metropoles.com

O extravagante Reino Brasil (por Mary Zaidan)

Uma república de compadres regida pelo sobrenome, nepotismo e cargos de conveniência. É a vez de Jair Renan Bolsonaro

atualizado

Compartilhar notícia

Igo Estrela/Metrópoles
Jair Renan, filho numero 4 de Bolsonaro. Ele tem cabelos e barba pretos - Metrópoles
1 de 1 Jair Renan, filho numero 4 de Bolsonaro. Ele tem cabelos e barba pretos - Metrópoles - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

Com salário de R$ 9,5 mil, o “digital influencer” Jair Renan Valle Bolsonaro, do alto de seus 25 anos, virou auxiliar parlamentar sênior do senador Jorge Seif (PL-SC). A nomeação, estampada no Diário Oficial da União do dia 8 de março, segue o padrão do clã, cujo sobrenome frequenta contracheques públicos há 30 anos, com mais de uma centena de parentes, amigos do peito e familiares desses amigos. Ainda que mais escancarados do que a maioria, os Bolsonaros não são exceção. Os cargos de livre nomeação em todas as esferas públicas são cabides de emprego para parentes e cupinchas, imoralidade enraizada na política brasileira, independentemente de partido ou ideologia.

Nepotismo é proibido por lei. Rigoroso em sua análise, em 2013 o STF passou a proibir nomeações de parentes até terceiro grau. Mas uma coisa é a lei e outra é o cumprimento dela. Contratar mulher, marido, filho, nora, neto, tio e toda a parentalha é prática viva em todo o país.

Eleito em 2020, o prefeito de Magé, Renato Cozzolino (PP) chegou a nomear 7 parentes. Depois de um fuzuê na mídia, acabou advertido, recebendo a “sugestão” do Ministério Público para exonerar quatro deles, incluindo a irmã, Jamille, eleita vice-prefeita e nomeada para a Secretaria da Educação. Continua prefeito, sem qualquer punição.

Em 2005, o então deputado Jair Bolsonaro chegou a chamar de “palhaçada” o debate contra a contratação de parentes. “Em alguns casos o nepotismo é válido”, disse à época, ao defender a liberdade de nomear quem ele quisesse. Só faltou tentar legitimar o instituto das “rachadinhas”, apropriação de parte do salário de nomeados, prática usual na família.

Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, chegou a contratar um concunhado. Depois da grita, recuou e até propôs alteração na lei estadual sobre nepotismo. Mas, em lealdade ao ex-chefe, manteve a nomeação de um irmão da ex-primeira dama Michelle Bolsonaro, Diego Torres Dourado, como assessor do governador, com salário de R$ 19 mil.

Empregar amigos, mesmo os que não comparecem ao batente porque “trabalham na base” – justificativa padrão de parlamentares quando pegos em flagrante – não é ilegal. Mas atenta contra a moral e o bolso dos brasileiros. Quanto mais quando o tal amigo ou filho do político que se quer agradar, a exemplo do 04 de Bolsonaro ou do irmão de Michelle, não tem qualificação para o cargo. E quem se lixa pra isso?

No caso do nepotismo, a burla mais comum é a nomeação casada, difícil de ser provada e penalizada. Um deputado que nomeia a mulher de outro deputado que por sua vez nomeia a filha do amigo. Um prefeito que nomeia a mulher do vereador ou a ministra que nomeia o filho do deputado aliado em troca de cargo para a sua filha.

Há outras práticas que podem até não descumprir leis, mas que são tão ou mais escabrosas. É o caso das recentes indicações – com as devidas aprovações legislativas – de mulheres de ex-governadores para os Tribunais de Contas de seus estados.

Ministro de Desenvolvimento Social do governo Lula, o petista Wellington Dias conseguiu que sua mulher, Rejane Dias, virasse conselheira do TCE do Piauí. Terá a incumbência de analisar as contas do marido. Essa também será a tarefa da enfermeira Aline Peixoto, mulher do ex-governador da Bahia e hoje ministro da Casa Civil, Rui Costa, recém aprovada para o Tribunal de Contas baiano. O mesmo se deu no Amapá e em Alagoas. Marília Góes, indicada ao TCE-AP pelo marido, o ex-governador Waldez Góes, e Renata Calheiros, mulher do ex-governador, senador e atual ministro dos Transportes Renan Filho (MDB), vão julgar a lisura de suas caras-metade frente à governança de seus estados.

Os Tribunais de Contas são escandalosos. Mais de 80% dos 232 conselheiros das cortes estaduais são afilhados de políticos, e 30% deles parentes de governadores. Parece brincadeira. Mas não é.

O nepotismo endêmico é mais do que uma mazela da estrutura do país, acostumado à política patrimonialista. Por aqui, política se faz de pai para filho – vide os clãs Sarney, Magalhães, Calheiros, os Arraes (Campos) e Bolsonaro, que elegeu três rebentos – e entre amigos. São redes perversas que se impõem no poder via hereditarismo. Que distribuem regalias com os impostos de todos e montam seus times por meio de benesses do Estado. Que estraçalham quaisquer obstáculos legais e vivem das delícias do dinheiro alheio. Assim se perpetuam.

Jair Renan é um aprendiz. É o mais jovem do clã Bolsonaro na república de compadres, pelo menos até que sua meia-irmã Laura, hoje com 12 anos, alcance a maioridade. No futuro próximo, o mais provável é que dispute votos. Mesmo que política não seja a sua praia, sabe que não escapará dos planos de poder do papai nesse extravagante Reino Brasil.

Mary Zaidan é jornalista 

Compartilhar notícia

Quais assuntos você deseja receber?

sino

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

sino

Mais opções no Google Chrome

2.

sino

Configurações

3.

Configurações do site

4.

sino

Notificações

5.

sino

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comBlog do Noblat

Você quer ficar por dentro da coluna Blog do Noblat e receber notificações em tempo real?