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Fora da política: mulheres têm apenas 15% das vagas nos legislativos

Nos parlamentos estaduais e distrital, houve um avanço tímido nas últimas eleições. Há estados em que nenhuma candidata se elegeu em 2018

atualizado

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Michael Melo/Metrópoles
CLDF 2
1 de 1 CLDF 2 - Foto: Michael Melo/Metrópoles

Ainda em 1995, toda a América Latina se comprometeu, na IV Conferência Mundial sobre a Mulher, a aumentar a presença feminina na política. De lá para cá, o Brasil vem aprovando leis para tentar ampliar o número de eleitas para cargos públicos no Legislativo do país. A mais famosa norma é a que prevê cotas de 30% das candidaturas dos partidos ou coligações para mulheres em eleições proporcionais.

Porém, apesar do esforço, apenas 15% dos deputados estaduais/distritais eleitos no ano passado são mulheres. Em 2018, dos 1.059 parlamentares das assembleias legislativas, exatamente 161 eram do sexo feminino. Os dados foram levantados pelo Metrópoles, que constatou, no entanto, crescimento de deputadas eleitas na última votação: nas eleições de 2014, o percentual era de 11%.

Ou seja, em 2018 foram eleitas 35% mais deputadas estaduais/distritais do que quatro anos antes. Assim, 42 parlamentares mulheres a mais chegaram às assembleias em 1º de janeiro de 2019. Amapá é o estado brasileiro com mais deputadas estaduais: 8 de 24 (33%).

Na sequência, aparecem Sergipe e Roraima, onde, dos 24 deputados da Assembleia Legislativa, 6 são do sexo feminino, o que significa 25% do total. Já os estados de Goiás e Rondônia elegeram apenas duas deputadas estaduais cada. Pior ainda foi Mato Grosso do Sul, onde nenhuma mulher foi eleita para um cargo na assembleia.

Segundo os números do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), quando se considera todos os cargos em disputa nas eleições gerais de 2018, a cada 10 candidatos, três eram mulheres, exatamente como determina a lei. Em 2014, os números foram um pouco maiores: 31,1% dos candidatos eram do sexo feminino.

Atualmente, o Brasil ocupa apenas a 152ª posição em um ranking de 190 países sobre a paridade no número de cadeiras ocupadas por homens e mulheres no Legislativo, revela estudo divulgado no ano passado de autoria do Inter-Parliamentary Union (IPU), uma organização com sede na Suíça que tem o objetivo de mediar os contatos multilaterais dos parlamentares dos países. Isso mostra que nas Casas estaduais/distrital ou federal ainda há muito o que melhorar. Na Câmara dos Deputados, dos 513 parlamentares, apenas 77 são mulheres, os mesmos 15%.

O que os números mostram?
Para a antropóloga Lia Zanotta Machado, professora da Universidade de Brasília (UnB), eleger deputadas é ainda mais difícil do que vereadoras. De acordo com a docente, quando se trata de uma eleição estadual ou federal, é preciso uma campanha maior, com mais investimento financeiro e apoio das legendas. Esse último, conforme destacou a especialista, costuma faltar.

“Não basta só ter a lei. A cota é, sim, muito importante, mas é preciso que os partidos se envolvam verdadeiramente nas campanhas femininas. Ou seja, o avanço é paradoxal. Muitas mulheres são eleitas porque carregam o nome da família que sempre esteve na política, mas eleger uma deputada com uma campanha autônoma é mesmo muito difícil”, ressalta Lia.

Se não sairmos da necessidade de uma autorização masculina para que uma mulher seja eleita, vamos levar anos e anos para chegar à paridade entre os eleitos. 

Lia Zanotta Machado, antropóloga

A educadora dá como exemplo ainda a Argentina, onde as cotas de mulheres na política existem entre o número de eleitos e não entre os que se candidatam. “Por lá, 30% dos parlamentares obrigatoriamente precisam ser mulheres. Ou seja, a cada dois homens que chegam ao poder, há uma mulher eleita também”, explica.

A cientista política e pesquisadora da UnB Marina Helena Maia acredita que quanto mais mulheres tiverem voz e espaço na política, mais meninas se interessarão pelo tema a cada ano. “A cota é importante, mas desde que junto se trabalhe a mentalidade do brasileiro. Tirar a mulher do espaço estereotipado é o principal caminho a ser traçado”, frisa.

“A maioria das revistas com mulheres nas capas é de beleza e moda. Assim, são quase que, automaticamente, chamadas para esse caminho. Elas precisam aparecer mais nos outros locais de trabalho e fala. Tirar a mulher da ‘lógica’ do lar e colocá-la no status político é o primeiro passo a ser dado”, defende.

A cientista política ainda explica que a mulher tem de ter espaço para ser quem é dentro da política. “Muitas precisam se masculinizar para se manter no poder. A ex-presidente Dilma [Rousseff] era tida como brava, mandona. Agora, se agisse de forma delicada e menos enfática, seria considerada fraca”, conclui.

A legislação
Em 1997, a Lei nº 9.504 estabeleceu o sistema de cotas, fixando que os partidos deveriam inscrever, no mínimo, 30% de mulheres nas chapas proporcionais. Em 2009, a reforma eleitoral passou a obrigar ainda que pelo menos 5% dos recursos do Fundo Partidário fossem usados, pelas siglas, para incentivar a participação feminina na política. A partir daquele ano, parte do tempo da propaganda partidária – 10% – passou a ser dedicado às mulheres.

Em maio do ano passado, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu que os partidos deveriam repassar 30% dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para candidaturas de mulheres. No entanto, foi aí que os escândalos nas candidaturas femininas começaram a aparecer.

O mais forte deles envolve o PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro. Em fevereiro, o jornal Folha de São Paulo denunciou o repasse de R$ 400 mil da sigla para uma candidata a deputada federal de Pernambuco. Segundo a publicação, o montante foi entregue quatro dias antes das eleições. A postulante recebeu apenas 274 votos. Há a investigação agora se essa e outras candidaturas teriam sido “laranja”, ou seja, de fachada.

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