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Fiel diz que padre Casemiro contou em missa que se sentia ameaçado

Religioso afirmou ainda que estava cansado e mostrou-se preocupado com a violência na Asa Norte

atualizado

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Myke Sena/Especial para o Metropoles
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1 de 1 Velorio-padre-Casemiro-31 - Foto: Myke Sena/Especial para o Metropoles

Pouco antes de ser assassinado, Padre Kazimerz Wojno, ou Casemiro, 71 anos, celebrou missa na Paróquia Nossa Senhora da Saúde, na 702 Norte. Um dos fiéis presentes sentiu um “clima estranho”. De acordo com ele, durante a homilia, o pároco disse que estava cansado e “as circunstâncias em que se encontrava iriam levá-lo à morte”. Comentou ainda que o religioso se sentia ameaçado e que, durante a cerimônia, falou sobre os assaltos que estavam ocorrendo na região.

Marlene Barroso, 77, foi uma das últimas a ver o padre Casemiro com vida. Ela conta que avisou ao pároco que já havia fechado a Igreja e iria para casa, no sábado (21/09/2019) à noite. Ele então chamou o caseiro para ajudá-lo na obra que fica nos fundos da paróquia e dona Marlene seguiu para sua residência. “Parece que estou sonhando, fora da realidade. Eu e meu marido trabalhamos com ele por 35 anos. Era muito amável, uma pessoa muito boa. Vou sentir muita falta”, lamentou.

Padre Casemiro morava nos fundos da Paróquia Nossa Senhora da Saúde. “Duas palavras o descrevem: dócil com todas as pessoas que o procuravam e firme contra exatamente o tipo de pessoa que fez essa barbaridade com ele”, contou um dos fiéis. “Ele era um pai para mim”, acrescentou o paroquiano, após deixar uma flor no caixão do religioso.

Padre Casemiro chegou a Brasília em 16 de fevereiro de 1984 e assumiu a Paróquia Nossa Senhora da Saúde um ano depois. O padre Júlio César, 47, tinha 12 anos quando conheceu o pároco. “Ele era uma pessoa séria, ao mesmo tempo muito acessível. Muito determinado, responsável. Quem se aproximava dele, sabia o quanto era acolhedor”, afirmou.

Na missa de corpo presente da tarde desta segunda, o cardeal dom Sérgio da Rocha, arcebispo de Brasília, disse que o sentimento é de dor e pesar. “A partida de pessoas que amamos é sempre dolorosa, mas a dor é ainda maior quando a morte ocorre de maneira tão brutal. Vindo da Polônia, sua terra natal, ele escolheu Brasília para ser sua casa. Aportuguesou seu nome, não somente pela pronúncia difícil para nós, mas porque quis sentir-se ainda mais parte de nós sem perder as raízes, conservadas em seu sotaque inconfundível. Por isso, nós sentimos sua morte como uma família sente a perda de um pai ou um irmão”, assinalou.

Imagens do velório:

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Padre Casemiro foi vítima de uma emboscada no momento em que fiscalizava uma obra nos fundos da paróquia. Os bandidos também deixaram o caseiro amarrado. “Eles amarraram muito forte o arame, que estava todo torcido. Assisti ao policial tentando tirar, porque estava muito difícil”, conta uma das testemunhas, que chegou com a polícia ao local. Ela diz que o caseiro José Gonzaga da Costa foi criado pelo pároco desde os 16 anos. Após ser libertado, teria dito, ainda segundo a testemunha: “Pai, você me deixou”.

Testemunhas disseram que o caseiro estava com a boca cheia de plástico, também com braços e pernas amarrados. Chegaram a pensar que ele estava morto.

José participa da despedida do padre na Igreja, mas não falou com a imprensa até o momento. Segundo uma amiga dele, que não quis se identificar, o homem contou o que padre Casemiro teria dito no momento em que os bandidos amarraram ambos. “‘Não faz isso, não faz isso‘. Essa frase não sai da cabeça dele.”

“É uma tragédia o que aconteceu. Prestamos apoio à família e à comunidade, que rezem muito por paz e possam ser confortados”, disse o governador Ibaneis Rocha (MDB), que foi à missa de corpo presente do pároco pela manhã. Segundo o chefe do Executivo local, o padre Casemiro deve ser lembrado como exemplo de dedicação e trabalho, pelos serviços que prestou à comunidade. “Agora, vamos focar em reforçar a segurança no DF”, destacou.

Ibaneis disse que, apesar de os índices de violência terem caído, ainda há muita sensação de insegurança no Distrito Federal. Ressaltou ainda que assaltos a paróquias têm ocorrido com frequência, principalmente na Asa Norte. A própria Paróquia Nossa Senhora da Saúde já tinha sido alvo de bandidos. “Nós precisamos aumentar o efetivo da polícia e colocar mais viaturas circulando por essas áreas. Só assim as pessoas se sentirão mais seguras”, afirmou o governador.

A Polícia Civil afirma já ter nomes de suspeitos de participação no assassinato do padre Casemiro. Segundo o delegado Laércio Rosseto, as identidades não serão reveladas para não atrapalhar as diligências. Desde o início da tarde desse domingo (22/09/2019), os investigadores colhem depoimentos de envolvidos, testemunhas e do caseiro do templo, que foi mantido refém pelos bandidos juntamente com o pároco.

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De acordo com a polícia, a casa tinha cofres modernos e os criminosos estavam preparados para arrombá-los. Sabiam onde estavam. “Tinha cofre de um metro e meio de altura”, pontuou. Os bandidos levaram uma “makita”, pé-de-cabra, barras e picaretas.

“As pessoas estão sendo ouvidas e as informações são conflitantes. Há pontos divergentes e que não estão ainda esclarecidos. Os suspeitos ouvidos podem não ter atuado diretamente no crime, mas sim de forma indireta. Ainda é cedo e precisamos ter cautela”, frisou Rosseto, durante o fim de semana.

A polícia tem imagens da movimentação dos suspeitos. Uma das gravações mostra o rosto de um investigado. O conteúdo ainda está sendo analisado e, por isso, mantido sob sigilo. Rosseto revelou que uma das linhas de investigação suspeita de moradores de rua da região. “Casemiro era uma pessoa muito austera e muito correta”, enfatizou. “Estamos checando se houve desavença com algum morador de rua”, completou.

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