Homem que ajudou idosa a atravessar a rua garante: “Ela me agradeceu”

Capoeira não viu o vídeo, não sabe quem filmou e não entende o motivo de tanta polêmica nas redes, mas está feliz com a repercussão do gesto

atualizado 11/04/2019 14:48

Cristina Serra/Metrópoles

Em um vídeo que viralizou nas redes sociais, aparece um homem negro colocando caixotes numa rua alagada, em Copacabana, para que uma senhora branca pudesse alcançar a calçada do outro lado sem molhar os pés. Ao final da travessia, ele dá a mão para que ela desça do último caixote. Ela desce e vai embora sem nem sequer virar o rosto para ele e, aparentemente, sem agradecer.

Aparentemente. Varlei Rocha Alves, o Capoeira, é o senhor negro que aparece no vídeo. Ele disse ao Metrópoles que a mulher agradeceu, sim, e “deu umas moedinhas”. “Ela deu de coração”, disse o guardador de carros de 50 anos – há 20 trabalhando na Rua Viveiros de Castro, em Copacabana.

Capoeira já era bastante conhecido pelos moradores de classe média da rua, mas agora adquiriu o status de uma celebridade local desde que o vídeo viralizou. “Tu não sabe o quanto tá rolando esse vídeo”, disse Hiago Maia, que cresceu vendo Capoeira trabalhar nesse trecho do bairro. “Parabéns, continue fazendo o bem”, disse uma moça que passava, enquanto o guardador dava entrevista para o Metrópoles. “Vai ficar rico, hein?”, disse outro.

Capoeira não viu o vídeo, não sabe quem filmou e não entende o motivo de tanta polêmica nas redes. Mas está feliz com a repercussão do seu gesto: “É maravilhoso ver as pessoas reconhecendo a bondade”.

Em geral, os posts com a imagem vêm acompanhados de críticas ao comportamento da senhora por não ter, supostamente, agradecido a gentileza e a solidariedade do guardador. “Ela me agradeceu. Eu é que virei rápido porque tinha outras pessoas esperando pra atravessar. Eu ajudei todo tipo de gente. A gente tem que ajudar sem olhar a quem”, prega Capoeira.

A cena foi registrada na noite da segunda-feira (8/4), quando um forte temporal arrasou vários bairros do Rio de Janeiro. Capoeira, então, teve a ideia de pedir alguns caixotes a um supermercado e auxiliar as pessoas na travessia da esquina das ruas Viveiros de Castro e Prado Júnior. “Eu não cobrei nada. Quem quis me ajudar, ajudou”, disse o guardador.

Ele conta que, no dia seguinte ao temporal, a senhora o procurou na rua para entregar-lhe uma quantia maior, mas ele não aceitou. “Eu só queria ajudar mesmo. Nem sei quantos eu ajudei a atravessar e nem todos pagaram. Mas todos agradeceram. Um agradecimento também vale muita coisa”, disse Capoeira.

O guardador faz de tudo um pouco para aumentar os trocados que garantem seu sustento e o do filho, Darlei, de 10 anos. Além de tomar conta dos carros, carrega sacolas de compras e até ajuda a encher caminhão de mudança, quando algum morador vai embora. Consegue ganhar entre R$ 100 e R$ 150 por dia. “Ele é íntegro, respeitador, uma pessoa que está sempre praticando o bem e é muito querido entre nós”, diz Anice Ataíde, que faz um trabalho de assistência aos moradores de rua das imediações da Viveiros de Castro, distribuindo sopa.

Capoeira veio de Campos, no interior do Rio de Janeiro, ainda criança. Ganhou o apelido quando era “sarado” e pegou. “Eu brinco um pouquinho [de capoeira]. Dava meus pulos quando era sarado. Mas agora, eu tenho um problema no joelho e cheguei até a andar de muleta por um tempo”, contou.

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Capoeira perdeu a esposa, Daniele, atropelada na Avenida Atlântica, quando Darlei tinha 1 ano e 10 meses. O menino, agora no quinto ano, encontrou na tia, Claudilene, irmã de Capoeira, uma segunda mãe, com quem vive no distante subúrbio da Pavuna, quase na Baixada Fluminense. “Ela cuida muito bem do meu filho. É um anjo na minha vida. Ela tem seis filhos e ainda cuida do meu”, conta Capoeira.

Nem sempre ele consegue voltar para a casa da irmã e, quando isso acontece, se arranja para dormir debaixo de alguma marquise em Copacabana. No fim de semana, vai para a Pavuna encontrar o filho. “A gente se ajeita todo mundo no barraco da minha irmã.”

Depois que o vídeo viralizou e a situação de Capoeira se tornou conhecida, algumas pessoas tiveram a iniciativa de fazer uma vaquinha on-line para ajudar Capoeira. Seu maior sonho é ter uma casa para morar com o filho. Nesta quarta-feira (10), com a súbita notoriedade, Capoeira fez questão de levar o menino para que os moradores da Viveiros de Castro o conhecessem. “Se eu conseguir deixar uma casa pra ele, eu morro feliz”, disse Capoeira.

Alheio à súbita fama, Capoeira seguirá sua rotina nas ruas. “A vida continua. Enquanto eu não tiver um emprego com carteira assinada, é aqui que vou continuar trabalhando”, disse Varlei Rocha Alves. Mas pode chamar de Capoeira, um brasileiro.

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