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BRT: Justiça bloqueia bens de Agnelo, Arruda, Filippelli e mais 7

Decisão da 10ª Vara também determinou quebra do sigilo telefônico de investigados na 2ª fase da Panatenaico, que mira desvios na obra do BRT

atualizado

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Arte sobre fotos/Metrópoles
arruda, agnelo e Filippelli
1 de 1 arruda, agnelo e Filippelli - Foto: Arte sobre fotos/Metrópoles

O juiz federal Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara Federal, determinou o bloqueio dos bens e a quebra do sigilo telefônico dos ex-governadores do Distrito Federal Agnelo Queiroz (PT) e José Roberto Arruda (PR) e do ex-vice-governador Tadeu Filippelli (MDB).

A mesma sanção foi decretada para outras sete pessoas. O Metrópoles conseguiu a lista em primeira mão. São elas os ex-secretários do GDF Márcio Machado, José Walter Vazquez Filho e Afrânio Roberto de Souza Filho; Reinaldo Teixeira Vieira, Samuel Dias Junior e os empresários Jorge Luiz Salomão e Fernando Márcio Queiroz, este último dono da Via Engenharia.

De acordo com o magistrado, “há indícios (fummus boni iuris) já evidenciados” de irregularidade, e, por isso, “deve-se assegurar o ressarcimento ao erário público”.

Eles são alvos da segunda fase da Operação Panatenaico, deflagrada nesta sexta-feira (11/5). A Polícia Federal chegou a pedir a prisão preventiva de todos os citados, mas o juiz da 10ª Vara da Justiça Federal negou. Os investigadores buscam documentos referentes a desvios de recursos, superfaturamento e pagamento de propina nas obras do BRT Sul.

Laudos realizados pela Polícia Federal teriam constatado o direcionamento e a fraude na licitação, enquanto auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas do DF (TCDF) e pela Controladoria-Geral do DF apontaram superfaturamento de aproximadamente R$ 208 milhões, cerca de 25% do custo total do empreendimento fraudado. A obra, orçada inicialmente em R$ 587,4 milhões, foi executada por R$ 704,7 milhões.

O bloqueio inclui bens ativos, contas bancárias e investimentos. Com a quebra do sigilo telefônico, os investigadores terão acesso aos históricos de ligações dos envolvidos de 2007 a 2014 – período em que o esquema criminoso de superfaturamento de obras e desvios de recursos estaria em andamento.

Os dez citados também foram alvo de pedido de prisão pela Polícia Federal, que foi negado pelo juiz. De acordo com o magistrado, eles já haviam sido presos na primeira fase da operação e acabaram liberados pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).

O outro lado
Conforme afirmou o advogado Alexandre Queiroz, a defesa de Filippelli ainda não tem conhecimento do teor das delações. “Estamos requerendo uma cópia e iremos nos manifestar depois que tivermos acesso aos autos do processo”, disse o defensor do ex-vice-governador.

“Nenhuma obra investigada no âmbito da operação foi realizada no Governo Arruda. Ele se encontra à disposição das autoridades para prestar todos os esclarecimentos necessários à elucidação dos fatos“, afirmou Luís Henrique Machado, advogado do ex-chefe do Executivo local.

Paulo Guimarães, defensor de Agnelo, informou que não se manifestaria. A Via Engenharia, em nota, ressaltou que a “obra entregue em junho de 2014, e que teve a participação da empresa no consórcio, cuja liderança, por força contratual, era de total responsabilidade da Andrade Gutierrez”. E que todos os esclarecimentos a respeito da construção do BRT-Sul deverão ser prestados às autoridades.

O Metrópoles não conseguiu contato com os demais citados.

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Propina
Com base na delação premiada de Rodrigo Lopes, ex-diretor da Andrade Gutierrez, feita ao Ministério Público Federal (MPF) em 29 de setembro de 2016, no âmbito da Operação Lava Jato, Agnelo e Filippelli teriam recebido R$ 8 milhões em propina para as obras do BRT Sul.

