ser referendada no Senado.

O tom da reação revogou o padrão mineiro da discrição. Pacheco acusou o governo de “apoderar-se das águas brasileiras para seu propósito único de geração de energia”. O habitualmente sóbrio senador Antônio Anastasia, ex-governador do Estado, considerou “um desrespeito a Minas, que não será tolerado”.

As reformas tributária e administrativa também subiram no telhado. Uma inconfidência do ministro Paulo Guedes a Rodrigo Pacheco confirmou o que já se sabia: o presidente Bolsonaro não quer a reforma administrativa. Pode-se acrescentar: nunca a quis.

A tributária, já desfeita pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, em suas versões originais, segue fatiada e errática e dependerá mais na frente do mesmo Senado que anda de mau humor e abriga uma CPI de grande desgaste para o governo.

O presidente Bolsonaro mantém-se fiel à estratégia de dobrar a aposta diante de revezes, mas o limite da retórica combinada com ações pirotécnicas é a falta de resultados efetivos de gestão.

No mundo paralelo do ministro da Economia, Paulo Guedes, tudo voltou a melhorar. Mas o sonho que tenta vender não vira votos, porque a necessidade é senhora.

Na vida real, o desemprego no primeiro trimestre subiu para 14,7%, atingindo um recorde de 14,8 milhões de brasileiros. É a maior taxa e o maior contingente de desocupados já registrado pela série histórica do IBGE, iniciada em 2012. Os efeitos da pandemia sobre a economia são devastadores e o governo não tem como repetir o auxílio emergencial nos patamares anteriores.

O presidente adotou o sarcasmo como resposta aos que dependem do auxílio emergencial, recomendando que busquem empréstimos bancários. Não foi a única pilhéria dos últimos dias, o que faz desconfiar que sente o golpe da perda de capital eleitoral.

João Bosco Rabello escreve no https://capitalpolitico.com/

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