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“Ninguém aqui tem medo de juiz”, diz presidente da OAB-DF, Délio Lins e Silva Júnior

Em balanço, Délio fala sobre defesa das prerrogativas, dificuldades provocadas pela pandemia, inadimplência e desenvolvimento tecnológico

atualizado

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Rafaela Felicciano/Metrópoles
Presidente da OAB-DF, Délio Lins e Silva Júnior
1 de 1 Presidente da OAB-DF, Délio Lins e Silva Júnior - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Em um balanço no fim do 2º dos três anos de mandato, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Distrito Federal (OAB-DF), Délio Lins e Silva Júnior, falou a respeito da defesa do pleno exercício da profissão: “Temos feito essa linha de atuação mais efetiva em relação às prerrogativas. Ninguém aqui tem medo de juiz”.

A OAB-DF intensificou, neste ano, as ações para garantia das prerrogativas, que são os direitos dos advogados para a livre atuação profissional. Em novembro, o órgão acionou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra uma desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) sob argumento de que ela passou a “negar atendimento a advogadas e advogados” em razão da pandemia. A Seccional do DF também atuou no caso em que um advogado foi preso por desacato dentro de uma delegacia, em Planaltina, no mês de setembro.

“Independência é poder ir para o CNJ contra um juiz que faz besteira, ir para o CNMP [Conselho Nacional do Ministério Público] contra procurador que faz besteira, entrar com ações civis públicas em relação a temas variados referentes ao Executivo”, afirmou. “Me elegi para ser presidente da OAB e acho que o básico que o ocupante do cargo tem que fazer é agir de forma independente e sem medo, mas sempre com respeito institucional.”

O presidente da OAB-DF ainda comentou outros temas, como a inadimplência de aproximadamente 50%, as dificuldades do mercado da advocacia na capital federal com muitos profissionais, as eleições de 2021 e a aceleração do desenvolvimento tecnológico nos serviços do órgão.

Em julho deste ano, a OAB-DF demitiu 20% do quadro de funcionários. Segundo Délio, essa foi a situação mais crítica do mandato, que acaba em 2021: “Foi o dia mais triste da minha gestão. São 40 famílias que perderam a renda. Não demito ninguém no meu escritório, mas no meu escritório o dinheiro é meu, posso fazer empréstimo e me virar para não demitir”.

Sobre a cota racial e a paridade de gênero nas eleições internas, aprovadas pelo Conselho Federal da OAB nesta segunda-feira (14/12), Délio afirmou que já são bandeiras da Seccional do DF. “Aqui, no conselho, temos por volta de 20% de pretos e pardos e 50% de mulheres”, assinalou.

Questionado se será candidato à reeleição no próximo ano, o presidente da OAB-DF não cravou um posicionamento: “Não estou nem pensando nisso”.

Confira a entrevista com o presidente da OAB-DF, Délio Lins e Silva Júnior:

Qual o impacto da pandemia do novo coronavírus na advocacia do DF?

Por questões óbvias, a dificuldade para a advocacia tem sido imensa, assim como para outros ramos. Nós já temos uma dificuldade natural: o Distrito Federal, hoje, é a unidade da Federação com mais advogados per capita do país. É uma média de 4 mil novos advogados por ano, o que reflete, obviamente, em um mercado muito concorrido. A pandemia mostrou, agora, de uma forma muito mais explícita, esses problemas. Escritórios grandes são enxugados e escritórios pequenos, fechados. Os tribunais, desde março, estão fechados, e até agora não voltou o serviço presencial completamente.

Qual avaliação o senhor faz da atuação da OAB-DF neste ano marcado pela crise sanitária?