O valor corresponderia a 4% do total recebido pela empreiteira para tocar o empreendimento. PT e MDB também foram supostamente beneficiados. Agnelo e Filippelli teriam procurado a empreiteira para as negociações quando ainda eram candidatos a governador e a vice, em 2010. Segundo Lopes, eles cobraram R$ 500 mil em cada turno da campanha em troca da manutenção das obras. O montante teria sido pago por meio de doações oficiais, simulação de contratos de prestação de serviço e propina.

Os executivos Carlos José e Rodrigo Leite, ambos da Andrade Gutierrez, foram designados para efetuar os pagamentos. “Os valores da propina eram gerados pela obra, quando em espécie, e lançados na contabilidade como despesa”, disse Lopes ao MPF. Conforme relatou o delator, o empresário Afrânio Roberto de Souza Filho, apontado como operador de Filippelli, seria o responsável por receber propinas em dinheiro vivo.

O ex-executivo da Andrade Gutierrez afirmou ainda que as outras duas principais empresas integrantes da obra do BRT Sul – a OAS e a Via Engenharia – pagavam os mesmos valores à dupla. Dessa forma, a propina total teria chegado a R$ 24 milhões.

Contratos simulados
De acordo com Rodrigo Leite, parte da propina repassada a figuras do alto escalão do Executivo local foi justificada por meio de contratos simulados de prestação de serviços com empresas indicadas pelos próprios políticos. A delação premiada do ex-superintendente regional da Andrade Gutierrez trouxe detalhes de como funcionava a dinâmica do esquema.

Segundo o delator, a propina foi repassada de três formas: em espécie, por meio de doações oficiais e mediante contratos simulados de serviço.

Leite contou que, do total, cerca de R$ 2,5 milhões foram entregues por meio de contratos de fachada com duas empresas indicadas pelo ex-vice-governador. A primeira seria a Logit Engenharia Consultiva Ltda, companhia paulista especializada em consultoria de projetos na área de transporte.

Conforme depoimento do delator, o valor repassado por meio do contrato falso foi de R$ 900 mil, dividido em três parcelas iguais, pagas em janeiro, fevereiro e março de 2014.

Nota fiscal apresentada pelo delator Rodrigo Leite como suposto pagamento de propina ao ex-vice-governador Tadeu Filippelli

 

AB Produções
A segunda empresa apontada por Rodrigo Leite como suposta fornecedora de contratos simulados a Filippelli é a AB Produções – Canto do Cerrado Filmes. De acordo com o ex-executivo, o repasse por meio da empresa foi de R$ 1,685 milhão, também a pedido do emedebista. Ele alegou que o objeto simulado do contrato era a produção de filmes das obras do BRT Gama e do Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha.

Não é a primeira vez que a AB Produções aparece em escândalos locais. Ela também esteve no centro da Caixa de Pandora sob a acusação de adotar o mesmo modus operandi revelado nas delações da Andrade Gutierrez.

A produtora pertence a Abdon Bucar, acusado de ter facilitado, por meio de sua empresa, lavagem de dinheiro para abastecer caixa 2 de campanha. A AB tinha sido contratada pelo MDB para fazer programas de rádio e televisão dos candidatos a deputados federais e distritais lançados pelo partido em 2006 – ano em que fez a campanha vitoriosa do ex-governador José Roberto Arruda (PR). Entre 2007 e 2009, a AB recebeu R$ 14,4 milhões em contratos com o GDF.

Em 2015, no entanto, o processo que investigava as denúncias na Controladoria-Geral do DF foi arquivado. De acordo com o órgão, a empresa “não possuía qualquer relação financeira ou contratual com o Governo do Distrito Federal à época dos fatos”.

Eleições de 2014
Segundo o depoimento de Rodrigo Leite ao Ministério Público, os contratos simulados por José Roberto Arruda foram com outra empresa. O ex-executivo revelou que a Andrade Gutierrez fechou negócio de R$ 1,8 milhão com o escritório de advocacia Wellington Medeiros – Advogados Associados, a pedido do ex-governador, em 2014.

