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Embaixador de Israel espera “solução pacífica” para conflito na Cisjordânia

Daniel Zonshine, embaixador de Israel no Brasil, comentou a escalada do conflito no país em entrevista ao Metrópoles

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Eyal Warshavsky/SOPA Images/LightRocket via Getty Images
mulher olhando para fora da porta na cisjordania
1 de 1 mulher olhando para fora da porta na cisjordania - Foto: Eyal Warshavsky/SOPA Images/LightRocket via Getty Images

O governo de Israel pode estar diante da “tempestade perfeita” em meio à escalada da violência registrada no país desde o início deste ano. O conflito com os palestinos, na Cisjordânia, ganhou força devido à indignação popular por causa da reforma judicial proposta pelo primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu. Manifestantes foram às ruas protestar contra a medida nos últimos 10 finais de semana.

As duas situações convergem em um ponto central: a política conservadora do governo Netanyahu. Apesar da conjuntura, o embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zonshine, afirmou ao Metrópoles que a expectativa é de uma “solução pacífica” para o cenário turbulento no país.

“Esperamos que a situação se acalme nos próximos meses e que seremos capazes de discutir o futuro da área [Cisjordânia] e chegar a uma solução pacífica”, declarou.

A escalada de tensão atingiu o ápice em 26 de fevereiro, após um ataque a tiros em Huwara (veja no mapa abaixo) ter vitimado dois israelenses. O episódio acendeu uma faísca na Cisjordânia ocupada, poucos dias após o governo de Israel aprovar nove assentamentos de colonos no território, cumprindo a promessa de Benjamin Netanyahu de expandir a presença na região.

A medida contraria resolução do Conselho de Segurança da ONU, aprovada em 2016, que pediu o fim de assentamentos israelenses em territórios palestinos por violar a lei internacional e dificultar a solução do impasse entre Israel e Palestina. Neste ano, 67 palestinos foram mortos no conflito, início de ano mais violento desde 2000, informou o Ministério da Saúde palestino.

Questionado sobre piora nos índices de violência na região, o embaixador Zonshine avalia que a situação foi agravada pelo “enfraquecimento da Autoridade Palestina”.

“Sim. Estão acontecendo mais ataques contra cidadãos israelenses, inclusive tiroteios, apedrejamentos etc., que resultaram em 14 mortes, mais as mortes entre os palestinos. Tudo isso tem a ver com o enfraquecimento da Autoridade Palestina (AP), que obrigou as forças de segurança israelenses a agirem contra tentativas terroristas em lugares populosos”, avaliou.

No entanto, o embaixador da Palestina no Brasil, Ibrahim Alzeben, defendeu que esta é a ação “mais sangrenta e racista” desde a ocupação do território por Israel.

“Os colonos invasores, com o apoio do Exército, atacam aldeias palestinas e queimam casas e carros, como aconteceu em aldeias próximas à cidade de Nablus, também com o apoio público de ministros do atual governo. Inclusive, um deles solicitou que o governo destrua completamente a vila de Hawara“, frisou o embaixador palestino.

Instabilidade social e política

Em meio ao conflito que se arrasta por décadas, misturando política e religião com a Palestina, o governo de Israel enfrenta dois eventos intrincados, que aconteceram quase ao mesmo tempo. Na Cisjordânia, a morte de dois irmãos israelenses em um atentado terrorista no trânsito de Hawara levou à indignação de assentados na região.

Na ocasião, centenas de colonos invadiram cidades armados com objetivo de atacar a população local em retaliação a um ataque ocorrido horas antes, de um palestino contra um israelense.

O episódio faz parte de um enredo maior envolvendo o governo do primeiro-ministro, popularmente conhecido como Bibi. O premiê também patrocina uma série de reformas, entre elas, uma que tenta diminuir os poderes da Suprema Corte do país. Na prática, o Judiciário ficaria impedido de barrar leis inconstitucionais, se essa for uma decisão aprovada pelo Legislativo.

Há, ainda, a proposta de tentar aumentar o número de cadeiras de 15 para 18. O receio é de que as novas normas afetem a democracia do país.

“Muitos cidadãos israelenses estão preocupados com as mudanças significantes planejadas para o sistema judiciário. Eles acreditam que vai interferir no equilíbrio entre o Judiciário e os outros poderes, e também com a forma rápida com que a mudança está sendo conduzida”, afirmou o embaixador de Israel.

A medida tem levado milhares de cidadãos às ruas de Tel Aviv, em semanas de protestos contra a proposta de reforma do Judiciário. A estimativa é que os protestos do último sábado (11/3) tenham sido os maiores da história do país. Na data, 500 mil pessoas foram às ruas, em diferentes cidades – especialmente, Tel Aviv – contra as mudanças políticas no regime Netanyahu.

protestantes contra policiais israelenses
Policiais seguram barreiras conta manifestantes nos protestos em Tel Aviv, Israel, em março.

Arranjo político

Michel Gherman, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e assessor acadêmico do Instituto Brasil-Israel (IBI), acredita que a situação política do país pode representar risco à democracia.

“Israel está entrando num colapso político, pois a direita e a esquerda deixaram de existir. Existe um projeto político de Bibi e da extrema-direita”, declarou. “E a extrema-direita tem um projeto anti-palestino e de anexação de territórios”, completou.

A configuração política de Israel também corrobora com o cenário. Netanyahu escolheu Itamar Ben-Gvir como ministro da Segurança Nacional. O político é criticado pelas posições extremas contra palestinos, inclusive dentro do Knesset, parlamento israelense, quando era congressista.

