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Fraude em programa habitacional do DF sustentava “negócio de família”

Investigações após Operação Clã apontam que parentes de Rafael Oliveira, ex-secretário adjunto de Habitação e ex-presidente da Codhab, conseguiram vantagens no programa Minha Casa, Minha Vida. Polícia ainda apura se houve conivência do ex-secretário Geraldo Magela

atualizado

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Daniel Ferreira/Metrópoles
riacho fundo
1 de 1 riacho fundo - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

Com o objetivo de esclarecer o funcionamento de uma organização criminosa suspeita de interferir e cobrar taxas para a concessão de lotes do Programa Habitacional Riacho Fundo II – 4ª Etapa, a Polícia Civil deflagrou, no início do mês, a Operação Clã. O clã em questão é a família do ex-presidente da Codhab Rafael Carlos de Oliveira. Documentos exclusivos obtidos pelo Metrópoles mostram que o pai, Carlos Roberto e a irmã dele, Daniela Kely, teriam encabeçado o esquema milionário de grilagem de terras, por meio da Associação Pró-Morar do Movimento Vida de Samambaia (AMMVS). O grupo teria agido por mais de cinco anos. O lucro obtido ainda é contabilizado. Além da venda irregular de lotes, eles atuariam na captação de votos para políticos.

A polícia ainda investiga se os suspeitos tiveram auxílio de servidores ou até mesmo do ex-secretário de Regularização e Desenvolvimento Urbano do Distrito Federal Geraldo Magela (PT). Um dos fatos que causou estranheza aos investigadores foi um termo aditivo assinado pelo petista, em 2013, que deu plenos poderes às associações de moradia popular. Além de ter o terreno no Riacho Fundo 2, a AMMVS, que reúne 206 filiados, recebeu autorização para escolher os beneficiados pelo programa Minha Casa, Minha Vida. A associação também tinha autonomia de fiscalizar o processo.

Cada integrante do esquema desempenhava um papel definido. O modo de operar da família, segundo os delegados que apuram o caso, é semelhante ao de uma organização criminosa. Em 2006, a AMMVS conseguiu um terreno de 1.334.600m², repassado pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU) para construir 5 mil habitações. Embora os documentos oficiais apresentem Antônio Francisco Barbosa como presidente da entidade, o pai de Rafael era um dos diretores mais atuantes, aponta o inquérito.

Carlos Roberto era também o dono da Luppha Construções, empresa responsável por erguer as casas no setor habitacional. Ao lado dele, atuava a filha, Daniela Kely de Oliveira. Segundo a denúncia analisada pela polícia, ela era uma espécie de corretora, intermediava as vendas de lotes que deveriam ser financiados pela Caixa Econômica Federal. As terras eram repassadas mediante o pagamento de R$ 30 mil.

Os interessados arcavam R$ 120 mil em espécie. Esse dinheiro era usado para construir as moradias. O esquema foi tão lucrativo que a Luppha precisou aumentar a equipe de funcionários. O número de contratados saltou de dois para 60, um quadro de pessoal 30 vezes maior. Mesmo assim, teve de pedir ajuda para outras duas empresas para dar conta do serviço: a Direcional Engenharia e a CN Construtora. O contrato de cooperação foi publicado pelo próprio site da associação, em 2012.

As casas construídas estariam na QN 19 e QN 20. Os carros nas portas das residências denunciam o poder aquisitivo dos moradores. Vão de Civic a Land Rover. Realidade difícil de imaginar para uma família que, para se encaixar no programa, precisa ter rendimento de até R$ 3.275.

Reprodução

Denúncias
Em 2009, um dos denunciantes do esquema registrou o caso no Tribunal de Contas do DF, no Ministério Público, na Polícia Civil, na Secretaria de Transparência e Controladoria Geral da União. A denúncia que deu origem à Operação Clã foi feita em 5 de dezembro de 2013. Em março do ano seguinte, houve a abertura do inquérito.

O pagamento de propina permitia que pessoas furassem a fila da Codhab. Os valores, à época, variavam de R$ 8 mil a R$ 12 mil. O Metrópoles também teve acesso a uma investigação que aponta o ex-chefe de gabinete da Administração Regional do Riacho Fundo 2 Francisco Gilvan Pereira da Silva como o intermediador das negociações. Em um dos casos, ele cobrou R$ 12 mil, divididos em R$ 8 mil para a construtora e R$ 4 mil de reembolso. No entanto, o possível “beneficiado” nunca viu o lote.

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Três meses
Ao contrário do denunciante que não viu os R$ 12 mil se converterem em uma vaga no programa habitacional, a irmã do ex-secretário e ex-presidente da Codhab, Daniela Kely de Oliveira, foi beneficiada com um lote no Riacho Fundo 2. Ela declarou uma renda familiar de R$ 1 mil, entrou na fila e, em três meses, conseguiu ser chamada. As polícias Civil e Federal investigam se Daniela recebeu, mora ou vendeu o lote.

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Respostas
No dia 3 de junho, Rafael de Oliveira usou o Facebook para desabafar. Disse que a polícia recolheu em sua casa um computador, dois notebooks e dois celulares, de propriedade dele e de sua mulher. Afirmou que prestou esclarecimentos voluntariamente. No entanto, havia um mandado de condução coercitiva (quando a pessoa é obrigada a depor) em nome dele.

“Esclareço que, no ano de 2014, eu já havia prestado depoimento na mesma investigação. O mesmo tema foi motivo de investigação em 2011 pela Secretaria de Transparência e Controle do Governo do Distrito Federal (STC/GDF) e pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), oportunidades nas quais prestei todos os esclarecimentos”, disse.

O ex-presidente da Codhab afirmou ainda que “o processo de seleção dos beneficiários é realizado pelas entidades, não cabendo ao GDF nenhum tipo de indicação”. Vale lembrar que a investigação aponta o pai e a irmã dele como diretores da AMMVS. Coincidência ou não, em 2014, Rafael doou R$ 20 mil à campanha de Geraldo Magela ao Senado .

Reprodução/TSE
Segundo a assessoria de imprensa de Magela, que assina nota publicada nas redes sociais, as suspeitas não estão em conformidade com a realidade. “Todas as ações empreendidas pelo ex-secretário e pela equipe da Sedhab foram no sentido de moralizar o projeto. São absurdas quaisquer conclusões em sentido diferente deste”, disse.

“Não é responsabilidade da Sedhab a contratação de empresas construtoras ou a definição dos associados das cooperativas. De acordo com o convênio, tais responsabilidades são das cooperativas participantes do consórcio”, informa a nota, que destaca ainda que o ex-secretário prestou todas as informações solicitadas aos policiais.

A reportagem checou ainda a situação da empresa Luppha Construções. Na Receita Federal, ela continua ativa. No entanto, o telefone fornecido no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica é de um escritório de contabilidade localizado no Setor de Rádio e TV Sul. A atendente informou que a empresa é cliente do escritório e informou um novo telefone para o contato com a Luppha. O número informado, no entanto, era da AMMVS.

Geraldo Magela foi procurado pelo Metrópoles, mas não atendeu às ligações. Os integrantes da Luppha Construções também não responderam às tentativas de contato. A Direcional tem dois telefones, um em Brasília, outro em Minas. Os dirigentes estavam em reunião quando a reportagem ligou. Rafael Oliveira não foi encontrado para comentar os fatos.

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