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Mulher negra vai à DP registrar queixa e sai acusada de furto

Karine Fernandes do Santos Santana foi à delegacia registrar queixa por calúnia e difamação ao ser acusada de roubar o próprio casaco

atualizado

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Rafaela Felicciano/Metrópoles
consciência negra racismo preconceito
1 de 1 consciência negra racismo preconceito - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

No dia 11 de maio, a autônoma Karine Fernandes do Santos Santana, 26 anos, foi acusada injustamente por uma vendedora de furtar um casaco, que na verdade era seu, em uma loja de roupas do bairro onde mora, no Rio de Janeiro. Ela saiu de lá e foi direto para a 29ªDP (Madureira) para prestar queixa de calúnia e difamação, mas saiu da delegacia como acusada.

De acordo com o jornal Extra, nessa quarta-feira (17/5), a jovem voltou à DP com a nota fiscal e fotos antigas mostrando que era dona da roupa, como havia dito enumeras vezes. Só assim, conseguiu sair com um termo de declaração, no qual pede para reverter a acusação contra a vendedora, pelo crime que originou a sua ida ao local, na semana anterior.

“Fiquei desnorteada em casa caçando essa nota, encontrei ela, trouxe aqui, mas não consegui recuperar meu casaco, pois estão dizendo que foi para a perícia — disse a moça, sobre a peça comprada em 28 de abril, numa loja de São João de Meriti, na Baixada Fluminense, conforme comprovante apresentado à polícia”, disse em entrevista ao Extra.

Karine contou ainda que, sua revolta maior foi em relação ao tratamento recebido tanto pela vendedora, quanto pelos policias que conduziram a ocorrência, que a humilharam.

A história toda começou quando a autônoma entrou no comércio e resolveu experimentar uma roupa, que não ficou boa. Karine disse que saiu do provador, devolveu a peça e foi embora. Momentos depois, já em outra loja, na mesma rua, a vendedora da primeira loja veio atrás dela, acusando-a de ter levado do estabelecimento o casaco preto que estava com ela.

“Ela (a vendedora) me abordou, puxou meu casaco e começou a falar que eu tinha pego da loja. Fui me defendendo, falando que era um absurdo e ela dizendo que as câmeras iriam provar (que ela estava falando a verdade) e eu dizendo que era aquilo mesmo que eu queria (as imagens das câmeras). Eu comecei a chorar, minha voz estava trêmula”, relembra.

Karine seguiu a vendedora para recuperar seu casaco. Dentro da primeira loja, teria começado uma seção de constrangimentos, que continuou na presença de um segurança, que ameaçou agredi-la. Ela ligou pra o 190 e para familiares e aguardou por cerca de duas horas a chegada dos policiais, que tentaram convencê-la a não levar o caso à delegacia. Na DP, os constrangimentos teriam continuado, dessa vez por parte dos agentes.

“Eu arrisco dizer que o atendimento na delegacia foi pior do que a acusação de furto, porque também aqui tentaram me persuadir a não levar o caso para frente. Enfim, tratando como se fosse um caso bobo. Tinha ainda o menosprezo como mulher e preta. A partir do momento que eu disse que ia levar pra frente, gritaram em alto e bom som que eu seria indiciada por furto”, conta.

A advogada Roberta Cristina Eugênio, do gabinete da vereadora Marielle Franco, presidente da Comissão de Defesa da Mulher da Câmara Municipal, a qual Karine recorreu, disse que vai acompanhar a apuração da atuação dos policiais junto a Corregedoria da polícia Civil e , com a ajuda da Comissão de Direitos Humanos da Alerj, pretende encaminhar o caso de Karine à Defensoria Pública do Estado, por meio do Núcleo Contra a Desigualdade Racial.

“Embora não tenha havido uma acusação verbal de cunho racial, Karine sente que na verdade a abordagem se deu pelo fato de ela ser negra. É um caso que reverbera para o racismo estrutural na sociedade e mostra como as pessoas negras são tratadas.”, disse a advogada.

O jornal Extra tentou contato com a loja Belíssima, onde ocorreu o fato, mas a gerência informou que não se manifestaria. A vendedora também não foi localizada.

A assessoria de imprensa da Polícia Civil informou que as investigações estão em andamento na 29ª DP (Madureira) para apurar o caso. “Partes e testemunhas estão sendo ouvidas. O casaco foi encaminhado ao ICCE para realização de perícia”, diz a nota.

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