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Acondroplasia: medicamento faz crianças crescerem até 1,5 cm por ano

Pacientes com o tipo mais comum de nanismo podem ter crescimento potencializado por medicamento, diminuindo problemas associados à condição

atualizado

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1 de 1 maria fernanda 1 - Foto: Arquivo Pessoal

A acondroplasia é o tipo de nanismo mais comum no planeta — estima-se que uma a cada 25 mil crianças nascidas no mundo tenha a condição genética. Apesar de ser um problema comum e documentado há séculos, ainda se sabe muito pouco sobre como é a vida do paciente para além da baixa estatura.

Os pacientes com a disfunção costumam apresentar outras comorbidades resultantes do problema genético, como apneia do sono, hidrocefalia, compressão cervical, deformidades de membros inferiores e estenose espinhal, por exemplo.

Por muitos anos, a condição não tinha tratamento: o paciente normalmente passava por procedimentos cirúrgicos para alongar os ossos e descomprimir o canal medular, mas nenhuma terapia ajudava a resolver o problema. Depois de muitos anos de pesquisa, foi aprovado, em novembro de 2021, pela Anvisa, o primeiro medicamento específico para acondroplasia.

O remédio, fabricado pela farmacêutica BioMarin, se chama Voxzogo, promove o crescimento dos ossos e é recomendado para crianças a partir dos dois anos de idade. Apesar de já aprovado, não está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) nem é fornecido pelos planos de saúde.

Freio ao crescimento

O médico geneticista Wagner Baratela, da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa, em São Paulo, explica que, para evitar que as pessoas cresçam eternamente, o gene FGFR3 funciona como um freio — quando se chega na altura ideal e os ossos estão corretamente formados, ele é ativado.

Nos pacientes acondroplásicos, o gene é ativado desde o início da vida. “É como dirigir com o freio de mão puxado. O remédio solta o freio”, diz o médico. As pesquisas já publicadas sobre o funcionamento do Voxzogo mostram que crianças que tomam o medicamento crescem, em média, 1,57 centímetros por ano a mais do que o grupo que tomou placebo.

“Além do ganho na estatura, diminui a desproporcionalidade do corpo do paciente, que costuma ter braços e pernas mais curtos. Até o momento, não foi documentado nenhum efeito adverso grave, e a pesquisa avança para testar o medicamento em bebês. A expectativa é que eles também apresentem melhora neurológica”, conta Baratela.

Resultados do medicamento

Maria Fernanda Rodrigues Monteiro, 2 anos e 5 meses, foi a primeira criança no Brasil a receber o medicamento por judicialização e, oficialmente, é a pessoa mais nova no mundo a tomar o Voxzogo. Tomando as injeções diariamente há três meses, a expectativa da família é que a curva de crescimento dela chegue o mais perto possível do considerado normal para meninas da mesma idade.

“Já percebemos algumas mudanças na face dela, a medicação aumenta o crescimento, mas também age em toda a parte óssea. Ela não tinha osso nenhum no nariz, a gente colocava a mão e sentia um buraquinho. Hoje, o osso começou a crescer, dá pra ver. A testinha dela também era proeminente, e percebemos que está diminuindo”, explica a mãe da menina, Neila Rodrigues da Paixão Monteiro.

Ela conta que Maria Fernanda é a primeira criança na família com acondroplasia, e desde o pré-diagnóstico, ainda na gestação, começou a pesquisar sobre a condição. Foi assim que descobriu o Voxzogo, que ainda estava em testes na Europa.

“Era uma esperança e virou uma meta pra mim. Acompanhei passo a passo a publicação dos estudos e, quando foi aprovado na Europa, já comecei a me preparar para conseguir o remédio para a minha filha”, lembra Neila.

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A menina já passou por duas cirurgias desde o nascimento: uma para resolver a estenose espinhal, uma compressão no pescoço típica de pacientes com acondroplasia, e outra para lidar com uma otite de repetição, também tradicional nestes indivíduos.

“Temos grandes expectativas para o futuro dela com o remédio, principalmente diminuir a necessidade de intervenções cirúrgicas, que cresça saudável e que não sofra preconceito. Quando tivemos o diagnóstico, a primeira coisa que veio na minha cabeça, o que me deu mais medo, foi o preconceito que ela iria sofrer. Espero que a medicação minimize esse problema”, conta a mãe da menina.

Maria Fernanda deve continuar tomando o Voxzogo até o início da puberdade, com 12 ou 14 anos.

Realidade do paciente

Durante o 15º Encontro da Sociedade Internacional de Displasia Esquelética, que aconteceu em Santiago, no Chile, o pesquisador Juan Llerena Júnior, médico geneticista clínico e coordenador do Centro de Genética Médica do Instituto Fernandes Figueira, da Fiocruz, apresentou, pela primeira vez, o maior estudo sobre o impacto da acondroplasia na vida de pacientes da América Latina.

A pesquisa, feita em parceria com hospitais da Colômbia, Argentina e Brasil, mostra que 53,4% dos adolescentes com a condição sentem dor em pelo menos um lugar do corpo e 10,3% têm dor em três regiões. Entre os adultos, 23,1% tiveram que reduzir as atividades diárias por conta da acondroplasia e 13% precisaram diminuir a carga de trabalho.

Entre os 172 entrevistados, 57% afirmam que perdem a energia e se sentem cansados muito rápido, 54% têm dor para andar e a mesma porcentagem têm problemas para subir ou descer escadas. Cerca de 70% dos participantes dizem ter dificuldades para ficar de pé por muito tempo.

Os resultados são importantes para mostrar que o paciente acondroplásico sofre com problemas além da baixa estatura. “Sou geneticista há muitos anos, trabalho com essa população, mas não tinha noção do quão adoecidos são”, diz Llerena. O trabalho foi financiado pela farmacêutica fabricante do remédio.

Políticas públicas

No Brasil, a condição sequer era considerada uma deficiência até 2004, e os dados servem para ajudar a convencer os gestores da situação dos pacientes e agilizar a aprovação de medicamentos ou novos tratamentos para as pessoas com acondroplasia.

“Com esse nível de informação, começamos a melhorar a orientação para o paciente. Vamos aprendendo de forma dinâmica e, com isso, reduzimos as complicações. É uma doença multissistêmica, debilitante e progressiva que gera diversos desafios para o dia a dia de quem convive com esta condição”, explica o geneticista.


* A repórter Juliana Contaifer esteve em Santiago, a convite da farmacêutica BioMarin, para acompanhar a divulgação da pesquisa sobre o impacto da acondroplasia na vida do paciente da América Latina.

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