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BBB aposta em causar sofrimento para alcançar audiência, diz socióloga

Silvia Viana é autora do livro Rituais de Sofrimento, que avalia os realities shows como extensão do mundo conteporâneo

atualizado

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Lucas Penteado e Karol Conká
1 de 1 Lucas Penteado e Karol Conká - Foto: Reprodução/Twitter

Apesar de parecer que está no ar há semanas, o Big Brother Brasil 21 estreou há pouco mais de 10 dias. Logo quando foram anunciados os 20 participantes escolhidos pela Globo para esta edição, o público notou a pluralidade entre o elenco. Os grupos Pipoca e Camarote contavam com pessoas de personalidades e realidades bem distintas.

Para os internautas, o “fogo no parquinho” era só uma questão de tempo. Xenofobia, transexualidade, assédio sexual e violência psicológica estão entre os temas que já levantaram polêmicas dentro da casa vigiada.

“Se não tem a briga, não acontece o reality show. As discussões não estão apenas ligadas a feminismo ou racismo, por exemplo, os critérios se alteram e eles usam pessoas que são ligadas os assuntos que estão na ‘moda’. Não é manipulação, é uma estratégia de marketing”, explica a socióloga Silvia Viana em entrevista ao Metrópoles.

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Lumena em discussão com Juliette

Silvia é autora do livro Rituais de Sofrimento, publicado pela editora Boitempo, que traz uma análise de como a estrutura de realities shows, como o Big Brother, reproduzem uma competitividade que existe do lado de fora também.

“O que menos importa é o critério, a briga vai acontecer. Não estamos vendo pessoas perversas ou exibicionistas, o que vemos na tela é a mesma coisa que acontece do lado de cá: uma competição que visa uma sobrevivência fantasmagórica, é o que todo mundo faz todos os dias. O programa estimula que só tem uma vaga para o vencedor e as pessoas são induzidas a agirem como agem”, ressalta.

Rituais de sofrimento

Em sua obra, Silvia explica que os realities utilizam de um ritual de sofrimento para conseguir atingir o sucesso. Nessa estratégia, os participantes muitas vezes são colocados em situações vexatórias, como nas provas de resistência onde são comprimidos em veículos ou não podem ir ao banheiro por horas a fio, ou quando usam roupas desconfortáveis durante a punição do Monstro.

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Arthur e Arcrebiano cumprem o Castigo do Monstro

“Não é um jogo de quem ganha. É um jogo de eliminação. Esse saber generalizado, no entanto, não impede que uns se submetam e outros castiguem, nem que aqueles que se submetem também castiguem. Pelo contrário, a participação é a pedra fundamental do espetáculo. O programa conquista o engajamento ativo, frequentemente maníaco, nessa engrenagem de fazer sofrer”, considera Silvia, que atualmente é professora de sociologia da Fundação Getúlio Vargas.

No livro, a autora compara a realidade dos participantes dentro da casa ao ambiente de trabalho que as pessoas vivem do lado de fora. Para Silvia, a estrutura do programa, assim como no capitalismo contemporâneo, faz com que os indivíduos entrem em uma guerra e se digladiem para sobreviver.

“Ambos os cenários têm dois eixos principais: a eliminação e a concorrência entre os participantes, que vira uma guerra. Existe sempre a sensação de que estão com a corda no pescoço, a ponto de serem eliminados”, aponta.

Mecanismos do programa

Silvia explica que, com o intuito de tornar o ambiente ainda mais hostil, o programa se utiliza de mecanismos capazes de deixar o clima muito acirrado entre os participantes. Como quando são realizadas as provas de liderança ou anjo, o jogo da discórdia, o veto à prova do líder e até mesmo o paredão de todos os domingos.

Essas avaliações permanentes, como o Queridômetro, que é quando um participante avalia o outro usando emojis para se expressar, são fundamentais para criar o desalinho entre os brothers.

“Assim como no trabalho, quando a gestão da empresa começa a avaliar se você é uma pessoa proativa, por não saber qual é o critério da avaliação que recebeu, você fica cada vez mais paranoico tentando entender o que foi avaliado. E, então, você entra no jogo”, exemplifica Silvia.

Participantes reunidos na sala para o Jogo da Discordia
Participantes reunidos na sala para o Jogo da Discordia

Quando Kerline, a primeira eliminada do jogo, recebeu uma cobra no Queridômetro e não sabia quem havia a avaliado de tal forma, a ex-sister perdeu a paz. Passou o dia inquieta e chegou até mesmo a indagar alguns colegas quem teria feito a avaliação.

No fim, Fiuk foi quem atribuiu o emoji “ruim”, por ter ficado desconfortável com uma brincadeira feita por ela em outro momento.

Concorrência que vira guerra

Uma das frases mais ditas pelos brothers é: “O Brasil está vendo”. Apesar de entrarem no reality sabendo que é um jogo, e alguns até assumirem ser fãs de carteirinha das edições anteriores, em algum momento a personalidade real de cada um vem à tona.

“A concorrência vira guerra. As estratégias fazem as pessoas agirem como se não ligassem para o sofrimento dos outros. Então, além da eliminação, o programa usa mecanismos que levam os participantes a agirem como se fossem grandes carrascos uns dos outros”, destaca.

É o caso da briga entre Karol Conká e Lucas Penteado. O conflito entre os dois se estende há dias e as opiniões e o comportamento da cantora parecem afetar diretamente a saúde mental do companheiro de reality.

Na internet, Karol recebeu duras críticas e chegou a ser acusada pelos internautas de violência psicológica. Como quando fez com que Lucas se retirasse da mesa enquanto ela almoçava. “Não quero que você fale enquanto estou na mesa comendo”, disparou a cantora.

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