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Cheque em branco: GDF pede aval a distritais para dar ações de empresas públicas como garantia em parcerias com grupos privados

Autorização está prevista em projeto que trata de outro assunto. “É como se o governo estivesse hipotecando seu patrimônio”, diz professor da UnB

atualizado

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Daniel Ferreira/Metrópoles
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1 de 1 69511eb1-bd2e-4b86-9e9e-a0cd2ad007a7 - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

O Governo do Distrito Federal está disposto a abrir mão de terrenos e do controle acionário de suas principais empresas para garantir as parcerias público-privadas. Isso quer dizer que, caso não cumpra com as obrigações previstas em contratos firmados com a iniciativa privada, poderá transferir suas ações de empresas como a CEB, BRB e Terracap para honrar os acordos.

O que chama a atenção é que a autorização para transferir essas ações está prevista no Projeto de Lei 738, enviado à Câmara Legislativa, que trata de outro assunto. Mais precisamente da desafetação de áreas públicas que possam ser vendidas para reforçar o caixa do Governo do DF. O projeto tem 14 artigos e apenas um deles diz respeito ao aval para que as ações sejam dadas como pagamento a grupos privados.

*Reprodução**
Artigo que trata da transferência das ações*Reprodução/Arte**

 

De acordo com a proposta, a participação acionária comporia o Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas (FGP) do DF. A norma, entretanto, não restringe o percentual de ações que podem ser dadas como garantia nem define de quais empresas públicas, já que inclui as em processo de liquidação e aquelas não controladas 100% pelo GDF.

Daiane Souza/UnB Agência
Piscitelli alerta que distritais precisam estar atentos à proposta do GDF*Daiane Souza/UnB Agência**

“É assinar um cheque em branco. O governo pode alegar dificuldade financeira, que precisa de recursos, e entregar o patrimônio.”, avalia o professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB) Roberto Piscitelli. Para ele, se o controle acionário dessas empresas for colocado como caução ou garantia, é como se o GDF “estivesse hipotecando seu patrimônio, voltando no tempo e admitindo que pode vender até banco.”

O economista estranha, também, o fato de a proposta estar contida num projeto que trata de outro assunto: “Me parece fora de propósito e fico extremamente preocupado. Imagino que os deputados devam olhar com olhos de lince, para, no mínimo, preservar o patrimônio.”

Centro Administrativo
A principal Parceria Público-Privada (PPP) no DF atualmente é a construção do Centro Administrativo, em Taguatinga, comandada pelo consórcio formado pela Via Engenharia e Odebrecht. O contrato entre os dois grupos e o GDF é válido por 22 anos, a partir do momento em que for feita a ocupação do espaço. Durante esse tempo, o governo deve pagar cerca de R$ 17 milhões mensais ao consórcio.

Caso atrase parcelas ou não consiga pagar, as garantias do FGP serão utilizadas para arcar com a dívida. E, se o projeto for aprovado, as construtoras poderão ter participação acionária nas empresas públicas do DF, entre elas a Terracap, que administra todo o patrimônio imobiliário do Distrito Federal.

Governo explica
A justificativa do GDF para o projeto é a estruturação e liquidez do fundo garantidor. O secretário-adjunto de Planejamento, Renato Brown, nega que seja uma manobra para privatização das empresas. “Está longe disso, já que a participação será minoritária, sem transferência de controle acionário. Na hipótese de o governo não conseguir pagar, isso é vendido no mercado. Essa medida coloca mais confiança aos parceiros de PPPs para aceitarem o fundo como garantia”, justificou.

Segundo ele, num primeiro momento, apenas CEB e BRB entrarão no fundo. “Estamos colocando apenas o limite acionário. Do BRB, que o governo tem 95%, seriam, no máximo, 44%. Na CEB, dos 73% das ações, seriam 20%”, detalhou Brown. Esses limites, entretanto, não constam no projeto enviado à Câmara Legislativa.

Ainda não há prazo para o projeto ser levado à votação no Plenário da Câmara Legislativa. A presidente da Casa, deputada Celina Leão (PDT), explicou que propostas que apresentam divergências ou temas polêmicos precisam ser debatidas amplamente nas comissões. “É a oportunidade para que todas as dúvidas sejam tiradas e, nesse caso, que representantes das empresas públicas sejam ouvidos”, explicou.

Celina também ressaltou que há dúvidas sobre a formatação da proposta. “São temas diferentes que deveriam vir em projetos diferentes. Estamos discutindo isso e podemos até fazer a votação em destaque de emenda”, completou.

Segunda tentativa
Não é a primeira vez que o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) pede autorização para abrir mão das ações do GDF. No primeiro semestre, ele enviou aos deputados distritais projeto para vender até 49% de participação no controle acionário das empresas públicas. Com isso, esperava arrecadar cerca de R$ 2,5 bilhões. A proposta foi rechaçada por representantes de sindicatos dos servidores e pelos parlamentares, sendo retirada de pauta.

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