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Crime da 113: após 10 horas de julgamento, só uma testemunha é ouvida

No primeiro dia do Júri de Adriana Villela, apenas a delegada Mabel de Faria foi interrogada por defesa e acusação

atualizado

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Igo Estrela/Metrópoles
Crime 113 sul
1 de 1 Crime 113 sul - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

O primeiro dia do julgamento de Adriana Villela durou mais de 10 horas e somente uma testemunha foi ouvida: a delegada aposentada Mabel de Faria. Ela chefiava a Coordenação de Crimes Contra a Vida (Corvida) na época do crime e entende que a arquiteta é mandante do triplo homicídio ocorrido no Bloco C da 113 Sul em 28 de agosto de 2009.

Outras três testemunhas estavam listadas para serem interrogadas nesta segunda-feira (23/09/2019), mas o presidente do Tribunal do Júri de Brasília, Paulo Rogério Santos Giordano, decidiu encerrar a sessão às 21h28. Com isso, defesa e acusação vão optar se ouvirão ou não o policial civil Felipe Maia Ximenes; a filha de um dos condenados pelo crime, Michele da Conceição Alves; e o delegado da Polícia Civil de Minas Gerais Renato Nunes Henriques.

Durante a longa explanação de Mabel, houve momentos em que os promotores do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e os advogados de Adriana subiram o tom e bateram boca.

Já passava das 20h quando um dos defensores de Adriana, Marcelo Turbay, lia depoimento do ex-delegado da Corvida Julião Ribeiro, no momento em que o promotor Marcelo Leite o interrompeu e provocou: “Vamos ser honestos?”.

Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, outro advogado de Adriana, então, pegou o microfone e disse que “nunca o viu ser honesto”. “Perguntei sobre o primeiro depoimento do Julião. Não estou entendendo o chilique do doutor Marcelo”, emendou Turbay.

A defesa sustenta que Adriana esteve durante a tarde do dia do triplo homicídio na Cultura Hispânica, em contraponto a depoimento de que ela teria passado de carro para entregar dinheiro aos condenados pelo crime. “Não tem como ela ter passado às 16h na W3 para entregar um dinheiro e estar naquele horário do crime, das 19h às 20h, porque temos comprovação através de ERBs [sistema de telefonia], testemunhas e de coisas que Adriana comprovou que ela estava em outro local”, afirmou Kakay.

“Vai para o inferno”

A Corvida ficou responsável por auxiliar nas diligências do triplo homicídio. Para ela, não há dúvidas de que a arquiteta mandou matar os pais, o ministro aposentado do Tribunal Superior Eleitoral, José Guilherme Villela e a esposa dele, a advogada Maria Viella. A empregada da casa, Francisca Nascimento, também foi assassinada.

Mabel, inclusive, reproduziu detalhes de um suposto diálogo que Adriana teria travado com o pai antes de ordenar a execução. “Nesse diálogo, José Guilherme fala: ‘Minha filha, você nisso’? E ela disse: ‘Eu te odeio! Vai para o inferno, seu velho’”.

Segundo sustentam a Corvida e o MPDFT, a arquiteta contratou o ex-porteiro do Bloco C da 113 Sul Leonardo Campos Alves para cometer a barbárie. Ele, por sua vez, teria pedido auxílio a outros dois comparsas: Francisco Mairlon Barros Aguiar e Paulo Cardoso Santana. Os três foram condenados e estão presos.

Provocada por Miranda, a ex-chefe da Corvida informou que Adriana recebia mesada de R$ 8,5 mil dos pais, morava em uma casa no Lago Sul dada pelos ascendentes e que eram eles que apoiavam os “projetos” dela. Mabel lembrou que a acusada era dona de um apartamento na Asa Sul, no qual teria quebrado vários objetos por não ter ficado satisfeita com uma reforma.

Tortura

Conforme narrou Mabel perante os sete jurados, o ex-porteiro Leonardo Campos Alves – acusado de ter recebido dinheiro de Adriana para matar os pais dela – foi torturado por agentes da 8ª  Delegacia de Polícia (SIA), na época comandada pela delegada Déborah Menezes.

Segundo a versão de Mabel e do MPDFT, a equipe de Déborah atravessou as investigações, viajou a Montalvânia (MG), onde morava Leonardo, e obteve a confissão dele mediante tortura. Embora a Corvida e o MPDFT sustentem a tese de que Leonardo é, de fato, um dos três executores da barbárie, entendem que os meios empregados pelos investigadores da 8ª DP foram, sim, cruéis.

“Tem laudo [confirmando] que realmente Leonardo foi torturado pela 8ª DP. Colocaram saco na cabeça dele e deram um tiro perto da cabeça”, diz Mabel.

Defesa rebate

Após oito horas respondendo questionamentos do MPDFT, Mabel de Faria começou a ser interrogada pelos advogados de defesa de Adriana Villela. O criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, disse que sua cliente tem álibi para provar que não estava na cena do crime no momento do triplo homicídio e ironizou as testemunhas de acusação apresentadas pela promotoria.

