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Grande Colorado: associação orienta moradores a esperarem conciliação na Justiça antes de acordo

Em carta, entidade diz ainda que os residentes devem participar de manifestações contra “investidas ilegais e abusivas” da Urbanizadora

atualizado

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Fazenda Paranoazinho
1 de 1 Fazenda Paranoazinho - Foto: null

A Associação dos Moradores do Grando Colorado, Boa Vista e Contagem (AMGC) divulgou uma carta nessa segunda-feira (22/07/2019) na qual orienta os condôminos a esperarem decisões judiciais antes de firmarem qualquer acordo com a Urbanizadora Paranoazinho.

Enquanto aguardam, sugere a AMGC, os residentes devem participar das manifestações para que “a empresa, a sociedade e a mídia reconheçam mobilização e força contra as investidas ilegais e abusivas da empresa, que tenta fazer os moradores pagarem novamente pelo que já compraram, abrindo mão das áreas comuns dos condomínios”.

O valor cobrado em edital de regularização, conforme a associação, “nada mais é” do que uma segunda aquisição das mesmas terras adquiridas antes. O preço médio do metro quadrado é previsto em R$ 120. Segundo o presidente da AMGC, Carlos Cardoso, o grupo que ocupa a área “está bastante apreensivo”. “A empresa tem usado de ameaças, de informações que não são verdadeiras, dizendo que muitas pessoas já aderiram, enquanto a maioria não concorda”, assinalou.

A entidade cita decisão de sexta-feira (15/07/2019), na qual o juiz do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) Carlos Frederico Maroja de Medeiros indicou que nada impede aos residentes de se recusarem a firmar a aquisição nos termos oferecidos pela empresa, podendo seguir mediante negociação ou via demanda judicial.

30 mil moradores

Hoje, vivem nessas terras do Grande Colorado, que equivalem a duas vezes o tamanho do Guará, 30 mil moradores distribuídos por 54 condomínios. Na maioria das negociações, os lotes foram adquiridos entre as décadas de 1980 e 1990. 

O edital questionado por moradores tem como base mediação conduzida pelo Governo do Distrito Federal (GDF), iniciada em janeiro e que teria sido concluída em uma reunião de 31 de maio de 2019.

“Quando nós fomos chamados para acompanhar a mediação, chamava-se o valor de despesa para regularização. Iria ser só realmente custo de compensação ambiental, eventuais urbanísticas, e, agora, como mostra o contrato, tenta transformar o valor de regularização na compra da propriedade”, acrescentou a advogada da AMGC, Maria Olímpia, que também defende 14 condomínios em ações de usucapião em andamento na Justiça. 

Conforme noticiou o Metrópoles em 12 de julho, desde que o governo chancelou e publicou as regras para o pagamento das glebas à Urbanizadora Paranoazinho, os moradores passaram a sofrer pressão constante de funcionários da empresa interessada no negócio.

Muitos relatam receber, em um só dia, dezenas de ligações de representantes da administradora. Nas conversas, os agentes fazem um trabalho maçante no sentido de convencer o grupo de que, caso não se renda à conciliação, corre o risco de perder as terras.

Os canais de pressão são variados: os avisos chegam por cartas, e-mails, carros de som e até mesmo em eventos. Munidos de megafones, os porta-vozes da Paranoazinho propagam a ideia de que os moradores não podem perder a chance de “legalizar” seus lotes.

A empresa preferiu não se manifestar sobre a carta.

Conciliação

Ao recusar liminar requerida por três condomínios para anular o edital que contém as regras para o negócio, o juiz marcou audiência de conciliação entre a empresa, os moradores e o GDF. No último dia 16, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) informou que, “diante da complexidade” envolvendo a regularização do Grande Colorado, tem recebido manifestações por meio da Ouvidoria ou em contato pessoal nas quais cidadãos dão seus relatos sobre o processo. Na maior parte dos casos, o órgão nada pode fazer, visto que é uma briga entre particulares.

A Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb) tem atendido os moradores e avaliado individualmente cada situação. Em nota, a unidade informou existirem também ações judiciais que chegam para pronunciamento ministerial.