No dia seguinte ao 1º decreto de restrição [de março de 2020], nos reunimos, na Diretoria, e discutimos o que iríamos fazer. Tomamos as providências: home office, adoção dos cuidados, fechamento, e mandamos voltar para casa, urgentemente, aqueles funcionários do grupo de risco. Decidimos acelerar todo o desenvolvimento tecnológico que a gente já estava trabalhando desde meados do ano passado. A OAB-DF, quando eu entrei, não tinha portal de serviços, aplicativo, portal da transparência ou reuniões das comissões, do Pleno e dos cursos sendo feitas de forma remota. Aceleramos a criação de tudo isso no projeto chamado OAB Digital. Para ter acesso a todos os serviços da OAB hoje, se o advogado não quiser vir à sede, faz pela internet. O Processo Judicial Eletrônico (PJe) é a grande reclamação dos advogados. Criamos uma central de atendimento de PJe. A gente está lançando o programa chamado Cava, que é a Central de Atendimento Virtual da Advocacia. Os sistemas de todos os tribunais estão dentro desse portal que a gente criou, com autoatendimento para o advogado. Aqueles que tiverem dificuldade vão poder ser atendidos por chat, WhatsApp ou e-mail. A central que hoje é parte desse projeto atende mais ou menos 200 advogados por dia. Nossa ideia é duplicar ou triplicar isso. Quando o sistema carcerário fechou – e aqui no DF foi o último a fechar –, a gente acelerou a criação do Parlatório Virtual, no qual o advogado pode falar virtualmente com o cliente preso. Isso garantiu que a gente continuasse exercendo a advocacia. O saldo do ano foi extremamente positivo, porque executamos ações que a gente já preparava fazer, ou já estavam em andamento, e a pandemia mostrou que estávamos no caminho certo. Trazer a OAB-DF para o século 21 foi um grande avanço.

Como ficou o atendimento dos advogados nos tribunais?

Com os tribunais todos fechados, a briga pelas prerrogativas teve um aumento absurdo. Nós estávamos com muita dificuldade para sermos atendidos pelos magistrados e fizemos um mapeamento. Descobrimos que cerca de 36% da magistratura não estava atendendo a advocacia. Aí, a gente foi para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), corregedorias, presidências dos tribunais e conseguimos que eles desenvolvessem sistemas de agendamento com advogados. Estamos fazendo uma segunda leva desse mapeamento. Hoje, sei de todos os juízes e desembargadores que recebem ou não advogados durante a pandemia, para tomar as devidas providências.

Délio Lins e Silva Jr.
Délio Lins e Silva Júnior foi eleito, em 2018, para presidir a OAB-DF entre 2019 e 2021

Os advogados precisaram de auxílio financeiro?

As dificuldades dos escritórios, que fecharam ou enxugaram as equipes, ficaram refletidas de forma evidente depois dos primeiros meses da pandemia. Percebemos que não tinha perspectiva de melhora e começamos a trabalhar com a possibilidade de beneficiar o bolso do advogado. A gente prorrogou o pagamento de duas parcelas da anuidade; lançamos, com a Caixa de Assistência, benefícios específicos para advogados que estavam necessitados por estarem sem renda; abrimos clínica médica exclusiva para atendimento de advogados; e criamos plano de saúde. O projeto Anuidade Zero dá possibilidade para o advogado se cadastrar e converter, em desconto na anuidade, gastos que tem em estabelecimentos credenciados. Dependendo da pontuação que fizer, pode não pagar anuidade, pagar menos ou até usar os créditos no outro ano. Quando assumimos, transformamos a nossa anuidade, dos primeiros cinco anos de inscrição, na mais barata do Brasil. A anuidade cheia é a 2ª mais barata. Sempre tivemos preocupação de permitir que o advogado não pague anuidade usando benefícios.

Isenção da anuidade era uma possibilidade?

