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José Serra diz que Bolsonaro arrisca tempo precioso apostando na cloroquina

Para o senador e ex-ministro da Saúde, insistência em tratamento sem eficácia comprovada traz insegurança ao sistema de combate à Covid-19

atualizado

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Wilson Dias/Agência Brasil
José Serra
1 de 1 José Serra - Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

O senador José Serra (PSDB-SP), que foi ministro da Saúde entre 1998 e 2002, na gestão presidencial de Fernando Henrique Cardoso, vê na defesa da cloroquina pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) uma “cruzada” pessoal que prejudica todas as ações de comprovada eficácia contra o coronavírus, “como o distanciamento social, a testagem em massa, o rastreio de infectados, o aumento da capacidade de leitos, a estimativa do índice de infectados por amostragem e o eventual passaporte da imunidade.”

Há o risco, para o político que tem 78 anos e está cumprindo isolamento social no interior de São Paulo, de o debate sobre o uso da cloroquina, recomendado em novo protocolo do Ministério da Saúde, “paralisar e até desmontar o aparato executivo e de coordenação das decisões” por causa da insegurança trazida pela politização de um debate técnico. “Arrisca-se perder tempo precioso no combate ao surto”, opina Serra em entrevista ao Metrópoles.

O ex-ministro da Saúde, reconhecido por ações bem-sucedidas, como a quebra de patentes dos remédios para tratamento da Aids e dos mutirões de cirurgias, diz que tem acompanhado as pesquisas em torno da eficácia da cloroquina contra a Covid-19. Ele considera preocupante a liberação para pacientes com sintomas leves por avaliar que o prejuízo trazido pelos efeitos colaterais pode ser maior do que o possível — e não comprovado — benefício.

“As notícias mais recentes que tenho é que este protocolo no estágio inicial também está sendo descartado, pois a Covid-19 parece apresentar quadros graves de coagulação e comprometimento do sistema circulatório, que são condições que a hidroxicloroquina e azitromicina podem agravar, causando mortes súbitas em pacientes que provavelmente teriam um desdobramento médio mais benigno da doença”, afirma o senador.

“Ou seja, pode até salvar a vida de alguns, mas parece comprometer a de outros que provavelmente não desenvolveriam as formas mais graves da doença”, completa Serra.

Não à toa, nesta quinta-feira (21/05), o senador apresentou um projeto legislativo sustando o protocolo feito pelo Ministério da Saúde recomendando o uso da cloroquina.


Risco político
O ex-ministro afirma não entender a motivação de Bolsonaro ao defender com tanto afinco o uso amplo da cloroquina contra a Covid-19.

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“É um risco político, pois chama para si a responsabilidade da pasta da Saúde e do próprio agravamento do surto. Há assimetria neste cálculo. Se, de fato, você tiver a bala de prata, ótimo, todos comemoram e os ganhos políticos se diluem, mas se não for e você tiver paralisado ou desarticulado outras frentes, levará sozinho a culpa desta ingerência”, avalia o político tucano.

O que eu faria?
Para Serra, o Brasil não deveria abandonar o uso da cloroquina, pois não há estudos definitivos que descartem sua eficácia. “A orientação médica correta é seguir explorando e patrocinando a pesquisa”, opina ele.

Assim como ele, outro ex-ministro da Saúde, o hoje deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP), também defendeu a testagem da droga em entrevista ao Metrópoles.

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