Roji ostenta nos ingredientes, mas resvala em generalidades

Restaurante na 408 Sul trabalha gastronomia japonesa com releitura contemporânea. Traz insumos de qualidade, mas escorrega na execução

atualizado 20/09/2019 19:00

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Em funcionamento desde março na 408 Sul, o Roji surge na esteira de um filão um tanto recente do mercado cosmopolita em expansão de Brasília: o do restaurante japonês dito contemporâneo ou fusion (este último termo já sucumbindo no modismo lexical). Tal como fizeram Oma, Kawa e o renovado Sushisan, Roji apresenta um modelo internacional, porém, ocidentalizado de serviço e menu. Esta proposta carrega, de um lado, uma perspectiva muito boa, pois se baseia em ingredientes de qualidade e profissionais capacitados, coisa rara na selva de rodízios meia-boca da capital. Ou seja, no Roji é possível encontrar uma variedade maior e melhor de peixes, por exemplo.

É claro que também conta a favor do Roji a experiência do itamae-san, o cara detrás do balcão a comandar a equipe vulgarmente chamada de sushimen. Neste caso, o restaurante tem como chef Bruno Kamakura, cozinheiro com experiência em São Paulo (o que não é por si atestado de competência) em restaurantes de boa fama. Espere, portanto, do Roji, um niguiri bem feito, cortes de sashimi precisos e um atendimento correto e responsável, à altura do tíquete-médio cobrado na casa.

Sou um sujeito mais de balcão e de comida japonesa clássica. E há um motivo simples para isso: acho que não temos em Brasília uma aproximação suficientemente boa com a cozinha clássica nipônica para sairmos metendo maçarico e óleo trufado em tudo. Quando me refiro à tradicional gastronomia japonesa, falo deste pequeno recorte que importamos e popularizamos no Brasil a partir dos anos 70 (mesmo em São Paulo, que já mantinha alguns restaurantes a reboque da imigração japonesa desde a década de 1930).

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Jo de salmão com ovo de codorna

Veja o caso do sashimi de salmão com um molho cítrico (neste caso à base de limão-siciliano) servido sob um ninho de batata palha (neste caso, de batata-doce). Eis uma entradinha batida, que você encontra em qualquer restaurante deste modelo. Sem graça, sem originalidade, porém muito popular. Outro acepipe gourmetizado e muito instagramável, mas que não passa de um engodo, é o tal do niguiri de atum com foie gras e molho teriyaki. O conceito é bom: unir o atum a um elemento mais gorduroso como o fígado e mais outro item agridoce faz sentido. Mas não fica por aí: mascara-se o sabor desta combinação com o excessivo uso do maçarico (que rouba sabor e ainda deixa na boca um retrogosto de gás).

Essa é a outra perspectiva desta proposta do japonês-chique à qual faço reservas. Sob o pretexto da criatividade ou do luxo, a cozinha funciona praticamente com insumos importados. O atum é bluefin, o caranguejo é centolla, há ouriço, lagosta e pipocam nomes como ovas, trufado e maçaricado no menu.

Questiono o caminho a que nos leva este exercício acrítico de criatividade que depende em absoluto da ostentação. Se você me pergunta se come-se bem no Roji, a resposta é: certamente. Há um sunomono muito bem equilibrado na acidez, um carpaccio de polvo muitíssimo tenro, tempuras crocantes e leves e uma boa carta de pratos quentes para além dos sobas, que fogem completamente da cozinha japonesa, a exemplo do atum com purê de mandioquinha e farofa de shimeji.

Tudo bem pegar o sushi e reformulá-lo, recriá-lo, mas acredito que ainda não dominamos tão bem as técnicas milenares ou mesmo a complexidade da tradição japonesa para fazê-lo de modo brilhante. Ou seja, o Roji, por mais que apresente algum apuro técnico e recorra a bons ingredientes, escorrega na vala da abordagem contemporânea genérica, que denuncia algumas impropriedades, abusos de receituário e lugares-comuns travestidos de originalidade.

Roji
Na 408 Sul, Bloco B, Loja 7. Tel: (61) 3546-8883. De terça a quinta-feira, 11h30 às 15h e 19h às 23h. Sexta, das 11h30 às 15h e 19h à 0h. Sábado, das 11h30 à 0h. Domingo, 11h30 às 17h. Wi-fi. Ambiente interno. Desde 2019

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