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Juiz usa constelação familiar para resolver conflitos judiciais

Criado pelo brasileiro Sami Storch, o direito sistêmico une a terapia ao âmbito jurídico e ajuda na resolução de conflitos

atualizado

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Stela Woo/Metrópoles
constelação familiar
1 de 1 constelação familiar - Foto: Stela Woo/Metrópoles

O sistema judiciário foi, por muito tempo, conhecido pela falta de flexibilidade. Por conta desse engessamento, os processos foram se acumulando, as decisões nem sempre sendo as melhores e surgiu a necessidade de reinventar o fluxo. Abrindo as portas para novas abordagens, surgiu o direito sistêmico, inventado pelo juiz brasileiro Sami Storch. A prática sugere incorporar técnicas e princípios das constelações familiares para a mediação de conflitos.

Sami procurou a constelação familiar para resolver um problema pessoal. O sistema, sintetizado pelo teólogo, filósofo e psicólogo alemão Bert Hellinger, propõe encenar a situação com pessoas não ligadas pessoalmente ao conflito depois de um momento de meditação e visualização para esclarecer os próprios sentimentos. Por meio do teatro improvisado e sem roteiro, as partes não só entendem os próprios motivos como percebem o lado do outro e passam a ter mais empatia.

Vinicius Santa Rosa/Metrópoles

“Participei de um workshop, constelei minha questão e fiquei encantado com a força e a profundidade de como se revelam dinâmicas ocultas. Comecei a estudar o assunto e, como advogado, passei a olhar para as situações que eu lidava na prática”, conta o advogado. Depois de passar em um concurso e se ver responsável por presidir audiências, Sami percebeu o quão sofridas e desgastantes eram as reuniões. “Seguindo estritamente o código de processo civil, o resultado não costumava ser favorável à paz.”

Então, começou a usar frases sistêmicas em suas audiências. Conseguiu um resultado tido como impossível logo na primeira vez. Era um processo muito antigo, de uma filha cobrando do pai alimentos que tinham se acumulado ao longo de sua infância. No entanto, segundo as leis sistêmicas de Bert Hellinger, um filho exigir algo do pai traria fracasso para as duas partes. “Consegui mostrar o que a filha realmente buscava, e os sentimentos do pai. Ela desistiu do processo e os dois se abraçaram e choraram”, diz.

A partir do resultado positivo, Sami passou a praticar com mais frequência. Em audiências envolvendo a guarda de crianças, por exemplo, convidava as partes a olharem o que existe atrás do outro. “Os pais, os avós, como estão conectados, como os comportamentos estão ligados, como se repetem. Depois, pedi que olhassem para si mesmos, percebendo como padrões são reproduzidos, mesmo de maneira inconsciente. E, por fim, que prestassem atenção em como o filho age quando escuta coisas como ‘sua mãe foi um erro’ ou ‘seu pai não serve para nada'”, orienta.

Os resultados foram maravilhosos. Nas vésperas da Semana Nacional de Conciliação, o juiz resolveu fazer uma vivência aberta de Constelação com 60 pessoas em processos de divórcio ou pensão alimentícia. Comunicou o presidente do tribunal e o corregedor-geral, que aplaudiram a iniciativa e deram todo o apoio necessário. “Durante a semana de evento, os advogados presenciaram um clima inédito em um evento judiciário. As partes chegaram mais dispostas a fazer um acordo, quando normalmente estão na defensiva, prontas para brigar”, lembra.

O projeto deu tão certo que logo se multiplicou, e advogados, servidores e voluntários apareceram nas sessões para ajudar no trabalho e nas estatísticas.

Atrativa por ser bastante diferente de uma audiência judicial, a constelação foge do estilo “lavagem de roupa suja”, bem conhecido de audiências. “É um processo não verbal, vamos direto ao ponto, direto onde elas precisam olhar para se abrir e perceber a importância do outro. Atuamos na essência do conflito, não nos detalhes”, explica o juiz.

Na terceira vivência, a ação chamou atenção da imprensa e logo se espalhou pelo país. Sami criou o termo “direito sistêmico” e viu outros juízes e comarcas adotarem o exemplo. Ele foi convidado pela Escola Hellinger no Brasil para ministrar uma pós-graduação no assunto e hoje vê o termo que cunhou aparecer na pauta dos maiores eventos jurídicos do país.

Segundo ele, o direito sistêmico não é uma técnica ou um método para ser aprendido racionalmente. A pessoa com desejo de atuar com isso precisa fazer, ela mesma, um trabalho interno para poder olhar com isenção o que se apresenta à sua frente. “É preciso ter passado pelo caminho para conduzir alguém por ele”, afirma.

Foco nas relações humanas
Em junho de 2018, no primeiro I Congresso Internacional Hellinger de Direito Sistêmico, que aconteceu em São Paulo, Sami viu até pessoas de outros países dando testemunhos sobre o que acontece no Brasil não ocorre em lugar nenhum. “Existe algo de grandioso e muito bonito acontecendo no nosso país. A crise gera abertura pela necessidade. Estamos carentes de novas possibilidades e soluções. Está na alma do brasileiro procurar opções”, diz o juiz.

A mediação de conflitos também está na alma de Sami, apesar de, na adolescência, ter sonhado em ser psicólogo. O pai dele é judeu e ativista pela paz no Oriente Médio e a mãe é professora, psicoterapeuta e artista plástica.

“Meu pai tem essa missão, e o filho é uma sequência do pai, até se ele o renegar. Na alma do filho, estão presentes o pai e a mãe assim como eles são. Eu nunca me interessei por participar das coisas dele, mas casei com uma árabe e peguei esse engajamento dele. Sempre tive gosto por compreender as pessoas, as relações humanas, as incoerências. E o que é o direito se não o tratamento das relações humanas?”, conta.

Veja a explicação de como funciona o método:

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