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ANTT abre procedimento para investigar denúncias contra a Transbrasil

Reportagem do Metrópoles revelou como empresa de ônibus funciona, amparada em liminares da Justiça, colocando a vida de passageiros em risco

atualizado

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Michael Melo/Metrópoles
antt transporte irregular
1 de 1 antt transporte irregular - Foto: Michael Melo/Metrópoles

A empresa Transporte Coletivo Brasil (TCB), conhecida como Transbrasil, será alvo de investigação da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). A companhia, que tem um histórico ostensivo de falcatruas, coleciona acidentes e denúncias gravíssimas de práticas criminosas. A ação da autarquia ocorre três semanas após o Metrópoles publicar o especial Transbrasil, um embarque para o crime nas rodovias brasileiras.

A reportagem foi produzida ao longo de três meses de apuração e mais de 10 mil quilômetros percorridos para revelar como funciona o esquema, que inclui a venda de cópias de liminares pela Transbrasil. A empresa coloca nas estradas ônibus sem condições de rodar e põe em risco a vida de milhares de pessoas. Hoje, a companhia só mantém autorização para funcionar por força de determinação judicial.

De acordo com a ANTT, serão levantados dados e coletadas informações das equipes de fiscalização. “Após essas análises, oportunamente, a agência informará quais providências serão adotadas”, informou a autarquia, por meio de nota.

Se as irregularidades forem comprovadas pelo órgão, a empresa pode ser cancelada administrativamente e perder o Termo de Autorização de Serviço Regular (TAR), documento que permite aos ônibus circularem nas rodovias brasileiras.

Kit liminar
Amparada por liminares concedidas pela Justiça, a Transbrasil percorre o Brasil afora desde 2009, por meio de nove linhas que cruzam o país de Foz do Iguaçu (PR) a São Luís (MA). As medidas provisórias abriram caminhos para a transportadora multiplicar sua rentabilidade sustentada no crime.

 

O esquema sinuoso é movido pela venda de cópias de autorizações a partir de R$ 1,2 mil. O chamado “kit liminar” permite veículos que não sejam da empresa percorrerem trajetos de longas distâncias, camuflados na figura de arrendatários.

Muitas vezes, ônibus em más condições, conduzidos por motoristas sem habilitação e expostos a jornadas excessivas ao volante, são colocados nas estradas. No embarque, não pedem sequer a identificação dos passageiros. Passe livre para o transporte de armas, drogas, menores desacompanhados e fugitivos da lei. Os usuários são atraídos pelas passagens até 50% mais baratas.

A reportagem contou, por exemplo, a história da família de Jardeli Miranda Nascimento, 24 anos. No dia 11 de outubro de 2016, ele, a mulher e a filha, de apenas três anos, ficaram feridos em um grave acidente na BR-226, durante viagem entre o Maranhão e o Distrito Federal, em um ônibus da Transbrasil. “Quando o ônibus parou de capotar, fiquei chamando pelo meu marido. Estava encharcada de sangue”, recorda Ana Amélia, 23.

O casal até hoje não se recuperou. A mulher ficou com o braço dilacerado e marcas que a seguirão por toda a vida. O homem ainda tenta recuperar o movimento das mãos.

Daniel Ferreira/Metrópoles
Ana Amélia, o marido e a filha estavam em um ônibus da empresa. Ela ficou gravemente ferida

 

Ao Metrópoles, o gerente de Fiscalização da ANTT, João Paulo de Souza, afirmou que está em curso uma operação para levantar provas de que a transportadora, assim como outras empresas que operam no mesmo esquema, burla os termos da autorização dada pela Justiça.

Para manter essa organização criminosa, estão envolvidos milicianos, pessoas ligadas ao tráfico de drogas, armas e agentes públicos. Tenho convicção de que, em breve, teremos desdobramentos sensíveis decorrentes dessa investigação.

João Paulo de Souza, gerente de Fiscalização da ANTT

O outro lado
Ao ser questionado sobre a cobrança do “kit liminar”, o dono da Transbrasil, Irandir Oliveira de Souza, explicou que ocorre o contrário: “Pagamos mensalmente pelo aluguel do veículo, pelo arrendamento. Isso é legal. O dono do ônibus não paga nada. Ele tem que receber. Onde alguém vai trabalhar e, em vez de receber, paga?”

Reconheceu que sempre recorreu à Justiça para conseguir autorizações, uma vez que, segundo sustenta, não teria aceitado participar de um suposto “balcão de negócios” gerido pela ANTT: “Se a empresa estivesse pagando (propina), as nossas linhas estavam certinhas há muitos anos. Como não dispomos de recursos financeiros, sofremos essa perseguição. Tanto da agência quanto das grandes empresas.”

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