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Análise: antes de mais nada, Bolsonaro gosta de contrariar

Ao insistir na indicação do filho para a embaixada nos EUA, presidente faz pirraça com a imprensa e reforça imagem de intolerância

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Foto: Michael Melo/Metrópoles
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Uma das características mais marcantes do presidente Jair Bolsonaro (PSL) no exercício do cargo é a compulsão por contrariar alguns setores da sociedade. Em discursos, entrevistas, lives e posts no Twitter, ele se esmera em demonstrar desagrado por segmentos como esquerda, imprensauniversidadesambientalistas.

Bolsonaro se refere a essas parcelas da população de forma genérica, muitas vezes, sem apontar a origem específica de sua insatisfação. No último exemplo de pirraça, ao falar da indicação de seu filho, Eduardo (na foto em destaque, fala ao ouvido do pai), para a Embaixada do Brasil nos Estados Unidos, o presidente se voltou contra os meios de comunicação.

“Nós temos que tomar decisões que não agradam a todos, como a possibilidade de indicar meu filho à embaixada dos Estados Unidos, que está sendo criticada pela mídia. Se está sendo criticada, é sinal de que [Eduardo] é a pessoa adequada”, afirmou o capitão em solenidade no plenário da Câmara dos Deputados.

No jeito peculiar e superficial de tratar dos assuntos, Bolsonaro reclama da mídia como se, nesse conceito, não estivessem, por exemplo, os programas de TV onde ele e os filhos concedem entrevistas com certa frequência. Também ignora a cobertura jornalística diária e factual sobre todos os atos do governo, em particular, do Palácio do Planalto.

O que, na verdade, incomoda Bolsonaro é o jornalismo profissional, ofício dos que acompanham de forma crítica as ações das autoridades. Não interessam a ele, por exemplo, as reportagens da Folha de S. Paulo sobre as candidaturas laranja em torno do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio.

Diante de situações indefensáveis, como o escândalo em torno do ex-policial militar Fabrício Queiroz, fica mais fácil culpar a “mídia”. Assim, busca eximir-se de dar explicações sobre a movimentação financeira atípica no gabinete do outro filho, Flávio Bolsonaro, quando era deputado estadual no Rio de Janeiro.

Na realidade, quando faz críticas vagas aos veículos de comunicação, o presidente tenta jogar a população contra a imprensa profissional. Essa parece uma tarefa mais fácil do que convencer o mundo de que o filho tem as condições mínimas para comandar a embaixada nos EUA.

Ao explicitar o intuito de desagradar a “mídia”, o chefe do Executivo procura criar um inimigo para justificar as previsíveis reações contra a escolha do filho para o cargo. Sem currículo nem qualquer outra qualificação específica exigida para a função, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) representa uma humilhação para a diplomacia brasileira.

Não se pode antecipar a real intenção do presidente com a opção pelo filho para um dos postos mais estratégicos para o país. Mas parece evidente a vontade de projetar a imagem do filho dentro e fora do país, certamente, para voos maiores no futuro.

Defensor das corporações da área de segurança, Bolsonaro exibe certo desprezo pelo Itamaraty, instituição reconhecida pela excelência na formação dos seus quadros. Isso ficou evidente antes mesmo do início do governo, quando escolheu Ernesto Araújo, um diplomata sem experiência internacional relevante, para comandar o Ministério das Relações Exteriores.

Dono de ideias desconexas sobre política externa, o chanceler se notabiliza por fugir da tradição de ponderação e equilíbrio do Brasil no cenário internacional. Assim como o chefe, gosta de contrariar.

Algumas das causas defendidas por Bolsonaro encontram amparo em parte de seus eleitores. São nichos minoritários e barulhentos que tiveram papel determinante na eleição para o Planalto do que chamam de “mito”. Quando toma esse rumo, o presidente age contra os interesses da maioria da população. É o caso, por exemplo, da pressão por facilidades pelo acesso a armamentos pela sociedade civil. Ele também desagrada a maioria quando se insurge contra os radares nas estradas.

Segundo pesquisas, em larga maioria, os brasileiros defendem os equipamentos de segurança nas rodovias e rechaçam a flexibilização do porte de armas. Exatamente o oposto do que faz Bolsonaro. Só para contrariar.

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