Obviamente, precisamos arrecadar, pois temos funcionários para pagar e 55 salas de apoio ao advogado espalhadas pelo DF para manter. Gostaria muito de ter isentado todo mundo de pagar anuidade neste ano, mas não posso, por responsabilidade fiscal e legal. No entanto, tentamos criar essas alternativas. Conseguimos linhas de crédito com várias instituições financeiras diferenciadas para a advocacia e implementamos o pagamento das anuidades por cartão de crédito. A preocupação é alinhar melhores serviços com necessidade menor de desembolso direto do advogado para pagar anuidades. Essas duas linhas de atuação talvez tenham sido as mais evidentes neste período de pandemia.

Quanto foi efetivamente repassado aos advogados e quantos deles foram beneficiados?

Foi disponibilizado algo em torno de R$ 700 mil. Olha, para você ver a dificuldade que estava passando a advocacia: o Eduardo [Eduardo Uchoa Athayde, presidente da Caixa de Assistência] veio com proposta de doar cestas básicas para advogados. No 1º momento, pensei: “Será que vai pegar mal isso?”, mas decidimos fazer. Disponibilizamos mil cestas, cujo valor de cada uma era entre R$ 150 e R$ 200. Em dois dias, fizemos um esquema de agendamento, para não haver fila ou expor o advogado. Em dois dias, os agendamentos se esgotaram e quase todo mundo foi. Umas cento e poucas cestas sobraram, a gente reagendou e entregou. Isso mostra a necessidade que as pessoas estavam passando. Talvez os jovens são os que mais sofrem isso e eles são muitos. Temos alguns projetos voltados a criar espaço no mercado também. O Carreiras OAB-DF tem parte acadêmica, com cursos da Escola Superior de Advocacia (ESA), e a mentoria, depois, é feita em escritórios cadastrados que se disponibilizam a dar esse estágio ao advogado. Quando chegou a pandemia, estava na hora da fase de mentoria, nós seguramos e, agora, de um mês para cá, esses 100 colegas da 1ª turma começaram a entrar nos escritórios. Eu até coloquei uma advogada no meu. Começaram a chegar notícias aqui de contratações após a experiência. É uma outra forma de dar esse auxílio.

As cestas básicas foram pagas com recursos da OAB-DF?

Da Caixa de Assistência, que é o braço assistencial da OAB.

Recentemente, o Conselho Federal da OAB aprovou a cota racial e paridade de gênero nas eleições internas. Qual o impacto na Seccional do DF?

Uma coisa que eu me orgulho muito – e isso não é só deste ano – é nós termos aqui uma verdadeira inclusão e uma OAB-DF verdadeiramente plural. A votação no Conselho Federal é histórica, mas, na OAB/DF, já praticamos. Fiz questão de montar uma chapa paritária. Aqui, no conselho, temos por volta de 20% de pretos e pardos e 50% de mulheres. Fico muito feliz de que as bandeiras antigas e já implementadas pela OAB-DF foram aprovadas nacionalmente. Deixo todas as bandeiras políticas de fora. Queremos ser democráticos e a primeira atitude é respeitar os pontos de vista diversos, concorde ou não. A OAB-DF tem que ser uma Casa com as portas abertas para a sociedade civil, além da advocacia. Temos o papel de cuidar da sociedade, que é tão importante quanto tomar conta da advocacia. São 92 comissões aqui dentro de todos os temas que se possa imaginar, tanto as mais técnicas responsáveis por aspectos jurídicos, quanto as que me dão mais orgulho de existirem: as voltadas à defesa da sociedade, como Comissão de Igualdade Racial, de Direitos Humanos e de Mobilidade Urbana.

Algumas dessas comissões foram criadas nesta gestão?

Tem duas comissões que muito me orgulho de ter tornado permanentes: de Igualdade Racial e da Mulher Advogada. São dois colegiados que sempre existiram, mas nunca tiveram permanência garantida, porque a cada três anos as comissões são extintas e as novas gestões recriam ou criam novas. Mas, a partir da próxima gestão, as comissões de Igualdade Racial e da Mulher Advogada não vão poder ser extintas.