Entenda

Os documentos revelados pelo Metrópoles mostram que os residentes do Grande Colorado, em sua maioria, compraram e pagaram pela terra vendida por Tarcísio Márcio Alonso, que chegou a ser condenado e preso por grilagem de terras no Distrito Federal e em São Paulo. Apontam, ainda, que ele revendeu os mesmos quinhões para a atual Urbanizadora Paranoazinho, uma sociedade anônima criada exclusivamente para gerir o bilionário negócio, cuja participação dos empresários José Celso Gontijo e Rafael Birmann veio à tona.

O GDF entrou na história quando o atual governador, Ibaneis Rocha (MDB), conduziu uma tentativa de conciliação em que, publicamente, defendeu o pagamento à administradora. Chegou a se exaltar com os síndicos inconformados diante dos valores propostos pela Urbanizadora Paranoazinho, de, em média, R$ 120 o metro quadrado.

O governo, inclusive, disponibiliza linha de crédito do Banco de Brasília (BRB) para financiar em até 100% a dívida dos residentes da localidade.

Desde que o GDF chancelou e publicou as regras para o pagamento das glebas à Urbanizadora Paranoazinho, os ocupantes que ainda não aderiram ao acordo têm sido pressionados constantemente por funcionários da empresa interessada no negócio, que pode render lucro de R$ 12 bilhões.

O que diz a Urbanizadora Paranoazinho

Embora não tenha se manifestado sobre a carta dos moradores e a respeito do fato de a Justiça ter determinado a realização de audiência de conciliação, no último dia 11, data da primeira reportagem mostrada pelo Metrópoles, Ricardo Birmann, presidente da Urbanizadora Paranoazinho, afirmou que a empresa sempre atuou com “responsabilidade, transparência e preocupada com a segurança jurídica”. “Desde que assumimos, temos uma postura de muito rigor. A área estava imersa neste universo de insegurança. Iniciamos o maior processo de regularização fundiária da história”, pontuou.

Birmann reconheceu a participação de José Gontijo no quadro societário da urbanizadora, mas nega a interferência de Tarcísio nos negócios. “Ele tem dinheiro a receber, mas não participa ativamente das decisões”, explicou.

A Urbanizadora Paranoazinho também informou, por meio de nota, que “Tarcísio Márcio Alonso, assim como cerca de 60 outros herdeiros, advogados e cessionários, tinha direitos ao espólio de José Cândido de Sousa, antigo proprietário das terras que compõem a Fazenda Paranoazinho. A partir de 2008, a UP negociou e adquiriu toda a área por meio de inúmeras negociações com esses diferentes herdeiros/cessionários, sempre tomando as precauções legais, sempre por escrituras públicas e sempre com registro em cartório de registro de imóveis”.

O que diz a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação

Também por meio de nota enviada no último dia 11, a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) sublinhou que “o quadro societário da empresa trata-se de matéria de cunho exclusivamente relacionado à Urbanizadora, sobre o qual à secretaria não cabe qualquer juízo, competindo-nos tão somente, nessa fase, a continuidade na análise e aprovação dos projetos urbanísticos a serem encaminhados com base nos critérios estabelecidos entre os particulares envolvidos”.

Sobre a participação do governo na negociação entre terceiros, a pasta destaca ter realizado “a mediação do conflito fundiário que já durava mais de uma década, entre a UPSA e os moradores da região, garantindo a participação de quaisquer interessados em todas as reuniões realizadas, buscando sempre uma solução para a questão fundiária, sobretudo com vistas à efetiva regularização da região”.

“Por fim, importante ressaltar que a adesão à proposta apresentada pela Urbanizadora Paranoazinho não é obrigatória, tratando-se de faculdade dos moradores para que, além de encerrar a discussão quanto à propriedade, a empresa assuma todos os custos inerentes ao processo de regularização legalmente estabelecido, incluídos todos os estudos e compensações necessários, como ambiental e urbanístico, bem como as obras de infraestrutura mínimas previstas para a região e ainda não executadas”, conclui o texto.

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