A propina teria sido solicitada por Arruda durante a campanha ao GDF, pois, até ser impedido de se manter na corrida, o ex-governador liderava as pesquisas. O delator afirma que o contrato simulado foi fechado no escritório de Wellington Medeiros, no Edifício Brasil 21, e que os serviços de advocacia não foram prestados à empreiteira. Medeiros é ex-desembargador do Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios (TJDFT).

Segundo Leite, duas atas de reunião chegaram a ser falsificadas para dar aparência de licitude ao contrato. Na primeira fase da Panatenaico, a Justiça autorizou a condução coercitiva do advogado Wellington Medeiros, caso ele não se apresentasse para prestar depoimento no prazo de 24 horas.

O BRT também foi citado na delação de Ricardo Roth. O ex-executivo da Construtora Odebrecht disse ao Ministério Público Federal que, em 2008, foi procurado por Luiz Ronaldo Wanderley, à época diretor da Via Engenharia, e por Lunguinho, diretor da OAS. Eles pediram à Construtora Norberto Odebrecht para apresentar proposta de cobertura na licitação do BRT Sul.

Posteriormente, Roth afirmou que foram pedidos repasses de R$ 966 mil, por meio de caixa 2, ao ex-governador Arruda. O dinheiro seria para a campanha eleitoral. Os pagamentos teriam ocorrido da seguinte forma: um de R$ 500 mil, em 9 de junho de 2014, e outro de R$ 466 mil, em 8 do setembro de 2014. De acordo com o delator, Sérgio de Andrade do Vale, empresário e assessor de Arruda, seria o operador no repasse dos valores.

Arruda era chamado de “Parreira”. Na mesma delação, o ex-executivo falou de propina para a construção do Centro Administrativo do GDF, em Taguatinga, executada em parceria com a Via Engenharia.

Veja o vídeo da delação:

 

O Metrópoles entrou em contato com a Logit Consultoria, mas a empresa não havia se posicionado até a última atualização desta matéria. Também não foram localizados representantes da AB para comentar o caso. O advogado de Agnelo Queiroz disse que não ia se manifestar. A reportagem tenta contato com os demais envolvidos.

Primeira fase
Na primeira etapa da Panatenaico, 10 pessoas foram presas. Entre elas, Agnelo, Arruda e Filippelli. Os três e outros nove acabaram denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) em abril e se tornaram réus de ações – em trâmite na 12ª Vara da Justiça Federal no DF – que investigam lavagem de dinheiro, corrupção e organização criminosa na reforma do Estádio Mané Garrincha.

O Ministério Público Federal (MPF) tenta fechar o cerco em todas as pontas para encontrar documentos comprobatórios de um superfaturamento que pode chegar a R$ 900 milhões, de acordo com depoimentos de colaboradores e lenientes da Andrade Gutierrez. A empresa integrou o Consórcio Brasília 2014, com a Via Engenharia, para construir a arena.

Os promotores querem a punição dos culpados, além do ressarcimento aos cofres públicos. Somente entre os três ex-gestores e outras nove pessoas envolvidas em um esquema de corrupção ativa e passiva, fraude à licitação do empreendimento, lavagem de dinheiro e organização criminosa, são pedidos R$ 52,4 milhões de devolução ao erário.

As possibilidades de acusação agora estão em três ações penais da Justiça Federal e em três inquéritos policiais para apurar a assinatura de contratos fictícios, emissão de notas fiscais falsas e lavagem de dinheiro envolvendo a Federação Brasiliense de Futebol e o consórcio que construiu a arena.

“A despeito das gravíssimas imputações, existem aspectos que demandam aprofundamento com vistas a delimitar a autoria dos responsáveis pelas fraudes que ensejaram o prejuízo milionário apontado. Faz-se necessário detalhar esses aspectos em novos inquéritos ou nos já instaurados pela autoridade policial. Isso permitirá ao parquet fundamentar sua opinio delicti de forma adequada”, afirmam os promotores na denúncia do MPF, com termos divulgados na semana passada.

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