Em julho, a OAB-DF demitiu 20% dos funcionários e alegou uma perda de R$ 10 milhões. Como está o caixa hoje?

Acabei de narrar uma série de medidas que trazem a OAB-DF para a modernidade. Isso também cria uma necessidade de determinadas mudanças. Por exemplo: ao colocar vigilância remota de subseções, tem 10 porteiros dos quais não preciso mais. Fizemos uma consultoria aqui, logo no início do meu mandato, mostrando os setores que estavam mais necessitados, inchados e a possibilidade de readequação. A gente estava trabalhando isso aos poucos, mas aí veio a pandemia e a inadimplência chegou a quase 70%. A situação melhorou um pouco, mas a inadimplência continua sendo de aproximadamente 50%, salvo engano. São números enormes. Para se ter uma ideia, quando nós assumimos, a inadimplência era de aproximadamente 30%, fizemos trabalho de recuperação fiscal, o Refis da OAB, que baixou para cerca de 20% no ano passado. Temos verbas suficientes para chegar no fim do ano que não teríamos caso não tivéssemos implementado as demissões. Vamos ter uma redução de aproximadamente R$ 400 mil de gasto com folha salarial no fim de 2020. A expectativa é de que economizemos, no ano que vem, algo em torno de R$ 1,5 milhão a R$ 2 milhões. O Provimento Nº 185 do Conselho Federal impõe a todas as seccionais algumas responsabilidades fiscais – é a adequação da OAB à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A gente não atendia a esse provimento, porque o percentual que pode ser gasto da renda da OAB com a folha salarial estava muito estourado e o nosso quadro estava totalmente inchado. Com todos esses fatores, fomos levados a tomar essa medida. Foi o dia mais triste da minha gestão. São 40 famílias que perderam a renda. Não demito ninguém no meu escritório, mas no meu escritório o dinheiro é meu, posso fazer empréstimo e me virar para não demitir. Mas, aqui, tenho uma Casa a gerir e responsabilidade de administrar o dinheiro de 46 mil advogados.

Já tem programa para reduzir a inadimplência?

Nós lançamos o programa chamado Recupera, oferecendo favoráveis condições para o advogado negociar ou renegociar os seus débitos. Está fazendo muito sucesso.

Recentemente, a OAB inaugurou a Subseção de Águas Claras. Antes, esse serviço direcionado aos advogados de Águas Claras era feito onde?

Os advogados de Águas Claras eram inscritos em Taguatinga. É importantíssima a criação desta Subseção porque cada vez mais a advocacia está espalhada. Hoje em dia, aqui no Distrito Federal, temos mais advogados nas subseções do que no Plano Piloto e Lago Sul. Com a pandemia, os advogados passaram a precisar mais ainda de apoio, pois o profissional que não tem escritório usa a sala da subseção para atender o cliente e o computador para fazer as audiências, que agora são virtuais.

Como foi abrir essa subseção nesse momento tão difícil?

Nessa obra, assim como em outras que estamos fazendo, não gastamos um tostão.

Como?

É tudo verba do Fida, um fundo do Conselho Federal de apoio às seccionais. Mediante a projetos apresentados, eles fornecem recursos para a execução. Nós fizemos a Subseção de Águas Claras, que já foi inaugurada. Estou fazendo uma obra no nosso prédio porque, por incrível que pareça, a Ordem dos Advogados do Brasil não tem acessibilidade para os deficientes físicos pela W3, só tem pela W2 e se entrar pela garagem. Uma das maiores vergonhas que já passei na minha vida foi no dia da nossa posse: um conselheiro cadeirante não conseguiu subir no auditório para receber o diploma. Desde então, tenho muita vontade de fazer essa obra. O nosso prédio, tão antigo e sem manutenção nas gestões anteriores, está com vários problemas que foram objeto de autuação dos bombeiros. O Clube do Advogado está com a arquibancada interditada porque tem problema estrutural por falta de manutenção. Estou fazendo essas quatro obras com dinheiro do Fida. Na Sala de Apoio da Polícia Federal (PF), caiu o teto. A OAB-DF faz 60 anos e parece que os 60 anos chegaram, inclusive, na parte física, no mal sentido, me obrigando a gastar esse dinheiro com coisas que a gente não esperava. Esses valores poderiam estar sendo usados com outras subseções. Uma coisa que tenho muita vontade é de deixar todas as subseções com sede própria. Hoje, nós temos 12 Subseções, mas as do Guará, São Sebastião e Brazlândia não têm sede própria e funcionam nas salas dos fóruns disponibilizadas à OAB.

