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Conselho de Psicologia pedirá investigação de clínica do DF por “cura gay”

Empresa de hipnose cobra R$ 29.990 para “curar” homossexualidade e depressão em seis meses. CRP-DF vê possível prática ilegal da profissão

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1 de 1 LGBT-PIXABAY - Foto: PIXABAY/AGÊNCIA ESTADO

O Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal (CRP-DF) vai denunciar ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e à Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) o caso da clínica de hipnose em Brasília que oferece “tratamento” para a homossexualidade. Para o órgão, o dono do empreendimento pode estar exercendo ilegalmente a profissão de psicólogo ao também oferecer cura para doenças psíquicas, como depressão.

A empresa Hipnoticus, localizada na Asa Sul, diz que o serviço para “tratar” a homossexualidade, que custa R$ 29.990, gera resultados em seis meses. Segundo consta no site do estabelecimento, a hipnose é feita através do método “Psicoterapia Sem Falhas”, usado pelo hipnoterapeuta Gabriel Henrique de Azevêdo Veloso. São oferecidas três opções de serviços: sessões com duração de quatro meses, seis meses e oito meses.

O dono da empresa diz ser cadastrado no Conselho de Auto Regulamentação da Terapia Holística (CRT), uma sociedade civil sem vínculos com o governo Federal. Ele oferece a cura de doenças como depressão e ansiedade em até seis meses, mesmo não tendo formação em psicologia, medicina ou terapia ocupacional.

De acordo com a presidente do CRP01/ DF, Thessa Guimarães, uma vez que Gabriel Henrique não é psicólogo, sua atuação para tratar doenças psiquiátricas “pode configurar exercício ilegal da profissão“. Nesta segunda-feira (9/11), o CRP01/DF vai expedir ofício ao MPDFT e à PCDF solicitando investigação de suposto exercício ilegal da profissão e charlatanismo.

“Para a psicologia, a homossexualidade não é doença, então não é curada. É vedado ao psicólogo oferecer cura gay [Resolução do CFP 01/99]”, diz ela. “Nós só podemos abrir processo ético contra psicólogos – e provavelmente cassaríamos esse registro neste caso -, mas isso não nos exime de atuar aqui. Não sendo ele psicólogo, é mais grave ainda a situação: precisamos de investigação de exercício ilegal da profissão ”, completa.

Thessa ainda ressalta que é antiético oferecer “cura” para a depressão em seis meses. “Não podemos dar a garantia da cura. Dispomos de algumas ferramentas para o tratamento da depressão, mas trabalhamos em rede: junto com outras abordagens clínicas e outros métodos de cuidado da saúde mental. Compreendemos a depressão como um fenômeno psicossocial, então não cabe apenas à psicologia seu tratamento, mas à saúde como um todo, e aí à medicina, mas também ao serviço social, à educação […] Assim, oferecer, sozinho, cura para a depressão em seis meses pode configurar charlatanismo”, alerta.

“Solução para mudar orientação sexual”

Ao Metrópoles, Gabriel Henrique revelou que a clínica existe desde 2010. Sobre o “tratamento” para homossexualidade, ele afirmou que “há pessoas que não ficam satisfeitas com esse tipo de vida. Então, o tratamento é oferecido nessa perspectiva”.

Em uma parte do endereço eletrônico, sobre “como funciona a hipnose”, a empresa diz que “a cura de doenças é realizada através da objetividade do diagnóstico e do tratamento holístico, oferecendo resultados ainda antes da 1ª sessão”. A clínica ainda afirma que “a hipnose também é a única solução para mudar sua orientação sexual e te livrar da atração indesejada pelo mesmo sexo”.

Após a publicação da primeira reportagem do Metrópoles sobre o caso, o empreendimento retirou a palavra “homossexualismo” da parte de serviços oferecidos no site, bem como a frase citada acima. Veja:

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CLDF pede investigação

Segundo o deputado distrital Fábio Felix (PSol), presidente da Comissão de Direitos Humanos da CLDF, a Casa irá acionar os órgãos necessários para que a clínica seja investigada. “Isso é um absurdo e a Comissão de Direitos Humanos vai atuar, sem dúvidas, de forma muito dura nesse caso”, disse ao Metrópoles.

“É um absurdo completo que a gente tenha uma clínica que trate a homossexualidade como doença. Nós estamos no ano de 2020. A Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa vai atuar nesse sentido. Primeiro, porque isso configura crime definido pelo Supremo Tribunal Federal, que é a LGBTfobia”, declarou Fábio Felix.

“A comissão vai oficiar os órgãos, o Ministério Público, a Defensoria Pública, a delegacia especializada, para que abram uma investigação sobre esse tipo de conduta. A nossa sexualidade, a nossa diversidade, não pode ser tratada de forma tão violenta”, completou o deputado.

O que diz a clínica

A clínica se posicionou oficialmente sobre a situação no sábado (7/11), por meio de nota enviada ao Metrópoles.

Confira, abaixo, a íntegra:

“O termo Psicoterapia Sem Falhas refere-se ao acompanhamento e aos progressos que são obtidos através da terapia holística oferecida, que possui acompanhamento e garantia vitalícios. Após o término da terapia, que pode durar 4, 6 ou 8 meses, o cliente pode reaver os resultados obtidos a qualquer momento, sem ônus, sem custos adicionais, visto que podem haver relapsos ou novas situações de estresse e dificuldade na vida do indivíduo, e estaremos de prontidão para dar o suporte necessário. Logo, é uma terapia feita para servir às necessidades que eventualmente se apresentarem ao indivíduo.

A terapia é holística, profissão registrada pelo Código Brasileiro de Ocupações (CBO 322125). A ênfase e nexo central deste processo são na manipulação de energias, no aumento do autocontrole emocional, no fortalecimento do Eu e no enaltecimento da autonomia e facilidade para lidar com os problemas diários. Nossa terapia lida com pessoas que se dizem estar com quadro de ansiedade, depressão e outras condições na nossa perspectiva holística. Propomos harmonização, superação, mudança e evolução individual. Não fazemos diagnóstico médico, psicológico ou qualquer outro, somente análise e avaliação holística.

Sobre a questão do serviço oferecido para homossexualidade, não fomos acionados pelos órgãos informados pela reportagem e só vamos nos manifestar sobre o assunto quando tivermos acesso ao comunicado oficial destas entidades.

Assim que veio ao nosso conhecimento, o termo “homossexualismo” foi devidamente alterado para evitar mal entendidos e conotações negativas. Contudo, afirmamos que não há preconceito algum contra a população LGBT e que o serviço oferecido é para melhoria da vida dos indivíduos que nos procuram buscando ajuda. Nos colocamos à disposição para esclarecer quaisquer eventuais dúvidas.”

Questionado sobre uma possível prática ilegal da profissão, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) não se posicionou até a última atualização desta reportagem. O espaço permanece aberto para eventual manifestação. O Metrópoles tenta contato com o Conselho Federal de Medicina (CFM) e o de Terapia Ocupacional (COFFITO), assim como com as entidades representativas dessas categorias no DF.

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