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Àqaba, a cidade segura que nunca dorme (por Felipe Sampaio)

As ruas eram calmas e as pessoas tranquilas, mesmo até a meia-noite, quando eu voltava ao hotel. Não se tratava de gente indo para a farra

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Àqaba
1 de 1 Àqaba - Foto: Reprodução

Estive na Jordânia a trabalho, pelo Ministério da Defesa, em 2017. Chamou minha atenção a atmosfera de segurança que Àqaba deixava transparecer, refletida num movimento constante de pedestres, de dia e à noite.

No hotel alguém me contou que aquele vai e vem girava em torno do hábito da oração, com as pessoas indo à mesquita a qualquer hora, até tarde da noite. Interessado em segurança urbana, saí para ver de perto.

Ficar hospedado na área central facilitou caminhar após o jantar para conhecer a redondeza. Ali seguiam abertas lojas de todo tipo, açougues, barracas de verduras e frutas, lanchonetes, além das mesquitas.

Frank Sinatra imortalizara Nova York com o verso “the city that never sleeps”, sem imaginar que no Mar Vermelho havia uma cidade portuária que também não para. Pessoas perambulando o tempo todo, inclusive as mulheres, com ou sem véus e burcas. Jovens mulçumanos animavam as praças acessando redes sociais e apps.

É verdade que a Jordânia é um país árabe seguro em termos de terrorismo. Contudo, a sensação de segurança da população em relação à criminalidade comum era evidente. Aliás, vi pouca polícia em Àqaba.

As ruas eram calmas e as pessoas tranquilas, mesmo até a meia-noite, quando eu voltava ao hotel. Não se tratava de gente indo para a farra. Estavam realmente fazendo compras e indo aos cultos. Vale destacar que os espaços públicos eram limpos, iluminados e conservados.

Sessenta anos antes, a americana Jane Jacobs havia publicado Morte e Vida de Grandes Cidades (1961), que permanece leitura de cabeceira dos temas urbanos. Criticava o urbanismo focado na infraestrutura para automóveis e para os grandes negócios.

Morando em Nova York, mobilizou-se contra a proliferação de vias expressas, viadutos e condomínios, defendendo a preservação dos modos de vida comunitários e a memória histórica da cidade.

Segundo a escritora, “a paz nas ruas não é mantida simplesmente pela polícia, sem negar sua necessidade”. Chamou o burburinho nas ruas das metrópoles de “o balé das boas calçadas”.

Jacobs via as cidades como um lugar a serviço da segurança e da liberdade das pessoas. Para ela, é nas calçadas que a vida social acontece no dia a dia. Pôde observar na Big Apple o mesmo fenômeno que notei em Àqaba: as ruas mais movimentadas, por pedestres e pequenos negócios, são mais seguras do que as vias onde apenas carros trafeguem.

Nas calçadas defendidas por Jacobs rolavam não apenas fofocas de vizinhos, mas também dicas sobre perigos e insegurança, criando-se uma rede espontânea de proteção coletiva.

Para os mais pobres, a importância do espaço público é ainda maior, porque faz o papel de sala de visita e jardim. É função das prefeituras tornar possível o balé das boas calçadas, por meio de pavimentação, iluminação, mobilidade, saneamento, limpeza e conectividade.

Àqaba soube criar essa ambiência favorável ao convívio, aos pequenos negócios e aos costumes culturais, durante o dia e à noite. Sinatra e Jane Jacobs teriam adorado conhecê-la.

 

Felipe Sampaio, ex-secretário executivo de Segurança Urbana do Recife; foi assessor especial dos ministros da Defesa (2016-2018) e da Segurança Pública (2018); é membro-fundador do Centro Soberania e Clima.

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