O senhor completa, em 2020, o 2º dos três anos de mandato. De que forma quer que seja lembrada a sua gestão?

Eu gostaria de ser lembrado pela gestão que modernizou a casa e deu voz à toda advocacia: brancos, negros, amarelos, ricos, pobres, mais abastados, menos abastados e de todas as áreas. É por isso que fazemos questão de ter aqui no conselho essa participação mesclada. Se a gente conseguir deixar uma gestão com esses serviços todos, moderna, à disposição da advocacia, descentralizada para as subseções e com a paridade de gênero e participação maior da raça negra, vou me sentir satisfeito.

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As eleições on-line vão sair no ano que vem?

Estamos trabalhando muito para isso. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai disponibilizar sistema para que a gente possa fazer as eleições on-line. A gente teria a chancela da Justiça Eleitoral, o que é muito importante. Eu acho a eleição da OAB-DF um acinte com a advocacia. Toda vez está chovendo e é uma dificuldade enorme para achar locais de votação porque tem muita gente. Em termos de comodidade, a votação eletrônica seria muito mais fácil. Sem contar os custos. A gestão passada deixou na prestação de contas algo em torno de R$ 600 mil gastos com eleições (aluguel, logística etc). Com R$ 600 mil, eu faria as subseções que gostaria. Qual é a única crítica que se faz? Medo do voto de cabresto. Por exemplo, em um escritório x que tem 50 advogados, o chefe vai pedir para votar em certo candidato. Para isso, dou duas soluções. A 1ª é tecnológica: o TSE disse que é possível, por exemplo, votar em A na frente do meu chefe e, até mais tarde, mudar para B. A 2ª é fazer a votação no sábado ou domingo, quando órgãos públicos e os escritórios estão fechados.

Como garantir a segurança dos votos nas eleições on-line?

A gente teria a garantia da Justiça Eleitoral de segurança. Não é uma empresa qualquer que vou contratar para fazer a eleição. O TSE, por meio do convênio com a OAB-DF, está atestando que aquele sistema é seguro.

Nesse modelo, os advogados votariam pelo celular?

Pelo celular, computador… Onde quiserem.

O senhor declarou ser contra a reeleição na OAB. Mantém o posicionamento ou pretende ser candidato no próximo ano?

Não estou nem pensando nisso. Acho que a gente está em um período no qual a última coisa que temos que pensar é na eleição do ano que vem. Tem tanta coisa para fazer ainda. Muita gente tem perguntado e eu digo que não sei. A eleição é só daqui um ano, sabe? Estou interessado em fazer o melhor trabalho e entregar o melhor legado possível.

A OAB-DF fez uma campanha em prol das prerrogativas (direitos dos advogados para exercer plenamente a profissão). Um dos casos que ganhou destaque neste ano foi o do advogado preso por policiais civis em Planaltina….

