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Baiana System é o novo farol da música baiana

Grupo independente ganhou visibilidade nacional depois de ser ameaçado de censura após comandar um “Fora Temer” no carnaval de Salvador

atualizado

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baiana system
1 de 1 baiana system - Foto: Divulgação

A banda Baiana System é um nome respeitado no circuito independente. Brasil afora, move pequenas multidões em seus shows (aqui, em Brasília, inclusive). Neste carnaval, o grupo virou notícia nacional ao ser ameaçado de retaliação na próxima folia por puxar um “Fora Temer” nas barbas da Prefeitura de Salvador (patrocinadora do trio elétrico e politicamente aliada ao governo federal).

 

Apesar do horror que significa qualquer ameaça de censura (patrocina-se o show do grupo e não as suas ideias), o ato em si é uma oportunidade para se atentar ao som da Baiana System, que, de cara, é diferente de tudo que sobrou da combalida axé music.

Baiana System é como um farol a apontar outros mares para a música baiana navegar, ainda tão represada ao carnaval e seus hits imediatos

Modelo esgotado

A presença de artistas de outros gêneros no carnaval baiano, como os sertanejos e os grupos de forró eletrônico, não é simplesmente uma tentativa de democratizá-lo. Se dependesse da indústria que move a axé music, a festa sempre ficaria entre os seus. A entrada dos “estrangeiros” revela a fragilidade da atual música de carnaval, esgotada e exausta como um folião em fim de bloco.

Grandes ícones da MPB, outrora da axé music, como Ivete Sangalo, Claudia Leitte, Carlinhos Brown e Daniela Mercury, souberam se descolar dessa matriz com carreiras nacionais edificantes e, atualmente, relacionam-se com o carnaval baiano como uma agenda pontual dentro muitos afazeres artísticos.

Quando se poderia imaginar, nos tempos áureos, Ivete brilhando absoluta na Sapucaí em pleno domingo de carnaval?

O próprio formato do carnaval baiano, desgastado pela poderosa indústria que ilhou as ruas de Salvador com cordas e camarotes, está esgotado em relação as ruas democráticas de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Brasília, de Olinda e de Recife, onde a “praça é do povo como o céu é do avião”. Agora, na capital baiana, busca-se o retorno ao carnaval sem cordas e verdadeiramente multicultural, com vários ritmos no comando sem gerar crises sensacionalistas entre meia dúzia de estrelas decadentes.

É nesse sentido que a Baiana System aponta como o vagão dessa locomotiva. Basta olhar o vídeo do animado “Fora Temer” para observar a quantidade de gente atrás do trio. Parece o carnaval livre dos anos 1970, quando a multidão, ainda embasbacada pela invenção do trio elétrico de Dodô & Osmar, divertia-se livremente: negros e brancos sob a tríade frevo da guitarra elétrica, suor e cerveja.

É preciso conhecer a Baiana System e suas letras que falam de um povo marginalizado. Há uma referência antropofágica ao que foi o fenômeno Nação Zumbi nos anos 1990 e seu manifesto urbano. Aparece a fusão de ritmos urbanos e carnavalescos que definem a geografia acidentada de Salvador. Tem o diálogo com aqui e agora de um povo cansado de “rimas fáceis” e “dancinhas da hora”.

Você já passou por mim
E nem olhou pra mim
Você já passou por mim
E nem olhou pra mim
Acha que eu não chamo atenção
Engana o seu coração
Acha que eu não chamo atenção (…)
Não tem cor não tem cara, Começou não vai parar
Coração vai disparar, Não tem como dedurar

Na canção “Invisível”, a Baiana System faz a ponte com ritmos. É rap, mas não é. É música misturada, que fala poeticamente das desigualdades tão marcantes em Salvador e multiplicadas no carnaval dos blocos de abadá — onde negros puxam as cordas ou assistem à festa do lado de fora, apertados debaixo dos camarotes.

Temas árduos para motes musicais, como a especulação imobiliária (uma indústria voraz em Salvador, basta se lembrar do escândalo que derrubou o todo-poderoso ministro Geddel), ficam deliciosos na batida da Baiana System, como em “Lucro (Descomprimindo)”.

Não há oportunismo algum quando a Baiana System grita “machistas, fascistas não passarão”, nem quando brada “Fora Temer”. É tudo quase letra de música. Aliás, canções de primeira grandeza.
Ouça o disco “Duas Cidades” e vamos seguir atrás do trio, aquele que só não vai quem já morreu.

 

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