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Implementação do teste do pezinho ampliado ainda é desafio no Brasil

Apesar de lei já existir, muitas unidades federativas sequer conseguem garantir o teste clássico para recém-nascidos

atualizado

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Foto de um pé de um bebê sendo furado para detectar doenças
1 de 1 Foto de um pé de um bebê sendo furado para detectar doenças - Foto: Divulgação

São Paulo – Apesar de ser um dos procedimentos mais tradicionais no Brasil, o teste do pezinho ainda é um desafio para parte da rede pública nacional. O exame, que consiste na coleta de uma gota de sangue do pé do recém-nascido, foi criado para descobrir se a criança tem uma de seis condições de saúde graves que devem ser tratadas já nos primeiros dias de vida.

Desde maio de 2022, a lei federal 14.154/21 estabelece que o teste seja ampliado no Sistema Único de Saúde (SUS) para detectar 50 doenças diferentes. Porém, apesar de o procedimento ser muito mais completo, várias unidades federativas não conseguem sequer aplicar o exame tradicional com constância.

Quando a lei foi discutida na Câmara dos Deputados, foi apontado que na região Norte, o percentual de coleta do teste do pezinho até o quinto dia útil de vida do recém-nascido é de apenas 30%. Na região Sul, em contrapartida, o número chega a 70%.

A presidente da Sociedade Brasileira de Triagem Neonatal e Erros Inatos do Metabolismo (Sbteim), Tania Bachega, aponta que é impossível implementar o programa completo em um país grande como o Brasil sem primeiro organizar a rede de forma mais uniforme.

“Para ampliar, temos que organizar o programa nacional, que não teve a atenção devida nos últimos governos. É um território muito grande, e a triagem precisa ser pensada para que o plano funcione. Só pode ampliar se houver tratamento para a doença, se tiver capacidade de fazer um exame de confirmação, se tivermos uma equipe multiprofissional. Não adianta aumentar de qualquer jeito, porque é jogar dinheiro fora”, afirma a endocrinologista, em entrevista ao Metrópoles concedida durante o IX Congresso Brasileiro de Triagem Neonatal e Erros Inatos do Metabolismo, que aconteceu em São Paulo entre 13 e 16 de agosto.

“É uma lei simples para um problema complexo”, opina a geneticista Helena Pimentel. Ela é consultora do Ministério da Saúde na área de triagem neonatal desde 2001. “É algo desvinculado da realidade: hoje, no estado brasileiro, a triagem é interrompida. Em alguns casos, mesmo quando a mãe colhe o sangue, o exame não é feito. A triagem tem toda uma sequência, tem que ser feita em tempo adequado, com resultado rápido. Para ampliar, a estrutura precisa estar montada, mas ela não está”, explica a especialista.

Tania conta que em alguns estados, por exemplo, as amostras coletadas precisam ser enviadas por Sedex para análise em outras unidades federativas — porém, alguns locais simplesmente não possuem verba para pagar o transporte pelos Correios. Com isso, o exame atrasa e o paciente doente pode desenvolver complicações enquanto espera o resultado.

“Nesse momento, não podemos falar em nada além de fazer o básico do básico. Precisamos saber onde estão os problemas, reorganizar e, aí sim, abrir discussões sobre ampliação”, diz a presidente da Sbteim.

Para começar a resolver o problema, a entidade realizou, a pedido do Ministério da Saúde, um levantamento sobre a situação da triagem neonatal pública no Brasil. A ideia é dar dimensão ao problema que precisa ser resolvido antes de ampliar a capacidade do teste. Helena explica que o governo atual está tentando entender o que aconteceu nos últimos anos para reestruturar a rede.

A geneticista considera que o principal gargalo no momento é o financiamento. Para a consultora, o governo sequer tem verba disponível neste ano para reestruturar o programa. Por enquanto, é hora de “arrumar a casa”, segundo Helena.

O teste do pezinho ampliado

Especialistas em triagem neonatal apontam ainda que os exames escolhidos para fazer parte do teste do pezinho ampliado que será oferecido pelo SUS também não foram discutidos com a comunidade científica.

Muitos dos laboratórios municipais e estaduais, por exemplo, sequer têm a tecnologia necessária para fazer a análise requerida para algumas da condições. A impressão é que a escolha foi feita baseada no que laboratórios particulares conseguem oferecer.

“Não é para ser uma lista de supermercado. A lei é falha porque a cada doença nova, é preciso estudar qual é o impacto. Não teve estudo técnico”, afirma Helena.

A especialista lembra que, apesar de se falar muito na dificuldade de alguns estados, o plano funciona bem, sim, em algumas unidades federativas. O Distrito Federal, Bahia e a cidade de São Paulo, por exemplo, conseguiram implementar a triagem ampliada, oferecendo acolhimento e tratamento adequados ao paciente. Porém, são excessão.

Cartilha de informações básicas sobre o teste

Na tentativa de conscientizar inclusive as famílias sobre a importância de levar o recém-nascido para a coleta do teste do pezinho tradicional, a Sbteim lançou, durante o Congresso, uma cartilha que explica, em termos simples, a importância do exame. O caderno também conta com um glossário para simplificar a linguagem complicada típica de exames genéticos.

“Eu já ouvi mães questionando o por quê de precisar furar o bebê delas. Muitas são carentes, não têm carro, moram longe do posto de coleta, e acabam não levando o recém-nascido dentro da janela recomendada. A cartilha vem para preencher uma falta de educação continuada inclusive para os profissionais de saúde da atenção básica”, comenta Tania.

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