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Um ano de Portuguesices. Estamos abertos para balanço

Foram 56 colunas desde o final de 2017 e, quando eu penso que não há mais o que dizer sobre Portugal, sempre surge um tema novo

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Brazil and Portugal
1 de 1 Brazil and Portugal - Foto: Istock

Um ano de coluna Portuguesices se passou sem que eu percebesse e, imperdoável, nem fiz um balanço. Foram 56 colunas desde o final de 2017 e, quando eu penso que não há mais o que dizer sobre Portugal, sempre surge um tema novo. Ao longo desse tempo de convívio, falamos de assuntos sérios e de coisas prosaicas, dei risadas (espero que vocês também) e às vezes me emocionei (e espero ter contagiado vocês com isso).

Portugal continua sendo a bola da vez e não percebi diminuição do interesse pelo país. Ouvi gente dizendo que se o Fernando Haddad (PT) vencesse a eleição, haveria uma debandada de brasileiros para Portugal. Outros diziam o inverso, que isso aconteceria com a vitória de Jair Bolsonaro (PSL). Nem uma coisa nem outra. O interesse por Portugal continua o mesmo. Até porque os fatores que movem as pessoas para buscar um novo destino não mudaram.

Um dos principais motivos para a mudança de brasileiros não é novidade: a violência urbana, que  depois de atingir as grandes capitais, começou a migrar para médias e pequenas cidades. Por mais que um governo prometa reduzir a criminalidade, nada muda a motivação de uma pessoa que tenha sofrido um sequestro relâmpago, ficado refém com uma arma na cabeça ou que tenha sido estuprada. Nenhuma promessa de um Brasil seguro fará com que essas pessoas mudem de ideia.

E eu encho a bola de Portugal mesmo! Claro que há as situações chatas, os problemas, as dificuldades, as carências, mas, passando a régua, digo com todas as letras: para mim, pelo menos, a vida em Portugal é melhor que no Brasil. E não estou falando só da liberdade de usar um smartphone na rua sem medo de ser assaltado. Falo de respeito e dignidade. Falo de coisas simples, como gentileza, calçadas limpas, respeito ao patrimônio e às tradições. Falo de valores que se perderam no Brasil não sei quando, se é que um dia houve.

No meu dia a dia, dando consultoria a brasileiros que querem se mudar para Portugal, ouço todo tipo de histórias. Desde a Marilda*, brasileira desesperada que quer vir de qualquer jeito e pergunta se eu arranjo emprego para ela, até o Afonso*, brasileiro que só sai de casa com carro blindado, e nunca passeou com a filha pequena na pracinha. Ambos prisioneiros. Ela, da miséria. Ele, da riqueza.

Por mais que se fale para a Marilda dos riscos de se mudar ilegalmente para Portugal, ela dará um jeito e virá. O Afonso vai abrir mão de seus luxos e mordomias e virá também, apostando numa vida mais simples. Não será fácil para nenhum deles. Mas se vierem de peito aberto, despidos de preconceitos e dispostos a se integrar na sociedade portuguesa, encontrarão um país generoso, onde falar a mesma língua é uma metáfora maior do que ter o mesmo idioma.

Outro dia, encontrei uma brasileira que está em Portugal há mais ou menos o mesmo tempo que eu. Falávamos sobre os laços com o Brasil, o que nos dava saudade, quando ela me disse algo que nunca havia passado pela minha cabeça. “Depois que cortamos o cordão umbilical com a nossa terra-mãe, viramos cidadãos do mundo e dificilmente vamos nos enraizar em outro lugar. Viramos bichos soltos, vira-latas capazes de se seduzir por novos destinos.”

Para mim, fez todo o sentido. Portugal é UM lugar, não é O lugar. Gosto de fado, só tomo vinho português e acompanho os jogos do Benfica. Mas não virei português por causa disso. Continuo cantarolando Titãs e Legião, encontrei uma feijoada parecida com a nossa e ainda acompanho os jogos do São Paulo

Acho que isso se chama identidade. Não aquela coisa primitiva e tacanha de achar que o Brasil é o melhor país do mundo. Mas simplesmente reconhecer que você possui um inescapável DNA, viva você na Austrália ou na Islândia, aliás dois países onde eu moraria fácil, fácil…

 

* Nomes fictícios para não expor as pessoas citadas.

**Dedico a coluna da semana ao Rafael, meu filho mais velho, quase americano, e ao João Pedro e a Valentina, meus filhos mais novos, quase portugas.

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