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“Os Oito Odiados” é caricato e divertido, mas também político como Tarantino nunca foi antes

Ambientado alguns anos após a Guerra Civil, novo filme do diretor reúne personagens hostis num mesmo armazém, entre tensões raciais e disputas pelo controle do local

atualizado

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The Weinstein Company/Divulgação
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1 de 1 The Weinstein Company/Divulgação - Foto: The Weinstein Company/Divulgação

Diretor mais adorado da sua geração – a dos anos 1990 –, Quentin Tarantino construiu boa parte da carreira se apropriando de outros produtos pop – da música, da literatura e sobretudo do próprio cinema. Desde “Bastardos Inglórios” (2009), o diretor tem levado sua estética verborrágica e ultraviolenta para um terreno bem mais arenoso: a história oficial.

O diretor volta a utilizar o western, um de seus gêneros favoritos, em favor de uma interpretação bastante original do passado da história americana. Se “Django Livre” (2012) relê o personagem do faroeste espaguete como um escravo no período pré-Guerra Civil, “Os Oito Odiados” se passa em época posterior ao conflito – com tensões raciais que ainda dividem o país.

Em seis capítulos, Tarantino narra o confronto (verbal, gestual e físico) de tipos estranhos num mesmo armazém/bar. É inverno no estado do Wyoming e todos estão a caminho da mesma cidade – Red Rock. O clima severo permite que o caçador de recompensas John Ruth (Kurt Russell) encontre Marquis Warren (Samuel L. Jackson) durante uma tempestade de gelo. Ruth carrega a prisioneira Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh) para ser enforcada no distrito.

Um western entre quatro paredes
Por mais que este seja um western gelado, com um horizonte branco a perder de vista, Tarantino situa boa parte das ações numa só locação: o tal armazém que costuma abrigar diligências. O olhar histórico se revela pela personalidade de cada personagem ali refugiado: do mexicano Bob (Demián Bichir) ao ex-general confederado Sanford (Bruce Dern); do suposto carrasco Oswaldo Mobray (Tim Roth) ao misterioso caubói Joe Gage (Michael Madsen). Chris Mannix (Walton Goggins), que se diz ser o novo xerife de Red Rock, completa a turma de odiados.

O desfile de personagens que tanto se odeiam – mas fingem cortesia – lembra o tenso encontro de gângsteres em “Cães de Aluguel” (1992), filme de estreia do diretor. Neste exercício de interpretação histórica, o encontro entre um ex-combatente confederado (Sanford) e um negro que lutava pela liberdade dos seus pares (Warren) soa ainda mais icônico que o sanguinolento assassinato de Hitler em “Bastardos Inglórios”.

Tarantino insere chistes de cunho racista – tão comuns à época e, como sabemos, infelizmente tão comuns nos dias atuais – justamente para evidenciar a rasteira e estúpida imagem imposta pelos confederados aos negros. O diretor entrega a Warren uma redenção quase tão urgente quanto aquela dada a Django, mas também desbrava outras chagas da sociedade americana – especialmente em relação a mexicanos e mulheres.

Obviamente, Tarantino não é um sociólogo. É, antes de tudo, um cinéfilo – e um cineasta cada vez mais interessado nas injustas relações de poder que marcam a história dos Estados Unidos. “Os Oito Odiados” parece equilibrar esses dois expedientes de uma maneira muito mais solene e sutil do que “Django”. É caricato e divertido como qualquer filme do diretor, mas político e elegíaco como nenhum outro exemplar assinado por ele.

Avaliação: Ótimo

Veja horários e salas de “Os Oito Odiados”.

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