“Ela [Mabel] ousa dizer que a Adriana tinha dificuldades com o pai e com a mãe. Quem ela traz como testemunha? O pintor que trabalhava na casa e duas pessoas da família da Francisca, de ouvir dizer. Temos várias testemunhas que vão dizer o tanto que Adriana e a mãe se gostavam e viviam bem”, disse.

 

Julgamento histórico

Adriana Villela chegou por volta das 9h ao Tribunal do Júri. De vestido preto, cabelos curtos e óculos escuros, foi recebida por um grupo de amigos. Alguns choraram. Ela também se emocionou.

O grupo disse estar confiante de que “vai dar tudo certo” e acreditar na inocência de Adriana. De acordo com eles, são mais de 250 amigos em vários estados do país que chegaram, inclusive, a criar uma página na internet. Kakay falou com a imprensa na entrada do Tribunal do Júri. “Penso que a Adriana já morreu algumas vezes nesse processo com a dor da perda dos pais. Uma acusação sem nenhuma técnica. Espero que hoje seja o começo do fim dessa tragédia e que a Adriana saia absolvida do Tribunal”, assinalou.

De acordo com o criminalista, a defesa conseguiu provar, por meio de trabalho técnico, que Adriana não estava na casa dos pais no dia do crime, ocorrido há 10 anos.”Temos uma linha do tempo que foi aceita em boa parte pelo TJDFT (Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios) e STJ, que é irrefutável”, acrescentou.

O Tribunal do Júri deve ouvir 44 testemunhas: 17 de acusação e 27 de defesa. Adriana deve ser ouvida na quarta (25/09/2019) ou quinta-feira (26/09/2019). O irmão da Adriana, Augusto, e a filha dela também estiveram no tribunal. Entre os 25 jurados, sete foram escolhidos nesta segunda: quatro mulheres e três homens.

Antes das 7h, Adriana usou as redes sociais e falou sobre o julgamento. “Começa daqui a pouco. Nossa oportunidade de esclarecer quem sou eu e minha família: uma família amada“, disse.

Na mesma página no Facebook, Adriana Villela postou um vídeo com o depoimento do seu irmão, Augusto. Ele diz: “A minha irmã tem um comportamento difícil, mas não chega a ser violenta, agressiva. Convivo muito com ela. Nunca a vi agredir ninguém. Tá correndo risco de ser condenada por um crime que ela não cometeu”, destacou.

Guerra de versões

Na semana que precedeu a sessão, a defesa de Adriana Villela tentou suspendê-la, por entender que o Laudo nº 15.000, que coloca a arquiteta na cena do crime, não teria valor. Na visão dos defensores, papiloscopistas não têm competência para assinar um exame de tal envergadura.

Baseado nisso, os criminalistas Antônio de Almeida Castro, o Kakay, e Marcelo Turbay pediram que o julgamento ocorresse somente após realização de novo laudo papiloscópico.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso acatou o pedido parcialmente e determinou ao juiz que, no momento da sessão, esclarecesse ao júri sobre o questionamento do laudo.

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A defesa recorreu e pediu novamente a suspensão. Na última quarta-feira (18/09/2019), o ministro Gilmar Mendes foi sorteado para relatar o caso. Ele rejeitou os HCs dos advogados na sexta-feira (20/09/2019) e manteve o julgamento para esta segunda-feira (23/09/2019).

O MPDFT discorda de Kakay e Turbay e defende a validade do laudo. Para o promotor Maurício Miranda, que atuará no Júri ao lado do colega Marcelo Leite, o trabalho feito pelos papiloscopistas é de alta qualidade. “São pesquisadores, doutores, verdadeiros cientistas. As informações que eles coletaram foram publicadas em revistas internacionais de ciência forense”, ressaltou Maurício.

Arte/Metrópoles

Miranda detalhou o trabalho técnico executado pelos especialistas. “Diversos casos foram resolvidos com base na datação das digitais. Neste caso, o que permitiu chegar àquelas conclusões é que cientistas viram as diferenças morfométricas, usando a digital da própria Adriana, no mesmo ambiente”, afirmou.

Jurados

Todas as alegações apresentadas são ouvidas pelos sete jurados escolhidos. Após sorteio, eles começaram a escutar os argumentos e a fazer as análises. O grupo ficará incomunicável até o término da sessão, não podendo falar com outras pessoas nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do conselho.

 

Ou seja, como a análise do caso de Adriana Villela vai se estender por mais de um dia, eles não poderão retornar para suas casas. Vão pernoitar nas dependências do tribunal, sob acompanhamento constante.

Quando o conselho de sentença se forma, os jurados recebem cópia das principais peças do processo e passam a acompanhar toda a sessão. No fim, eles vão responder as perguntas que o juiz presidente fizer. Serão questionados se o delito realmente ocorreu (materialidade), se a acusada cometeu o delito do qual está sendo acusada (autoria), e se ela deve ser absolvida. Também definirão questões relativas a causas de diminuição de pena, atenuantes e possíveis aumentos de qualificadoras.

Diante das respostas, o juiz anunciará o resultado pela absolvição ou condenação de Adriana Villela e, posteriormente, fará a dosimetria da pena, ou seja, calculará a quantos anos a ré será condenada.

Veja a dinâmica do crime da 113 Sul:

Yanka Romão/Metrópoles

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