Com tribunais, Ministério Público e delegacias fechadas, você não imagina como ficou o meu telefone 24 horas por dia. Fizemos representação criminal contra esse delegado que algemou o advogado dentro da delegacia. Nada justifica algemar um ser humano nos pés e nas mãos. O advogado foi jogado dentro de uma cela com presos e sem garantia do isolamento. Acho que isso não tem justificativa. Eles [policiais civis] fizeram uma autuação por crime de desacato pelo advogado e esse processo foi arquivado a pedido do MP. Está em apuração abuso de autoridade. Uma linha que a gente tem tomado é fazer o desagravo – claro, é importante para que o advogado se sinta acolhido pela Casa dele –, mas só o desagravo não adianta nada. Fomos ao CNMP contra um promotor que prendeu advogado no ano passado, fizemos representação criminal e ele acabou fazendo transação penal. A gente foi várias vezes ao CNJ durante este período de pandemia brigando para que os tribunais abram as portas – não digo nem fisicamente, porque entendo a pandemia – e o advogado seja atendido por um juiz assim como a gente está se falando [por videochamada]. Temos feito essa linha de atuação mais efetiva em relação às prerrogativas. Ninguém aqui tem medo de juiz. O nome da nossa chapa foi Independência na Ordem. E eu faço questão de lembrar isso todos os dias: independência não quer dizer necessariamente independência ao governo, mas em relação aos Poderes constituídos. É poder ir para o CNJ contra um juiz que faz besteira, ir para o CNMP contra procurador que faz besteira, entrar com ações civis públicas em relação a temas variados, aí, sim, referentes ao Executivo. É institucional. É mostrar que a OAB é uma instituição respeitada. A Associação dos Magistrados fez uma pesquisa para ver qual entidade da sociedade civil mais respeitada pelos ouvidos e a OAB ganhou com 67%. Não estamos aqui para brincar, mas a gente tem que mostrar que não está aqui para brincar, porque senão vamos ser cada dia mais desrespeitados. Eu não tenho medo de juiz, de brigar com juiz e de ter uma porta fechada depois porque quando era presidente da OAB-DF entrei com representação contra ele. Me elegi para ser presidente da OAB e acho que o básico que o ocupante do cargo tem que fazer é agir de forma independente e sem medo, mas sempre com respeito institucional, que deve imperar. O que temos de ter é um bom relacionamento institucional e é o que está prevalecendo.

A OAB-DF pode agir em relação à vacina contra Covid-19 para garantir direitos não só dos advogados, mas também da população em geral?

Acho tão burra essa polarização política no nosso país. Ou você é ultra direita ou ultra esquerda, ou é PT ou Bolsonaro, como se não existisse nada no meio e não pudesse ser tomada decisão técnica sem envolver política. Hoje, se você é a favor da vacina chinesa, é de esquerda; se é a favor da vacina de Oxford, é de direita, ou mais ou menos, porque se é de direita é contra a vacina. É uma coisa tão louca. Acho que esse clima político no país não favorece nada. No início da pandemia, criamos na OAB-DF um comitê de acompanhamento do coronavírus, formado por comissões que a gente entendeu que seriam as mais demandadas, como as de Saúde, Bioética, Prerrogativas, Relações Institucionais e a Diretoria. Foram mais de 200 ofícios enviados aos mais diversos órgãos. Participamos de uma força-tarefa envolvendo Defensoria Pública, Ministério Público e a Câmara Legislativa. Fomos ao Palácio do Buriti várias vezes para apresentação dos números da pandemia. Então, a gente está fazendo um trabalho intenso. Agora, com a questão da vacina, levamos para o comitê para pensar no que vamos fazer. Então, a 1ª coisa será oficiar o GDF para perguntar como está a situação aqui, o que está pensando em termos de vacina, se está criando calendário de vacina ou se está dependendo do governo federal. Entendo os problemas que qualquer gestor passa, é uma situação nova. Eu até brinco que, nos melhores sonhos ou nos piores pesadelos, jamais esperei ser presidente da OAB-DF em um momento como este. Tenho certeza que o governador e o presidente também não imaginaram. Mas acho que é preciso ter critérios técnicos, afastados da política, para tomar decisões. É o que a gente tentou fazer ao longo da pandemia, não fomos irresponsáveis em momento nenhum e assim vai continuar sendo.

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