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Regionalizar a cultura do DF é um dos desafios do governo Ibaneis

Ao cidadão de fora do Plano Piloto, cabe se locomover da periferia ao Eixo Monumental para assistir aos grandes eventos

atualizado

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Filipe Cardoso/Especial para o Metrópoles
Brasília (DF), 25/09/2018 DF na Real. Local: Casa do Cantador, Ceilândia. Foto: Filipe Cardoso/Especial para o Metrópoles
1 de 1 Brasília (DF), 25/09/2018 DF na Real. Local: Casa do Cantador, Ceilândia. Foto: Filipe Cardoso/Especial para o Metrópoles - Foto: Filipe Cardoso/Especial para o Metrópoles

O Distrito Federal é um espelho do Brasil. Aqui, a qualidade de vida e o PIB estão concentrados nas imediações do Plano Piloto, enquanto o descaso e falta de oportunidade, nas cidades do DF. Em relação ao acesso aos bens culturais, a lógica é a mesma. Brasília, a capital do poder, é o nosso eixo Rio-SP, enquanto as regiões administrativas, o Norte e o Nordeste.

Historicamente, quase todo o investimento em cultura dos últimos governos tem sido encaminhado para esse centro. Ao cidadão das cidades, cabe se locomover da periferia ao Eixo Monumental para assistir aos grandes eventos públicos ou privados, estes últimos quando são economicamente acessíveis.

Festas de calendário festivo não são sequer fragmentadas. Em 2018, o Réveillon de artistas nacionais e locais foi no Estádio Mané Garrincha e na Prainha. Quem não tem carro não foi ao Plano Piloto desfrutar da festança gasta com o dinheiro de todos (só a sertaneja Naiara Azevedo custou R$ 275 mil aos cofres públicos). À meia-noite, nada aconteceu nas administrações regionais, enquanto os fogos foram queimados efusivamente no céu da Esplanada.

O Carnaval, a festa mais popular entre nós, virou uma folia da elite do Plano Piloto, com blocos patrocinados por cervejarias. A tentativa de bancar a festa pela Lei de Incentivo à Cultura (LIC) recaiu na cruel lógica de mercado. Os interessados em investir só escolhem grupos do Plano Piloto, onde reside a cobertura da mídia local e nacional.

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Há quatro anos, as escolas de samba, a maioria centrada nas cidades do DF, foram cruelmente riscadas da avenida pelo incentivo público. Antes, por incompetência governamental, o desfile chegou a ser transferido de Ceilândia para o Plano Piloto, sob a alegação de que não havia quórum popular. Ora, não se gastava nada para promover o evento e torná-lo atrativo. Ficava esquecido e invisível para a população.

Além disso, numa visão burguesa e perversa sobre a cultura popular, alguns gestores públicos do DF comparavam perversamente a qualidade do Carnaval de Brasília ao do Rio e de São Paulo, onde circulam milhões de reais. Não levavam em conta a vivência anual de uma comunidade em torno da festa e o esforço para criar o melhor com uma fração de investimento.  

No Rio, em Recife, Salvador e até na improvável São Paulo carnavalesca, além dos recursos em infraestrutura e publicidade, a festa é vista como um investimento rentável para o Estado. Aqui, restringiu-se a um modesto edital da Secretaria de Cultura e ao amor dos foliões que colocam o bloco na rua.

Não há um projeto para descentralizar o Carnaval pelas regiões administrativas. Selecionar artistas e bandas e montar um palco em Sobradinho, outro em Taguatinga, por exemplo. Quem quiser que pegue o metrô para a Estação Central e, na volta, jogue-se na caótica Rodoviária.

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Há, nas cidades do DF, uma profusão de artistas e coletivos que atravessam o ano sem pauta de trabalho em suas sedes. Ora por falta de incentivo público, ora por ausência de espaços. No último ano eleitoral, o governo Rodrigo Rollemberg reagiu a uma inércia política e inaugurou dois centros culturais, em Samambaia e Planaltina, que precisam ser continuados em suas gestões pelos próximos anos.

A implantação desses centros deve ser uma política de Estado e não de gestão. Há cidades no DF sem um espaço público sequer. É preciso acabar com a má política de engavetar os bons projetos do governo anterior. Foi assim com Arte por Toda Parte (do governo Roriz), que fazia uma itinerância de artistas diversos pelas cidades, e o Temporadas Populares (do governo Cristovam Buarque), inesquecível na memória de quem viveu.   

Hoje, nas cidades, há excelentes teatros do Sistema S (Sesc e Senai) que precisam ser ocupados em parceria com o Governo do Distrito Federal e sua potente rede escolar. Outros espaços estão abandonados, como o Teatro de Sobradinho, que serve para encontros religiosos e reuniões de toda natureza. O Teatro da Praça, de Taguatinga, palco de tantas movimentações, necessita de atenção urgente. Sem falar em Ceilândia, que carece de um Centro Cultural público e moderno.

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O Fundo de Apoio à Cultura (FAC), instrumento de política de Estado, precisa ser mais direcionado às cidades. Houve, na última gestão do secretário Guilherme Reis, edições regionalizadas muito bem-vindas e comemoradas. Mas é preciso aprofundar essa política, porque as cidades do DF necessitam de movimentação cultural e econômica. Essa demanda reprimida foi dita nas urnas, quando, de forma esmagadora, a população das cidades apostou no governo Ibaneis Rocha.

O cidadão que está a quilômetros do Plano Piloto e seus Lagos merece estar num território criativo e cheio de possibilidades. Até para decidir quando e como irá à futura e desejada reabertura Teatro Nacional Claudio Santoro, monumento de todos, cujo abandono é marca do descaso público das últimas gestões.

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