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Autodeterminação dos povos e mudança climática (por Felipe Sampaio)

A discussão sobre a dimensão global de um iminente caos climático é tão legítima quanto urgente, e deve mobilizar governos e povos

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Igo Estrela/Metrópoles
Por do sol durante o clima seco e umidade baixa em brasília DF 7
1 de 1 Por do sol durante o clima seco e umidade baixa em brasília DF 7 - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

A emergência climática é a nova pedra no sapato da definição complexa e mutante de autodeterminação dos povos.

No século XVIII Rousseau inaugurava a ideia de soberania associada ao povo e não ao governo, que inspiraria a Revolução Francesa. Seu contemporâneo prussiano Immanuel Kant pregava a independência das nações, festejando a Revolução Americana.

Contudo, ainda na França rousseauniana, Robespierre não tardou a instalar o regime do Terror. Napoleão, por sua vez, patrocinou mais de 60 batalhas militares colonizadoras contra a vizinhança europeia.

Enquanto isso, os estadunidenses iluministas descambaram para um racha na sua própria autodeterminação que resultou na guerra civil mais mortal da história. Em seguida abocanharam boa parte da autodeterminação do México, das ilhas do Pacífico e assim por diante ainda hoje.

No início do século XX, revolucionários russos defendiam o direito dos povos e das nações. Ao fim da Segunda Guerra Mundial, os documentos fundantes das Nações Unidas dispunham sobre “o direito de autodeterminação dos povos sobre sua condição política e seu desenvolvimento econômico, social e cultural“.

Mesmo assim, os libertadores da Revolução de 1917 não pensaram duas vezes para subjugar as nações vizinhas em nome de uma União Soviética, enquanto os signatários europeus da Carta da ONU foram implacáveis contra a independência de suas colônias na Ásia e África até a década de 1960, deixando a autodeterminação desses povos cambaleante até hoje.

Nesse cenário, as mudanças climáticas, um fenômeno transfronteiriço global, apimentaram o caldeirão de contradições que já constituíam a ideia de autodeterminação dos povos, a promessa mais frustrada da humanidade (empatando apenas com a equidade social).

A discussão sobre a dimensão global de um iminente caos climático é tão legítima quanto urgente, e deve mobilizar governos e povos na busca de uma solução política e científica para um verdadeiro dilúvio que se avizinha (e para o qual não há uma arca de Noé à altura).

No entanto, nesse processo não se pode descuidar do direito universal à autodeterminação dos povos. Observe-se as iniciativas da OTAN e dos países desenvolvidos que já associam os fenômenos climáticos às suas políticas de defesa e de relações exteriores, refletidas, por exemplo, no seu empenho de incluir a mudança climática na agenda do Conselho de Segurança da ONU.

O Brasil está no centro dessa discussão, considerando-se sua parcela amazônica, seu domínio oceânico, riquezas minerais, estoques de água doce, produção de alimentos e seu peso no equilíbrio do sistema climático do planeta.

É inadiável para o País um grande diálogo, responsável e propositivo, entre nossos ambientalistas, forças de defesa e segurança, sociedade civil, diplomatas, parlamentares, cientistas, academia e empresários.

Cabe lembrar que nosso cardápio de aprimoramento do conceito de autodeterminação, não poderão faltar, além das questões ambientais e geopolíticas, os problemas internos como segurança pública, desigualdade social, educação, acesso à justiça, matriz energética, modelo econômico, gestão urbana, Amazônia, entre outros.

 

Felipe Sampaio: Foi assessor especial dos ministros da Defesa (2016-2017) e da Segurança Pública (2018); ex-secretário executivo de Segurança Urbana do Recife; colabora com o Centro Soberania e Clima.

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