Sob a gestão Netanyahu, a presença de Israel continua a crescer na Cisjordânia ocupada. As conversas com palestinos foram relegadas a um segundo plano nas gestões anteriores do premiê, inclinação mantida no novo governo.

“A AP é um parceiro para a paz em Israel, mas esse braço hoje está enfraquecido. Isso fortalece radicais como o Hamas e o Jihad Islâmico”, disse Gherman. “Bibi prefere negociar com quem não quer fazer acordo com Israel, o Hamas, do que com quem quer, a Autoridade Palestina”, explicou o professor Gherman.

Brasileiro e morador de Israel há oito anos, Eitan Gottfried, 28 anos, descreveu que o clima na região é de estresse tanto do ponto de vista social quanto político. Contudo, avalia que retaliações como a que ocorreu na Cisjordânia são pontuais.

“É raro um ataque de colonos israelenses contra palestinos por retaliação. Há ataques do Exército e de radicais, mas a cena de queimar carros e prédios, isso é raro, ver cidadãos querendo vingar um atento terrorista, isso dificilmente acontece”, contou.

“A realidade na Cisjordânia é complexa. Convivemos com ela, concordando ou não, mas lá tem a presença de colonos e palestinos. E outra: não sabemos para qual time a AP joga, e o Exército estressa mais aquele ambiente complexo”, destacou. “Quando se tem ataques em que morrem israelenses, há uma dor muito grande e se questiona a segurança [do país] e seus níveis”, acrescentou.

Veja as zonas de conflito no mapa:

Mapa de Israel Cisjordânia / Metrópoles
Mapa de Israel-Cisjordânia / Metrópoles

Protestos contra o “rei Bibi”

Netanyahu voltou ao poder pela terceira vez em 29 de dezembro de 2022, apenas um ano após deixar a cadeira de premiê. Ele ocupou o cargo de 1996 a 1999; de 2009 a 2021; e, agora, desde o fim de 2022. Com a popularidade até então alta, o “rei Bibi”, como foi chamado pela imprensa internacional no ano passado, vem sendo desidratado pela reprovação da população devido aos recentes acontecimentos.

Para se eleger, Netanyahu se uniu com partidos da extrema-direita e ultrarreligiosos. “Essa coalização entrou no poder para transformar Israel em um país complexo e cheio de contradições — mas até então democrático — em outro não democrático. Os manifestantes não têm um lado muito definido [direita ou esquerda], mas são pessoas contrárias ao projeto de Bibi”, afirmou Michel Gherman.

“É possível ver bandeiras palestinas nas ruas, que podem ser árabes israelenses, israelenses a favor do Estado Palestino e até provocadores”, completou.

Veja protestos em Tel Aviv

 

 

De acordo com um pesquisa de popularidade divulgada pelo canal 12 de Israel, em 1º de março, a popularidade de Netanyahu nunca foi tão baixa desde os anos 1990. A amostragem aponta para uma rejeição de 62% ao seu governo. Até 71% rejeitam a segurança na figura de Itamar Ben-Gvir, ministro da Segurança Nacional, e 59% reprovam o chefe de governo.

pesquisa de popularidade Netanyahu / Reprodução

Pesquisa de popularidade Netanyahu / ReproduçãoSegundo o brasileiro Eitan Gottfried, Netanyahu chegou a ir a uma rede nacional para tentar “tranquilizar” a população, mas “escolheu as palavras erradas” para falar sobre os protestos e a Cisjordânia. “No discurso, ele quis acalmar, só que comparou as manifestações em Tel Aviv com o ato de queimar carros [como o ocorrido na Cisjordânia]”, disse.

“Não aceitaremos violência em Huwara, e não aceitaremos violência em Tel Aviv”, disse o premiê em pronunciamento oficial em 1º de março.

A situação deve se intensificar conforme o tempo passa. Entre 22 de março e 20 de abril, ocorre o Hamadã, o período mais sagrado para o Islã. “Estamos perto do mês do Hamadã, e este é um período complicado, porque aumentam os alerta, para a violência de extremistas”, declarou Gottfried.

Agenda ocidental

O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) convocou uma reunião de emergência no dia seguinte aos ataques de colonos na Cisjordânia, na última semana. Este foi o terceiro encontro com caráter de urgência do órgão da ONU desde o estabelecimento do novo governo de Benjamin Netanyahu, há três meses.

A reunião a portas fechadas foi solicitada pela embaixadora dos Emirados Árabes Unidos — representante da Liga Árabe no Conselho de Segurança —, após apelo formal apresentado pela Missão Palestina às Nações Unidas, e ocorreu na mesma data em que Benjamin Netanyahu afirmou que a construção de novos assentamentos israelenses na Cisjordânia ocupada não será interrompida.

Na mesma semana, Netanyahu participou de uma reunião de paz com a Autoridade Palestina – diante de mediadores, entre eles, Egito e Emirados Arabes Unidos, foi anunciado o compromisso de ambas as partes “para uma paz justa e duradoura” nas regiões de conflito.

A convergência dos dois cenários em território israelense, na visão do professor de direito internacional Salem Nasser, da Fundação Getulio Vargas (FGV), também demonstra as prioridades da agenda ocidental em relação aos conflitos no Oriente Médio. Na visão do especialista, muitos líderes ocidentais estão mais preocupados com um possível enfraquecimento da democracia do que com a violência contra a população da região.

“Há quem se sensibilize mais com a possibilidade de que a democracia se enfraqueça do que com a situação de colonos que estão desalojando e promovendo um ‘Apartheid’ sobre os palestinos. Trata-se do que interessa dizer sobre Israel e Palestina e o que não interessa dizer”, avalia.

A reportagem entrou em contato com a Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), mas não obteve resposta. O espaço segue aberto para eventuais manifestações.

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