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Ao transferir Luiz Estevão, juíza questiona condução da Operação Bastilha

Segundo titular da Vara de Execuções Penais (VEP), buscas e apreensões teriam ocorrido de forma diferente da que foi acordada com a Justiça

atualizado

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RAFAELA FELICCIANO/METRÓPOLES
Rafaela Felicciano/Metrópoles
1 de 1 Rafaela Felicciano/Metrópoles - Foto: RAFAELA FELICCIANO/METRÓPOLES

Ao proferir decisão de transferir, nesta quinta-feira (19/7), o ex-senador Luiz Estevão, o ex-ministro Geddel Vieira e o ex-deputado federal Márcio Junqueira para o Pavilhão de Segurança Máxima da Papuda, a juíza Leila Cury, titular da Vara de Execuções Penais (VEP), questionou a forma como a Operação Bastilha foi conduzida pela Polícia Civil do Distrito Federal.

Conforme registrou a magistrada na decisão, as buscas e apreensões realizadas no dia 17 de junho, no Complexo Penitenciário da Papuda, teriam ocorrido de forma diferente da que foi acordada com a Justiça no momento em que foram autorizados os mandados.

Segundo ela, “as tratativas não aconteceram na inteireza, na medida em que, somente na antevéspera do efetivo cumprimento, ou seja, em 15 de junho, quase dois meses depois da primeira expedição, já com os mandados renovados, os senhores delegados compareceram nesta VEP para informar que os cumpririam, sem explicitar, contudo, a data ou a logística que empregariam em seu cumprimento, tal como veio a ser efetivamente executado”.

Somente a partir do compartilhamento [em 6 de julho] tive acesso efetivo a todas as informações

Trecho da decisão da juíza Leila Cury

A juíza escreveu que as declarações dos delegados da Coordenação Especial de Combate a Corrupção, ao Crime Organizado, aos Crimes Contra a Administração Pública e aos Crimes Contra a Ordem Tributária (Cecor), afirmando ser Luiz Estevão o “dono da Papuda”, “não podem ser acolhidas como expressão da verdade”.

“O fato de não ter acontecido dentro do CDP nenhum motim, rebelião, ou insurgência de grande proporção contra o cumprimento de ordens, pelos presos, desde a prisão de Luiz Estevão, ou por ele próprio, revela que ele não é ‘o novo primeiro comando da capital’. E tanto é assim que Luiz Estevão, quando contrariado em suas pretensões, precisa interpor recurso judicial, como se constata a partir de simples consulta ao seu processo de execução em curso neste Juízo”, destacou a magistrada.

Ainda de acordo com a titular da Vara de Execuções Penais, houve “grande divulgação” à imprensa após a deflagração da operação, embora o processo esteja tramitando em segredo de Justiça.

Denúncia
Ao determinar a transferência, Leila Cury fez um memorando sobre os fatos desencadeadores da Operação Bastilha. Consignou em sua decisão que tudo começou em 2016, quando ela recebeu denúncia anônima contendo informações sobre supostos privilégios a Luiz Estevão. Na época, a magistrada determinou abertura de procedimento e pediu ao Ministério Público, à Polícia Civil e à Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe) a adoção de providências.

Um mês depois, em janeiro de 2017, a Sesipe realizou busca na Ala B do Bloco 5, onde Luiz Estevão estava alojado, ocasião em que apreendeu dentro da cela dele itens como uma máquina de café, cápsulas de café, salmão defumado, massa importada e chocolate importado. Luiz Estevão foi acusado de desacatar o coordenador da subsecretaria e cumpriu castigo de 10 dias em isolamento preventivo.

Posteriormente, o inquérito instaurado naquela ocasião foi arquivado, sob argumento de que a falta disciplinar não teria se configurado, “pois [nem] sequer teria havido registro do desacato imputado a Luiz Estevão e os itens apreendidos teriam adentrado a cela dele com permissão dos agentes da direção da unidade prisional, o que, embora pudesse vir a caracterizar crime, não geraria falta disciplinar”.

Já o inquérito policial instaurado em 2017 para investigar as denúncias resultou no indiciamento do ex-senador pelo crime de corrupção passiva. Até o momento, entretanto, o Ministério Público não o denunciou. “Evidentemente, o Ministério Público não é desidioso e não deixou de agir em momento algum. É que o crime de corrupção dificilmente deixa rastros óbvios”, avaliou a magistrada.

Operação Bastilha
Este ano, outro inquérito foi instaurado pela Cecor, após denúncias de que integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) presos na Papuda planejavam executar magistrados do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), delegados, agentes de atividades penitenciárias e diretores do sistema prisional.

No decorrer dessa diligência, uma testemunha disse, ao final de seu depoimento à polícia, ter ouvido comentários de “que o ex-senador possuía diversas regalias na cadeia, como telefone, geladeira, fogão e enorme quantidade de dinheiro”.

Durante a batida, com efetivo de 35 policiais civis, agentes e delegados recolheram cinco pendrives, documentos, uma tesourinha, uma barra de chocolate e cereais. Depois da ação, a existência do esquema para execução de autoridades foi descartada pelos investigadores.

“Pelo que restou até então apurado pelos policiais da Cecor, o afastamento do diretor e respectivo adjunto e de outros servidores que atuavam junto ao CDP, em janeiro de 2017, por ocasião da localização dos primeiros objetos aptos a revelar indícios de prática de corrupção atribuída a Luiz Estevão, parece não ter sido suficiente”, revelou Leila Cury.

Diante dos fatos, a juíza determinou a transferência dos três presos. De acordo com ela, a mudança vai “possibilitar maior atenção às suas necessidades, em ambiente onde serão mais bem monitorados, inclusive por unidade de saúde localizada nas dependências do próprio Bloco F da PDF1, mas sem tornar obsoletas vagas que podem vir a ser ocupadas por outros internos em sistema superlotado”.

Leila Cury reconhece, em sua decisão, que os três internos devem ser mantidos separados em razão dos cargos já ocupados no Executivo e Legislativo e devido à diferença de poder aquisitivo com o restante da massa carcerária. Por isso, estavam em celas com capacidade para um número maior de internos, sobrecarregando o sistema, segundo ressaltou a juíza.

O outro lado
O advogado de Luiz Estevão, Marcelo Bessa, considerou a transferência absurda, para uma cela degradante, imposta a presos do regime disciplinar diferenciado, o que não é o caso de seu cliente. No Pavilhão de Segurança Máxima, as celas são individuais e têm tamanho de seis metros quadrados.

A defesa de Márcio Junqueira disse que piorar as condições da prisão atende ao objetivo de fragilizar o ex-deputado na busca de uma delação premiada. Para os advogados de Geddel Vieira, a transferência não se justifica porque o ex-ministro não teve regalias na prisão.

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