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“Não existe autoridade em sala de aula”, diz irmã de professor morto

Júlio Cesar Barroso, 41 anos, foi assassinado dentro da escola onde trabalhava. Velório e enterro ocorrem nesta quinta (02/05/2019)

atualizado

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JP Rodrigues/Metrópoles
Irmã do professor morto
1 de 1 Irmã do professor morto - Foto: JP Rodrigues/Metrópoles

Colegas, familiares e amigos se reuniram nesta quinta-feira (02/05/2019) para dar o último adeus ao professor Júlio Cesar Barroso de Souza, 41 anos, assassinado a tiros por um aluno de 17 anos dentro da Escola Estadual Céu Azul, em Valparaíso (GO), no Entorno do Distrito Federal. O velório ocorreu na capela Divino Espírito Santo, em Santa Maria.

Muito emocionada, a viúva, Daiane Alves, 31, se manteve ao lado do corpo do marido dentro da igreja. A todo momento, recebia abraços de colegas de Júlio, que também estão muito abalados com a tragédia. “Eu fui uma das primeiras a chegar na sala e ver o corpo. Estou sem dormir, só pensando nisso”, relatou uma professora, que não quis se identificar.

A irmã do docente, Juliana Maria Lima do Carmo (foto em destaque), 35 anos, protestou contra a falta de segurança de quem ministra aula no Entorno do DF. “Ele foi morto porque exerceu a profissão dele. Não existe mais autoridade de professor em sala. A família nunca mais será a mesma”, desabafou.

“Meu irmão era a base da família, era um superirmão, superpai e superamigo: uma pessoa que  passou por este mundo só fazendo o bem”, lamentou Juliana.

O corpo do coordenador pedagógico foi levado da capela por volta de 11h20 sob aplausos. As homenagens prosseguiram no cemitério Campo da Esperança de Brazlândia, onde o sepultamento está marcado para as 16h.

Honesto e trabalhador
Júlio César é lembrado por familiares e amigos como honesto e trabalhador. Casado há 10 anos, deixou a esposa e dois filhos: uma menina de 4 anos e um menino de 6.

Era o segundo mais velho de cinco irmãos, e aos 4 anos de idade perdeu o pai. De acordo com parentes, Júlio César nunca conteve esforços para ajudar a família, seja com apoio emocional ou financeiro. Era atencioso apesar de sua saúde fragilizada devido a diabetes e gastrite.

Governo promete mais segurança
Em resposta ao crime, a secretária de Educação de Goiás, Fátima Gavioli, conversou com familiares da vítima e falou com a imprensa na porta da capela. Segundo ela, o regimento escolar será alterado para que diretores e coordenadores pedagógicos possam ter mais autonomia.

“Desde o início do ano, a secretaria está trabalhando com medidas de segurança. Além disso, um protocolo será lançado em breve”, garantiu.

Outro fator agravante listado por Gavioli é o muro da escola pulado pelo aluno. A proximidade da unidade de ensino com uma feira possibilitaria, segundo ela, o tráfico de drogas através de buracos no muro. A ordem dada à Polícia Militar, diz, é fechá-lo com grades de metal.

“O que fica é que precisamos organizar a escola para o retorno até dia 13. A PM vai garantir, no início, o policiamento, pois é uma escola com alto risco de violência. Nunca passamos por algo tão difícil e tão triste.”

A prima do docente morto Larissa Lima, 35, diz, também, que os filhos do casal ainda não entendem o que aconteceu. “Eles disseram que o pai deles agora é uma estrela e está brilhando no céu”.

Pânico
Uma professora, que não quis se identificar, relatou o pânico dentro da escola no dia do assassinato. “Ficamos com medo e nos trancamos na sala de aula. Os alunos colocaram cadeiras e mesas na porta e ficamos esperando. Falei para que eles saíssem da janela. Quando saímos, tinha gente desmaiada no pátio, passando mal. Foi um desespero.”

Também docente da unidade de ensino, Mateus Alves, 45, descreveu o coordenador como uma pessoa “pacata, tranquila, serena e equilibrada”. O enterro do corpo de Júlio será também nesta quinta, no Cemitério de Brazlândia.

“A escola terá que passar por uma transformação radical. A sala dos professores não tem condição alguma de permanecer onde está”, ressalta. Segundo Alves, o colégio ficará de ponto facultativo até dia 13 de maio.

Apesar da tragédia, Mateus espera transmitir uma mensagem de esperança a todos que atuam na profissão. “Meu recado para todos os professores é não desistir jamais, nunca deixar de acreditar na humanidade. Não é o primeiro episódio assim e não será o último, mas não deve trazer um desespero. O educar pesa mais do que todas essas dificuldades”, disse.

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A cerimônia do velório foi conduzida pelo padre Luiz Meire, que teve contato com Júlio Cesar durante a catequese. “Ele era fiel e assíduo nas atividades da igreja”, conta o pároco. “Eu disse à esposa dele para que ela ficasse tranquila e confiasse no Senhor”, acrescentou.

Alunos do Colégio Estadual Céu Azul também marcaram presença na homenagem, alguns vestidos de preto, em sinal de luto. Um colega de sala do estudante apreendido diz que “nunca imaginou que ele fosse chegar a esse ponto”.

Segundo o garoto de 17 anos, o suspeito de ter cometido o crime era calado e conversava com poucos. “Eu estava passando perto da escola no dia e só vi a multidão correndo desesperada, dizendo que tinham acertado alguém”, lembra.

Estudante apreendido
Menos de 24 horas depois de entrar na escola e disparar dois tiros contra o coordenador, o adolescente de 17 anos foi apreendido, no feriado de 1º de Maio. Segundo a Polícia Civil de Goiás, a própria mãe indicou onde o filho estava.

Mesmo abalada, a mulher levou os policiais até o esconderijo do garoto, que é aluno do segundo ano do ensino médio da escola. Por volta das 12h30 dessa quarta-feira (01/05/2019), ele foi encontrado em cima de uma árvore, na casa de uma conhecida da família dele, no Pedregal, Novo Gama (GO). A mulher pediu e o estudante se entregou.

A mãe contou que o filho estava escondido em uma casa. “Ela foi até ele e o menino desceu da árvore. Os dois trocaram um abraço e o garoto se entregou”, relatou o delegado Rafael Pareja, que conduz as investigações. O adolescente passou a noite na delegacia do Valparaíso. Nesta quinta-feira (02/05/2019), será apresentado ao juiz e promotor da Vara da Infância e da Juventude. Depois, seguirá para um centro de internação de menores.

O crime ocorreu por volta das 15h de terça-feira (30/04/2019). Após ter sido repreendido pelo coordenador, pela manhã, o estudante saiu dizendo que voltaria. À tarde, ele retornou armado e deu dois tiros em Júlio Cesar – um deles na cabeça da vítima, que já estava caída no chão. O docente deixa a esposa e dois filhos pequenos.

 

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